Futuro Refeitório faz sucesso por comida e ponto diferentão
Aberta em janeiro, a casa seduz o público com uma inusitada mistura de bandejão badalado, padaria, cafeteria e restaurante num antigo estacionamento
Não fosse o apetite voraz e a cabeça quase sempre aberta do paulistano, inaugurar o Futuro Refeitório no número 808 da Rua Cônego Eugênio Leite, em Pinheiros, seria um tiro no pé. As esquisitices do ponto incluem a localização (um antigo estacionamento, ainda com as faixas pretas e amarelas nas paredes), o esquema de funcionamento (é preciso levar um disquete-comanda direto ao caixa para pagar), o mobiliário (cadeiras bege usadas de uma igreja) e a louça (cumbucas e pratinhos vêm numa bandeja metálica no almoço).
O risco foi calculado pela chef Gabriela Barretto, também dona do variado Chou, instalado numa casinha bem mais convencional no mesmo bairro, e por sua irmã mais velha, Karina, hoteleira que estreou em janeiro no universo da restauração já com sucesso de público. Só nos últimos dois fins de semana, perto de 700 pessoas passaram pelos sessenta lugares do estabelecimento. “Foi um tsunami de gente”, diz Karina.
De última hora, a equipe precisou pular de 48 para sessenta funcionários. Se no salão predomina a atmosfera hipster cheia de cantinhos perfeitos para uma foto, do lado de trás do balcão a brigada se divide em quatro turnos de trabalho pesado.
Antes das 4 da madrugada, uma equipe de cozinheiros finaliza a marinada de páprica para o frango, quando a padeira Hanny Guimarães chega para assar a primeira leva de pães de fermentação natural. A versão do campo, com 20% de farinha integral, é a primeira que vai para o forno. Depois de quarenta minutos, sai estalando e perfumando o ambiente.
Durante a semana, o portão abre para os clientes às 8 horas, quando alguns casais que trabalham na região já esperam para garantir seu café torrado
no próprio salão por Natália Ramos Braga, numa operação raríssima em outros restaurantes. “Eu sonhava com um lugar aberto o dia todo, que desse para tomar café da manhã”, afirma Gabriela.
No começo do dia, a torrada (6 reais) pode ganhar a cobertura de uma pasta de avelã e chocolate (3 reais) produzida a partir do zero na casa. Das 12 às 15 horas, o combinado íntegro (38 reais) contempla quatro porções de receitas com verduras, como salada de broto de feijão com cenoura, amendoim, pepino, coentro, hortelã e molho nam pla.
Ela procurou fornecedores de orgânicos de Parelheiros (leia reportagem especial aqui) que atendiam à demanda do Chou, mas o volume de compras do Futuro ultrapassava a capacidade de produção da cooperativa naquele momento. Ainda que a proposta quase vegetariana seja forte, mais da metade dos consumidores prefere o menu onívoro, com uma porção “animal”, como o contrafilé ao chimichurri (48 reais). “Quero fazer tudo, desde a trilha sonora até a mostarda”, completa.
Para dar conta desse desejo de autossuficiência, foi preciso reservar 100 dos 220 metros quadrados do salão para a cozinha. O arquiteto Felipe Hess comandou o projeto da reforma, que durou um ano. “Tem algo de apocalíptico, uma cara de lugar abandonado que foi ocupado”, afirma Hess. Não há forro no teto, por exemplo. “Eu me apaixonei pelo galpão em 2015, mas o aluguel estava muito caro. Só consegui negociar no ano seguinte, quando a locação de estacionamentos já estava lucrando menos”, lembra a chef. Para quem prefere o prazer da mesa aos carros, eis um bom sinal dos tempos.
Futuro Refeitório. Rua Cônego Eugênio Leite, 808, Pinheiros, ☎ 3085-5885. Seg. a sex., 8h/22h30; sáb., 9h/16h e 19h/22h30; dom., 9h/16h.