Continua após publicidade

Jardins: área que concentrava agito foi tema da estreia da Vejinha

Mais famoso pelo apelido, o Jardim Paulista marcou a primeira edição da revista com a posição (inalterada) de point de sofisticação e bochicho

Por Mario Mendes
Atualizado em 27 Maio 2024, 17h30 - Publicado em 25 set 2020, 06h00
Rua Oscar Freire: o principal corredor de compras do quadrilátero mais caro da capital (Daniela Tovianski/Veja SP)
Continua após publicidade

Degustar uma pequena fatia de 1985 parece mais uma experiência radical entre tantas neste estranho ano de 2020. É essa a sensação que se tem ao reler a matéria de capa da primeira edição de VEJA SÃO PAULO, com visão e conhecimento de causa de quem viveu a época. “A magia dos Jardins: Como vive o bairro mais quente do Brasil” era a chamada de capa — com ilustração pincelada do artista plástico Ivald Granato (1949-2016) —, enquanto na legenda da foto que estampava a Carta do Editor — assinada pelo próprio fundador da empresa, Victor Civita (1907-1990) — lia-se: “No mais requintado paraíso do bem viver em São Paulo, os Jardins, pessoas ricas, famosas e elegantes consomem um vasto cardápio de moda, lazer e ousadias”. Na imagem, três garotas foram “clicadas” em frente a um endereço conhecido da época, o bar Rock Dreams, cuja fachada misturava grafite, vitrine e a parte lateral da carcaça de um automóvel. Ousadia estética na época, quando a arte de rua ainda era novidade por aqui.

Veja Sao Paulo 1985 Setembro.pdf
“A magia dos Jardins”, de 85: com ilustração pincelada do artista plástico Ivald Granato (1949-2016) (Veja SP/Veja SP)

Na sequência, mergulha-se nas muitas atrações do “quadrilátero dourado da cidade”, em radiografia feita pelo jornalista Augusto Nunes, muito tempo antes de sua atual encarnação de polêmico comentarista político. Por quadrilátero entenda-se os limites do território: Avenida Paulista e Rua Estados Unidos ladeadas pelas avenidas Nove de Julho e Rebouças. Telmo Martino, o colunista mais festejado e odiado da época, do falecido Jornal da Tarde, costumava dizer que “nada de muito importante acontece do lado errado da Rebouças”. Ah, não costumava-se considerar a popular Rua Augusta nessa geografia da sofisticação.

“Quem anda por aqui tem o perfil do poder: é rico, elegante, culto, belo e sofisticado”, somos informados pela galerista dos Jardins que era então a voz mais estridente e poderosa do circuito paulistano das artes. Declaração que, se feita hoje, seria inspiração para a criação de inúmeros memes e motivo de inevitável indignação e cancelamento. Porém, na época da geração yuppie — abreviação de young urban professional — havia até quem chamasse os Jardins de “Manhattan paulista”, a sério. A “suave vida nos Jardins”, o título da matéria, aparecia na reportagem coalhada de cifras, como se nos Jardins todo mundo, literalmente, nadasse em dinheiro. O metro quadrado para a compra de um apartamento era negociado a 4 milhões — o mesmo valor do salário do barman do bar Supremo, saudoso clássico boêmio da cidade. Na tradicional, e sempre cara, Casa Santa Luzia, 1 quilo de salmão fatiado saía por 400.000, enquanto a garrafa de vinho do Porto da Companhia Velha alcançava 1,45 milhão. E um ponto comercial na Rua Oscar Freire, “a mais badalada”, custava cerca de 200 milhões. Para efeito de conversão: a moeda vigente era o cruzeiro.

foto Veja Sao Paulo 1985 Setembro-2
Na capa número 1: o extinto Rock Dreams com uma carcaça de carro na fachada (Emidio Luis/Veja SP)

Ouvida pela reportagem, a então editora da revista Claudia Moda, Costanza Pascolato, via a região como a grande passarela da cidade e foi certeira: “Os Jardins representam hoje para os paulistanos o que Ipanema foi para os cariocas há alguns anos”. As dicas de estilo da matéria lembram nomes hoje esquecidos do imaginário fashion — como Marco e MarceloBeauty, T. Macchione, Mr. Wonderfule Márcia Pinheiro — e também os que ainda mantêm vitrines no bairro— Richards e Forum.

