Vodca: como a bebida, que perdeu espaço nos bares de drinques, ganha força no mercado
Mesmo antes da guerra na Ucrânia, bebida de origem russa foi deixando de ser protagonista nas cartas de coquetéis
![Imagem mostra copo com drink amarelo, com uma folha de girassol sobre o líquido.](https://vejasp.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/03/Design-sem-nome-2022-03-24T141215.163.png?w=680&h=453&crop=1)
Muito se falou em banir a vodca, em protesto aos ataques da Rússia contra a Ucrânia — é na terra de Vladimir Putin onde se encontram mais evidências de ter sido o berço da bebida, conta Stuart Walton no livro Vodka Classified (Vodca classificada). Um dos drinques mais populares feitos com ela, o moscow mule (com refrigerante de gengibre e limão), criado nos Estados Unidos, acabou sofrendo represálias pelo mundo — e também na cidade.
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No restaurante Jacarandá, foi rebatizado de kiev mule. No Pensão Bar, virou um bem-humorado onu mule. “Baboseira”, opina o bartender Marcelo Serrano sobre as ações contra o drinque que ajudou a popularizar na capital a partir de 2009, quando deu de colocar espuma de gengibre por cima.
O fato é que, muito antes de se cogitar “cancelar” a vodca, ela já não tinha mais essa bola toda em bares de alta coquetelaria. Embora o moscow mule ainda faça um baita sucesso, o momento de glória do destilado nos mixing glasses dos bartenders foi embora há tempos.
![Moscow Mule.JPG.jpeg.jpg (1) Imagem mostra caneaca de metal com líquido espumado de cor branca.](https://vejasp.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/03/Moscow-Mule.JPG.jpeg.jpg-1.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Hoje, essa branquinha feita normalmente de grãos (mas não só) não predomina mais na carta de nenhum bar de coquetelaria listado pelo guia COMER & BEBER, como foi comum no passado. No Sylvester, em Pinheiros, protagoniza apenas quatro dos 32 drinques.
O sócio e bartender da casa, Rogério Souza, o Frajola, acompanhou as diferentes fases da relação do público com o líquido no mundo dos coquetéis. Trabalhou no Astor e no SubAstor entre 2001 e 2018, onde, no início, vendia muitos apple martinis (de vodca!).
Pouco a pouco, a clientela (re)descobriu o clássico gim-tônica, que teve um revival iniciado na Europa mais ou menos há uma década, e não largou mais. “Dez anos atrás, saía uma garrafa de gim para dez garrafas de vodca. Hoje é o contrário.” A bebida, que também chega de outros países como Polônia e Suécia, é um destilado e se mostra versátil, pois permite que outros ingredientes como frutas (alô, caipirosca!) ou refrigerantes (já tomou hi-fi?) roubem a cena.
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“Se a intenção não for realçá- la, é fácil disfarçar o álcool”, explica Adriana Pino, do Flora Bar, nos Jardins, onde só há quatro misturas de vodca, caso do pornstar martini (com maracujá, limão, baunilha e espumante), entre 32 receitas. Pela falta de personalidade forte, às vezes rola até uma discriminação do pessoal do meio.
“Principalmente de quem está começando”, diz Frajola. Profissionais consultados afirmam que, hoje, o público que prefere vodca são os clientes na faixa dos 50 anos, saudosos dos coquetéis dos anos 80/90, ou uma galera que está a começar a beber destilados. Apesar de o gim ser hoje o querido nas cartas, o espaço da concorrente é maior no mercado como um todo, o que vai além do mundinho dos bares de drinques.
“A vodca continua em uma posição favorável”, afirma Patricia Cardoso, diretora de marketing da Pernod Ricard Brasil, que controla marcas como a sueca Absolut e a polonesa Wyborowa. “Segue sendo muito consumida no país e, mais recentemente, impulsionada pela expansão de conhecimento da coquetelaria por parte dos consumidores.”
![atlantis e YVY Imagem mostra duas garrafas, de vodca, uma de detalhes azuis e outra de detalhes dourados.](https://vejasp.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/03/Design-sem-nome-2022-03-24T150146.790.png?&w=1024&crop=1)
De acordo com a Euromonitor International, em 2020 circularam 43 milhões de litros de vodca no mercado brasileiro, número que pode subir para 58 milhões de litros em 2025 — ainda assim, um resultado menor que o de 2015 (64 milhões de litros). Os cálculos incluem tanto vendas no varejo como em restaurantes e bares.
De olho no potencial, marcas nacionais lançam rótulos. A paulistana Atlantis, antes 100% do gim, apresentou sua garrafa em novembro (preço sugerido de 79 reais). “A indústria colocou todo o dinheiro em cima do gim e esqueceu da vodca”, observa o sócio Bruno Siqueira. A mineira YVY Destilaria estreou, em outubro, uma variação feita com farinha da polpa do frutinho babaçu (89 reais). A APTK Spirits é outra empresa que promete lançar o produto, em abril, por 48 reais.
Longe de ser cancelada, a vodca não é mais aquela Coca-Cola toda na alta coquetelaria, mas tem força para recuperar parte do prestígio perdido.
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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de março de 2022, edição nº 2782