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De balada a Fórmula 1, São Paulo prepara retomada gradual

Governo fará cinquenta eventos-teste com aglomerações controladas e reabrirá escolas, enquanto restaurantes ensaiam recuperação; médicos alertam para riscos

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2024, 19h54 - Publicado em 23 jul 2021, 06h00
A imagem mostra uma ilustração. Há uma balada ao fundo, e na frente, uma fila de pessoas de máscara esperando sua vez de serem testados para Covid-19, como acontece com a pessoa no fim dela.
Com testagem e vacinação obrigatórias, governo e empresários ensaiam retomada do setor de festas e eventos, há mais de um ano sem trabalhar (Tiago Ots (@otsss)/Veja SP)
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De uma hora para outra a luz se apagou, o som foi desligado, a porta se fechou, o público sumiu e o caixa secou. Impedido de trabalhar desde março do ano passado, o setor de festas, baladas e eventos, que possui mais de 150 000 empresas no estado e depende de aglomeração em espaços fechados ou abertos para sobreviver, foi um dos que mais sofreram com a chegada do coronavírus a São Paulo. Agora, um sinal de esperança, em forma de cinquenta eventos-teste, realizados entre julho e dezembro sob o crivo do governo estadual, promete fornecer a empresários uma chance de planejar uma volta à vida de dezesseis meses atrás, em meio aos riscos de elevação de contágio provocado pela variante delta.

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Com protocolos rígidos antes, durante e depois dos eventos, o projeto prevê público reduzido, testagem na porta, vacinação obrigatória (quando toda a população for imunizada), monitoramento posterior dos presentes e assinatura de termos de consentimento. “A retomada terá um caráter científico. Vamos estudar as populações e os resultados dos testes guiarão as decisões de retomada econômica dos setores”, afirma a secretária de Desenvolvimento Econômico, Patricia Ellen. “Estamos criando a força-tarefa do bem”, diz, referindo-se ao grupo criado pelo governo do estado e pela prefeitura, com a participação do deputado federal Alexandre Frota, para combater festas e aglomerações clandestinas no estado.

O primeiro teste ocorreu na quarta e quinta-feira passadas (21 e 22), em Santos. Chamada de Expo Retomada, uma feira de negócios reuniu quarenta expositores e 1 500 visitantes em cada dia. Até o fim do ano, na capital, estão previstos uma corrida de rua, uma feira de economia criativa, de oito a dez baladas, a Campus Party, a Comic Con Experience (CCXP), quatro shows no Allianz Parque, uma partida de futebol e a Fórmula 1, entre outros. Esse último será o maior dos eventos, com público estimado em até 70 000 pessoas.

“Não estamos obrigando ninguém a participar dos eventos. Se a pessoa se compromete a ir, precisa estar de acordo com as regras. Se começar a quebrar o regramento, ela vai ser convidada a se retirar. Não é um liberou geral.”

Eduardo Aranibar, subsecretário de Desenvolvimento Econômico do estado

No segmento da noite paulistana, cerca de dez empresários se uniram a uma associação para montar um protocolo que foi apresentado ao governo. Prevista para ocorrer a princípio em 13 de agosto, a primeira balada não clandestina da capital deverá ser no Mahau, na Vila Nova Conceição. Com capacidade para 500 pessoas, o espaço poderá receber 30% do público em um evento de música eletrônica, que deverá varar a madrugada, ainda com mais perguntas do que respostas.

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“Estamos tentando aumentar a quantidade de pessoas para 50%”, afirma o empresário Cesar Roberto Ferreira, 48, um dos donos do espaço. Outra dúvida é quanto à testagem das pessoas. “Vamos testar no dia ou a pessoa poderá trazer o resultado de casa? Eu prefiro testar na hora, por isso vamos colocar uma tenda com enfermeiros”, diz Cesinha, como é conhecido na noite paulistana.

Além de custear os testes, os empresários deverão se encarregar não apenas do cumprimento dos protocolos básicos, como a obrigatoriedade do uso de máscara e de álcool em gel, mas também do monitoramento póseven to, de funcionários e do público. Os dados deverão ser compartilhados com a gestão estadual. Contando com a contratação de empresas de sanitização, o custo extra de um evento-teste pode passar dos 30 000 reais, no caso das baladas.

