Alife Nino tem ambição de ser um dos maiores grupos de gastronomia do país
Dona de marcas como Nino e Tatu Bola, a empresa acaba de incorporar o grupo Irajá ao portfólio e prevê faturar 700 milhões de reais neste ano
Talvez você ainda não tenha ouvido falar da empresa por trás de alguns dos endereços gastronômicos mais concorridos da cidade, como o restaurante Nino, o bar Eu Tu Eles e o Boteco Rainha, de origem carioca e recém-incorporado ao portfólio. A Alife Nino é responsável por essas e outras catorze marcas vitaminadas, que bombam de público.
Esse quase anonimato tende a desaparecer nos próximos meses, uma vez que o grupo vem passando por uma expansão milionária e, além da capital paulista, está presente em quatro regiões do país — só não chegaram à Região Norte por enquanto.
Também devem colaborar para essa projeção ajustes feitos nas cozinhas com a chegada de novos chefs e sócios. Marco Renzetti, chef do ano por VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER 2021 e titular do premiado Fame, vai cuidar dos endereços italianos, e Pedro de Artagão, do Boteco Rainha e outras marcas, assinará o cardápio de pratos e petiscos dos bares.
Entre os administradores da Alife Nino encontram-se duas figuras centrais: o presidente do conselho, Pedro Silveira, conhecido como Pedy pelos mais íntimos, e o CEO Alessandro Ávila. Ex-executivos de banco, eles entraram no segmento com a balada Heaven em um distante 2010. “Criamos a Alife e fomos atrás de empreendedores da noite especializados em desenvolver conceitos, mas ruins em administrar. Sempre nos colocamos como gestores”, lembra Silveira.
O primeiro sucesso permanente nasceu em 2011 em plena Avenida Brigadeiro Faria Lima, em um ponto onde nada vingava. Era o bar com música ao vivo Eu Tu Eles. Com uma proposta de diversificação de marcas e dos estilos musicais dos seus botequins, no ano seguinte foi inaugurado o Tatu Bola. “Descobrimos que tínhamos um modelo de negócio em cima da brasilidade”, diz Silveira, cujos bares se apoiam na trinca caipirinhas, chopes e petiscos. Um terceiro bar estava a caminho: o Boa Praça ganhou a primeira unidade em 2017. Depois foram surgindo desdobramentos com os nomes Tatuzinho e Toca do Tatu.
Uma guinada mais gastronômica se deu com a incorporação do Nino Cucina. O namoro com o restaurante italiano, cuja imagem culinária era o chef italiano Rodolfo De Santis e o responsável financeiro, o empresário mineiro Marcelo Guimarães, começou em 2017 e só se concretizou três anos depois.
No primeiro passo, foram adquiridos 30% do Grupo Nino, que contava com outras três unidades em torno da Rua Jerônimo da Veiga, no Itaim Bibi: Da Marino, Peppino Cantina e Forno da Pino — havia ainda a churrascaria Giulietta Fogo & Cucina, que foi incorporada pelo Nino e só está voltando agora. Um aporte de 100 milhões de reais vindo da XP Investimentos em 2021 trouxe fôlego para o crescimento vertiginoso do grupo, composto de três sócios controladores, do investidor XP Private Equity e de trinta sócios minoritários.
Também vieram mudanças de configuração societária. Guimarães deixou a empresa em fevereiro do ano passado. Embora continue com um quinhão no grupo, De Santis, que cuidava das inaugurações em série, não encosta mais nos fogões da Alife Nino. Participou da última implantação em dezembro, ao inaugurar a filial do Nino em Belo Horizonte. “O negócio ficou gigante. Nos últimos dois anos, trabalhei como um executivo, planejando a expansão do Nino, do Giulietta e do Da Marino. Estava cansado”, justifica o cozinheiro, que saiu da operação.
Embora as duas partes jurem que não ficaram arestas no relacionamento, Silveira faz o mea-culpa: “Desde que a XP entrou no grupo como sócio-investidor, as governanças aumentaram. O Rodolfo é um artista, mas essa vida de executivo, de ter de dar resposta a tudo não estava mais confortável para ele”. Silveira garante que não repetirá a mesma situação com Marco Renzetti. “A função do Marco está em cuidar da cozinha. Não vai fazer reunião com administradores do grupo”, assegura.
Para o lugar de Rodolfo, a ideia era ter outro chef italiano, e um amigo em comum de Silveira e Renzetti, o historiador e gourmet João Grinspum Ferraz, sugeriu o nome do cozinheiro. Para ingressar na Alife Nino, Renzetti recebeu uma pequena participação societária, assim como ofereceu uma parcela minúscula do Fame Osteria.
À frente do Fame, restaurante nos Jardins de apenas dezesseis lugares devotado à culinária de excelência, duas vezes ganhador do título de melhor italiano de São Paulo e detentor das cinco estrelas máximas atribuídas pelo guia anual COMER & BEBER, Renzetti vai diminuir o número de noites que serve apenas uma degustação, como contou direto de Roma, onde passava férias nesta semana. Será de quarta a sábado.
