Novas livrarias aquecem o setor na capital com catálogo enxuto, obras raras e decoração caseira
Novos endereços são Santa Cecília, Pompeia e Vila Clementino e foram inaugurados com acervo e espaço menores
Móveis usados trazidos da casa do mineiro Bruno Eliezer, 31, decoram sua nova livraria em Santa Cecília, batizada de Ponta de Lança e aberta neste mês no endereço onde antes funcionava o bar Heute. “Como mobiliar sem recursos? Trouxe minha cadeira, minha mesa, minhas estantes… E meus livros”, narra. Depois de se formar em letras e se mudar para São Paulo com “uma malinha de roupas e várias malas de livros”, ele manteve o sonho de trabalhar como livreiro vendendo obras na sala de casa, com hora marcada. Assim nasceu seu sebo, que precisou migrar para um espaço fixo pouco tempo depois. “Quando lotei a casa, recebi um ultimato da Vanessa, minha parceira, e tive de me mudar para a Nove de Julho”, conta. “Comprar e vender livros se tornou meu negócio.”
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O estilo do atual empreendimento parece uma continuação do antigo bar, que também dispunha de móveis e sofás velhos (ou charmosamente surrados) na decoração. Mas conquistar o aluguel do local envolveu muita lábia de vendedor. “Quando o Heute deixou de existir, entrei em uma longa negociação com a proprietária ao saber que o imóvel estava alugado para uma lavanderia… Eu muito insistentemente frisei que precisamos de mais livrarias e lugares para conversar, disse que os livros estão ficando em segundo plano, quando deveriam ser as coisas mais importantes da nossa vida”, profetizou.
Após ter garantido o espaço, ele planeja manter um acervo de 4 000 títulos com uma seleção de clássicos e lançamentos de literatura brasileira e latino-americana. “Continuaremos integrados com o catálogo do sebo, onde trabalhamos com obras esgotadas e fora de circulação ou livros de editoras que fecharam e são difíceis de encontrar.” Além de revistas jurídicas, primeiras edições e títulos franceses de autores como Gustave Flaubert, hoje seu livro mais caro na lista é The Secret Life of Salvador Dalí (Dial Press), que custa 15 000 dólares. “Ninguém tem no Brasil e esse é o preço mais baixo”, justifica.
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Na mesma semana em que Bruno abriu as portas, o jornalista Alfredo Caseiro, 52, também inaugurou sua própria livraria, a Pé de Livro, na Pompeia. Dedicada a obras infantis, a novidade é um sonho antigo do paulistano, que optou por esse nicho após montar um plano de negócios. “Descobri que esse segmento era um que crescia a despeito do resto do setor”, observa. Das cerca de trinta editoras já conhecidas por ele, sua pesquisa revelou noventa especializadas nesse público. A seleção do acervo de 1 500 livros levou oito meses. “Procurei incluir temas como antirracismo, mundo indígena e diversidade de gênero”, explica. “Para as seções, criei um universo não convencional com divisões como ‘para ler junto’, ‘os pais adoram’ e ‘monstruosos, nojentos e assustadores’.” A organização dos livros também é diferente. “Sempre me incomodou torcer o pescoço para ler a lombada nas prateleiras, então, mesmo em um espaço pequeno, priorizo deixar as capas expostas. Acabou sendo uma maneira de homenagear os ilustradores.”
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Na mesma toada, a infantil PanaPaná, do bairro Vila Clementino, está sob nova direção desde o fim do ano e passou a operar nas mãos da engenheira mecânica Fernanda Martins Simonsen. “Eu sempre morei perto, frequentava com meus filhos e não queria vê-la fechar as portas”, diz. Para atrair novos clientes, ela aposta na venda de livros com dedicatórias dos autores e destaca o ambiente colorido e acolhedor do lugar. “Livraria não é uma coisa que dá muito dinheiro, mas a gente vende a experiência.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 18 de agosto de 2021, edição nº 2751