Lembra do caju amigo? Drinque ganha versões modernizadas
A tradicional pedida, meio sumida dos bares, tem feito a cabeça de bartenders da cidade
É um tanto incomum um cliente chegar a um bar e pedir, hoje em dia, um caju amigo. Esse drinque das antigas, feito com vodca, a fruta em compota, o suco dela, servido com gelo no copo longo, está em extinção. É mais fácil você encontrar combinações com nomes como chuva de caju ou soneto ao caju, variações modernizadas do clássico, essas, sim, na moda.
Em comum, as novas versões são leves e fáceis de tomar, sem perder a essência do original, e trazem sempre uma “interessância” a mais.
Caju inimigo. Esse é o nome da variação no Terê, bar escurinho aberto em setembro na Vila Buarque com uma carta etílica caprichada. Leva rum com infusão da fruta, limão-taiti, xarope de missô e cajuína gaseificada.
“Eu gosto muito de caju amigo, muito, muito, muito mesmo, e queria revisitá-lo”, explica o bartender e anfitrião Luiz Felippe Mascella. “Optei pelo rum para dar um diferencial e um toque de baunilha”, conta.
Também usam a cajuína, que é o suco da fruta clarificado, os bartenders Spencer Amereno Jr., no bar Carrasco, e Chris Carijó, no restaurante Preto Cozinha, ambos em Pinheiros.
O primeiro faz o soneto ao caju, cuja receita se completa com vodca, compota com coco e limão-taiti. Carijó sugere o caju brother, variante que leva cachaça junto da compota avinagrada da fruta e limão-galego, tudo gaseificado e apresentado com hortelã e pedaços do caju em calda. “Sempre achei o original muito doce e fiz minha versão”, confessa. ”É um dos mais vendidos da casa.”
Outra opção com cachaça é o chuva de caju, que a bartender Steph Marinkovic criou para o bar Casa Meio do Céu, na Bela Vista. É uma união da aguardente em amburana, suco de caju com cardamomo e a compota, tudo enfeitado com cacau em pó.
Sócio do Sylvester Bar, em Pinheiros, Rogério Souza, o Frajola, optou pela tequila para criar o maturi, recém-incluído na carta. É uma mescla do destilado, sucos cítricos e caju in natura. “Em vez da compota, usamos Licor 43 e o xarope de mel”, descreve.
Apesar da releitura, o bartender revela que serve o tradicional para um ou outro cliente que o pede. “Em geral, é um público um pouco mais velho, que tomava o drinque lááá atrás”, explica. “Deixamos o pote de doce escondido”, confessa. “E faço o suco fresco na hora, em vez de usar o concentrado como outros bares.”
Há registros sobre o caju amigo desde os anos 50. A receita que se consagrou foi a do bartender Guilhermino Ribeiro dos Santos, do mítico bar Pandoro, que funcionou entre 1953 e 2006 na Avenida Cidade Jardim e teve uma sobrevida entre 2008 e 2011.
À mistura elaborada por ele, citada no parágrafo que abre esta matéria, eram adicionadas ainda “gotas de um segredo”. Essa fórmula ele disse ter adaptado nos anos 70 da de um antigo funcionário do mesmo bar, o Fumaça, que a teria criado em 1955 com gim e a fruta fresca.
O bartender veterano Derivan Ferreira de Souza se lembra do sucesso que o drinque fazia no Pandoro. “Para minha surpresa, a montagem da área de trabalho tinha uma média de 200 copos com a base do caju amigo para iniciar o dia”, descreve ele sobre uma visita aos bastidores nos anos 90. “Hoje, que me perdoem, mas prefiro o drinque com uma boa cachaça”, revela.
Essa substituição, aliás, é mais que comum e já era feita bem antes desta onda de releituras. No restaurante Jiquitaia, por exemplo, ele é servido com pinga desde 2016, pouco depois de montagem do extinto Bar do Jiquitaia. Fica muito bom.
Carrasco. Rua Costa Carvalho, 84 (Guilhotina). Não tem telefone.
Casa Meio do Céu. Rua dos Franceses, 258, Bela Vista, ☎ 95594-6045.
Preto Cozinha. Rua Fradique Coutinho, 276, Pinheiros, ☎ 99114-3539.
Sylvester Bar. Rua Maria Carolina, 745, Pinheiros, ☎ 3034-1268.
Terê. Rua General Jardim, 427, Vila Buarque, ☎ 96252-0884.
Publicado em VEJA São Paulo de 1º de março de 2023, edição nº 2830.
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