Sobre o Nino e demais endereços italianos do grupo com jeitão de trattoria chique, inclusive com a marca Ninetto desenvolvida especialmente para praça de alimentação em shoppings, ele não pretende realizar alterações radicais neste momento. “Vou fazer uma radiografia das cozinhas. As mudanças virão de forma harmoniosa e sustentável”, adianta.
Ele, que foi dono da extinta e premiada Osteria del Pettirosso, promete apenas a revisão mais imediata de um clássico, típico da capital italiana, a cidade onde nasceu. “Devo começar com o espaguete à carbonara”, adianta sobre a receita que costuma preparar de forma primorosa.
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Dá uma ponta de curiosidade de como se dará esse aperfeiçoamento no Nino, restaurante em que as filas na porta costumam ultrapassar uma hora de espera, mesmo com a ampliação concluída em outubro passado, que lhe deu 124 lugares em um imóvel vizinho. Renzetti não se encontra só na empreitada. Terá o apoio da esposa, Erika, que dará bem-vindos pitacos para aperfeiçoar o atendimento das casas.
Quem também pretende fazer ajustes de forno & fogão com calma é Pedro de Artagão, com a mesma tranquilidade com que ele e os sócios do carioca Irajá concluíram no início de março a negociação para se juntarem à Alife Nino — foram perto de dois anos de conversas para que o Grupo Irajá fechasse o contrato.
“Vemos uma complementaridade com as nossas marcas. A comida de boteco deles é melhor que a dos nossos bares, os que tínhamos anteriormente. O papel do Artagão é cuidar dessa gastronomia”, diz Silveira, não sem uma ponta de ansiedade. Certamente, o que pesou nessa decisão foi a transação que envolveu cashout. “A gente chegou em um valor dentro do resultado que eles fazem. Desse montante, tem um pouco de dívida. Vamos assumir a sua dívida, dar uma parte em dinheiro e a outra parte é em ações da Alife”, traduz Silveira. “Viraram nossos sócios.”
O Grupo Irajá, detentor das marcas Rainha, Princesa, Irajá Redux e Bastarda, também viu vantagens, embora não se comentem valores. “Começamos no Rio de Janeiro e chegamos em São Paulo. Mas queríamos estar em outros estados, crescer fora do Rio. A Alife Nino, que tem uma solidez financeira, entrou para nos ajudar a realizar o sonho de expansão”, projeta Artagão.
O chef carioca começou o Grupo Irajá doze anos atrás pelo caminho da alta gastronomia. Fazia inclusive menus chamados de omakassê, nome japonês para degustação. “Com o passar do tempo, nosso propósito veio mudando. O meu prazer passou a ser agradar a mais pessoas com a nossa comida”, avalia.
Quando trabalhava com o chamado fine dining, atendia de cinquenta a 100 clientes por noite. Ao aderir à botecagem com categoria, passou a satisfazer 500 paladares. “Aproveitei tudo o que aprendi na alta gastronomia e levei para o bar. Nossos processos são artesanais. O molho madeira não é pó da Maggi. Fazemos muito bem-feito e do zero”, diz. E lança críticas aos menus dos locais que tem de reformular. “No Irajá, penso primeiro na cozinha. No Tatu Bola, no Eu Tu Eles e no Boa Praça, primeiro surgiram os bares”, descreve. “Os cardápios são muito semelhantes. Vamos escolher um deles e mudar aos poucos.” Quem endossa essa ideia é Saulo Yassuda, crítico de bares da Vejinha. “De tão parecidos, os bares do grupo poderiam ter o mesmo nome”, alfineta o especialista.
“Estamos colocando a gastronomia no centro de tudo com a chegada do Marco e do Pedro”, defende o CEO Alessandro Ávila. Esse foco antes estava restrito ao Nino. O executivo também lembra que os menus de bares antes eram encomendados a consultores. “Nunca tivemos um chef como o Pedro, que veio da alta gastronomia e surfa tão bem a cozinha de boteco.”
O reforço culinário também visa o vigor financeiro. “A gente tem pouca dívida, estamos crescendo mais de 50% e nosso forte sempre foi a gestão financeira”, enumera Ávila. Com dezessete marcas, todas próprias, uma vez que não opera com franquias, a Alife Nino, em suas sessenta unidades pelo Brasil (23 delas paulistanas), recebeu 4 milhões de clientes no ano passado, dos quais 1,7 milhão são de São Paulo. Para 2024 estão previstas 6 milhões de pessoas nos estabelecimentos, sendo 2,3 milhões da capital paulista.
O faturamento em 2023 atingiu 483 milhões de reais (218 milhões de reais só em São Paulo), e a expectativa é de que chegue a 700 milhões de reais neste ano, com 262 milhões de reais esperados dos paulistanos. As inaugurações estão a todo vapor, cinco delas na cidade e com datas definidas. Não por acaso, o Grupo Alife Nino, que deve ser rebatizado com a chegada do Irajá, tem tudo para surpreender. “O mercado no Brasil é pulverizado, tem poucos players profissionalizados como a Alife Nino”, avalia João Adas, CEO da Cia. Tradicional de Comércio, um dos principais concorrentes, com dez marcas, entre elas Original, Bráz, Pirajá e Astor.
Publicado em VEJA São Paulo de 05 de abril de 2024, edição nº 2887
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