A imagem mostra César Ferreira sentado sobre uma mesa de seu estabelecimento enquanto olha para a câmera com expressão séria.
Cesar Ferreira: dezesseis meses de prejuízos (Alexandre Battibugli/Veja SP)
A imagem mostra dois homens com equipamentos de proteção dos pés a cabeça limpando uma mesa dentro do Mahau
Empresa de sanitização Turbo Jato faz limpeza no Mahau: candidato a primeira balada não clandestina (Alexandre Battibugli/Veja SP)

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Enquanto os empresários se movimentam para criar os eventos, o governo do estado trabalha para adequar todos os interesses. Nos próximos dias, Patricia Ellen vai divulgar no Diário Oficial um chamamento público com as regras para quem quer participar. As propostas deverão ser enviadas por associações que representam os setores e que tenham sido instituídas há pelo menos um ano.

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Representante das casas noturnas que farão parte dos testes, o produtor cultural Beto Lago afirma que os empresários se uniram em uma boa hora.“Isso foi uma coisa boa que a pandemia trouxe, se é que podemos falar assim. Os empresários não conversavam entre si e se viam apenas como concorrentes. Agora eles se uniram para conseguir participar do plano de retomada e também para baratear custos”, diz Lago, presidente da Associação da Noite e do Entretenimento Paulistano (Anep). A ideia do setor é comprar os testes de Covid de forma conjunta, o que poderá reduzir o valor, hoje em cerca de 80 reais a unidade. Outra possibilidade é a obtenção de um patrocínio, com a ajuda do governo estadual, e conseguir zerar pelo menos esse encargo.

Depois das primeiras baladas, será a vez das feiras de eventos. Prevista para ocorrer em uma área aberta do Memorial da América Latina entre 21 e 22 de agosto, a Feiras Criativas, focada em pequenos empreendedores, vai reunir 4 200 pessoas nas duas datas e também terá protocolos rígidos, mas ainda a vacinação não será condição essencial para o ingresso do público.

“Criamos um escalonamento de público, para evitar aglomerações e limitaremos em 225 o número de pessoas por hora”, afirma Jorge Damião, presidente do memorial. “Nosso objetivo principal é trabalhar a retomada da confiança do público. Antes da pandemia nós recebíamos 20 000 pessoas em fins de semana, em feiras, shows. Perdemos 92% de nossas receitas e precisamos mostrar a importância de uma retomada segura.”

A imagem mostra a escultura na Praça do Sol, uma mão aberta elevada com um desenho vermelho na palma dela.
Memorial da América Latina: queda de 92% nas receitas (Sérgio Tauhata/Divulgação)

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Depois das feiras, a sequência de eventos vai chegar aos grandes shows. Previsto para receber quatro apresentações (duas em outubro e duas em novembro), o Allianz Parque começará com um público entre 5 000 e 10 000 pessoas e almeja pelo menos um evento com capacidade máxima, de 45 000 pessoas. Nesse momento, a vacinação será obrigatória, mas o modo de confirmação ainda precisa ser ajustado.

Mas, antes de programar as atrações, a questão econômica, juntamente com a sanitária, é o principal desafio da empresa. Além do custo extra com os protocolos sanitários, também haverá a necessidade de monitoramento pós-evento, o que elevará os custos. “Entramos no projeto sabendo do risco, pois estamos em um momento delicado, após um ano e meio sem trabalhar com grandes eventos. É difícil aceitar mais prejuízos, mas estamos dispostos a assumir os riscos, mesmo com lucros baixos”, afirma Claudio Macedo, CEO da WTorre Entretenimento, empresa gestora do Allianz Parque.

Como forma de aumentar as receitas, Macedo pretende criar modelos de negócios inexistentes antes da pandemia. “Vamos explorar o modelo digital. Tem gente que não consegue comprar o ingresso ou mora longe, mas está disposta a pagar um determinado valor para assistir aos shows on-line.”

Apesar dos esforços dos setores público e privado para uma retomada segura e gradual, a realização de eventos-teste em momento epidemiológico com patamar alto não deveria ocorrer, segundo especialistas. “Estamos ainda com uma taxa de transmissão muito alta. São 40 000, 50 000 casos de Covid por dia, sem falar na circulação da variante delta. Acho uma temeridade fazer eventos nesse cenário”, afirma o médico infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira Imunizações. “É como colocar um goleiro bom no jogo e enchê-lo de bolas. Uma hora a bola entra no gol. No cenário dos eventos, a bola da Covid está sendo chutada a todo momento.”

Exemplos mundo afora que corroboram com a opinião de Kfouri não faltam. Na Holanda, após um show com 20 000 pessoas nos dias 3 e 4 de julho, mais de 1 000 pessoas foram infectadas. Ali, todo mundo teve de apresentar certificados de vacinação ou testes negativos para coronavírus. Uma semana depois do evento, o primeiro-ministro Mark Rutte admitiu ter sido um erro o governo retirar a maioria das restrições para a contenção da pandemia.