+Assine a Vejinha a partir de 6,90

No menu dos Jardins de 1985, havia os restaurantes Oscar — com decoração de imagens de filmes da era de ouro de Hollywood —, o Salad’s, o Manhattan, o francês L’Arnaque, a pizzaria Otello — que ficava aberta até mais tarde —, o Sanduíche e os sobreviventes Z Deli e Frevinho, além do impávido colosso, a churrascaria Rodeio, um clássico desde 1958. A noite era do Rose Bom Bom, onde o empresário Ângelo Leuzzi (1956-2020) fez história lançando bandas e DJs que estouraram. E, mais do que tudo, do Gallery, QG da high society e das celebridades— antes de serem famosas apenas por quinze minutos— que dançavam e se esbaldavam ao som da banda de Hector Costita. Porém, houve algumas ausências inexplicáveis na féerie noturna dos Jardins: o Plano’s Bar, na Oscar Freire, sóbrio, elegante e old school — mulheres não entravam desacompanhadas —, o Ritz, da Alameda Franca, e o VictoriaPub, na Lorena, ambos redutos de uma turma jovem, alternativa e diversa.

Finalmente, os personagens emblemáticos do pedaço, como o Carioca — proprietário da banca de jornais na esquina da Oscar Freire com a Bela Cintra —, a modelo e escritora Bruna Lombardi, a fotógrafa Vania Toledo (1945-2020), o estilista baiano Ney Galvão (1952-1991) —sucesso popular quando substituiu o encrenqueiro Clodovil nas manhãs globais do TV Mulher — e o empresário, perfumista e artista plástico, Aparício Basílio da Silva (1936-1992), estabelecido no bairro desde 1956, com sua butique de perfumes Rastro, na Rua Augusta.

Continua após a publicidade

“Os Jardins são o núcleo mais charmoso, agradável, divertido e agitado da cidade de São Paulo” , resumia o presidente da Paulistur na época, um jovem de 27 anos chamado João Dória Junior, morador da Alameda Jaú, dizendo não querer mais sair dali, mas migrou para o Jardim Europa. O quadrilátero dos Jardins em 1985, visto de 2020, revelou-se nostálgico, curioso, irônico e muito divertido.

35 ANOS DE VEJINHA

confira as reportagens do especial de aniversário:

De volta ao Jardins: área mais quente de SP foi tema de estreia na Vejinha

Mais famoso pelo apelido, o Jardim Paulista marcou a primeira edição de Veja São Paulo com a posição (inalterada) de point do agito e sofisticação

O Rei do Camarote: relembre a polêmica capa da Vejinha em 2013

Champanhe, “babá de Ferrari”, memes e prêmio do YouTube: sete anos depois, veja os detalhes da apuração da matéria

Como estão os campeões da Fuvest destacados pela Vejinha em 1993

O candidato de odontologia Fábio Nogi, 47, deixou as clínicas de lado e migrou para a área corporativa da odontologia

Como estão os “partidões” que estrelaram a capa da Vejinha em 1993

Hoje, revista seria “cancelada” (com razão) se publicasse a reportagem, mas o texto revela o espírito da época em São Paulo

As mudanças que ocorreram nos cinemas (e em mim) nos últimos 21 anos

Membro mais antigo da redação de VEJA São Paulo, o crítico Miguel Barbieri Jr. reflete sobre sua trajetória profissional nas últimas duas décadas

As transformações na profissão de Chef em São Paulo

Como observador privilegiado, Arnaldo Lorençato acompanhou a revolução na gastronomia paulistana e viu a profissão de cozinheiro ganhar nobreza

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 30 de setembro de 2020, edição nº 2706. 

Continua após a publicidade
Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Domine o fato. Confie na fonte.
10 grandes marcas em uma única assinatura digital
Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja SP* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de São Paulo

a partir de 49,90/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.