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Na última segunda-feira (19), em Londres, imagens de jovens e adultos bebendo e dançando nos famosos pubs ganharam o mundo. Chamada de “dia da liberdade”, a data, marcada pelo afrouxamento das últimas medidas de segurança, ocorre no momento em que houve um aumento de 43% no contágio e de 40% nas hospitalizações. No país, o índice de primeira dose da vacinação é de 87,9%, contra 68,3% da segunda dose.

A imagem mostra um show sendo realizado na Holanda, com uma aglomeração imensa de pessoas em frente à um palco.
Evento de música na Holanda: 1 000 pessoas infectadas (Festival Verkanipt / Facebook/Divulgação)

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Por aqui, ao mesmo tempo que o governo do estado estuda uma retomada gradual, a prefeitura paulistana criou um grupo de trabalho para acelerar o retorno dos eventos corporativos. “Vamos fazer diferente do estado e focar a eficácia gerada pela vacinação da nossa população”, afirma o prefeito Ricardo Nunes, que quer aproveitar a taxa de 80% de imunização atingida no público adulto até o fim de semana para estimular a reabertura de diversos setores.

Os números da cidade são maiores do que a média geral do estado, que na última quarta-feira (21) estava em pouco mais de 51%. “Se tem público vacinado, por que não liberar uma feira ou um congresso? Com o pé no chão, sem criar novela, vamos focar na vacina”, resume (e alfineta) Nunes. Outras liberações também foram anunciadas recentemente.

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Depois de retomar o projeto de abertura aos pedestres na Avenida Paulista aos domingos, o prefeito vai estender o horários dos parques municipais, reinaugurar o Vale do Anhangabaú (após uma polêmica reforma de 105 milhões de reais) e reabrir os centros esportivos, fechados desde março de 2020.

Enquanto se fala em libera geral ou em retomada gradual, nunca é tarde lembrar que o governador João Doria está há mais de uma semana em quarentena, depois de contrair Covid-19 pela segunda vez. E o prefeito, que esteve com o tucano um dia antes do anúncio da doença, passou o fim de semana seguinte de molho em casa, como precaução. Seus testes deram negativo.

“É importante deixar claro que as festas e aglomerações continuam proibidas.”

Patricia Ellen, secretária de Desenvolvimento Econômico do estado
Imagem mostra grande quantidade de pessoas na Avenida Paulista neste domingo ensolarado de inverno. Muitas pessoas usam máscaras, mas muitas também não usam
Público na Avenida Paulista, no domingo (18): horário reduzido (Alexandre Battibugli/Veja SP)

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Como será o modelo de testagem?

Ainda não foi definido. Pode ser tanto de apresentação do teste quanto de realização no local.

Quem vai pagar pelos testes?

O custo será do empresário, que poderá repassar o valor. Mas há possibilidade de obtenção de patrocínios.

A vacina será obrigatória?

Sim, a partir do momento em que todo o público elegível for imunizado no estado.

Quem vai fiscalizar o cumprimento das regras, como o uso de máscara?

Cada estabelecimento será encarregado de fiscalizar, sob a vigilância dos órgãos sanitários.

Qualquer um pode ir a um evento-teste?

Sim, desde que assine um termo de consentimento, comprometendo-se a respeitar as regras de antes e depois.

A imagem mostra alunos em uma sala de aula, distanciados, usando máscara enquanto escrevem em cadernos nas suas mesas.
Escola estadual paulista: reforço para quem não conseguiu acompanhar aulas remotas (Secretaria da Educação do Estado de São Paulo/Divulgação)

A VOLTA DA VOLTA ÀS AULAS*

O governo do estado e a prefeitura autorizaram o retorno em massa dos alunos de escolas públicas e particulares. Agora, cada unidade pode decidir sua própria capacidade de atendimento físico, mas a presença dos alunos continua sendo opcional.

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Nas creches municipais, a limitação permanece em 60%. No estado, as escolas promovem entre os dias 19 e 30 de julho um programa de recuperação intensivo para quem não acompanhou o cronograma de aulas remotas. Nos colégios particulares da metrópole, a expectativa é de maior presença de alunos.

Consultadas por Vejinha, sete dessas escolas anunciaram 100% de disponibilização dos seus espaços. Avenues, Porto Seguro, Pueri Domus, Mackenzie e Poliedro esperam receber 90% dos estudantes. O colégio Bandeirantes, por sua vez, tem estimativas menores, de 70%.

*Colaboraram César Costa e Maria Alice Prado

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Publicado em VEJA São Paulo de 28 de julho de 2021, edição nº 2748

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