Famílias se recusam a deixar o Cine Marrocos após decisão da Justiça
Setenta famílias que ainda estão no prédio invadido em 2013 dizem não ter para onde ir nem dinheiro para alugar um imóvel ou pagar pensão
Cerca de um quarto das 300 famílias que ocupavam o prédio do antigo Cine Marrocos, no centro de São Paulo, não deve deixar o local apesar da reintegração de posse determinada pela Justiça. O edifício de doze andares pertence à prefeitura e a operação de reintegração de posse está marcada para este fim de semana.
As setenta famílias que ainda estão no prédio invadido em 2013 dizem não ter para onde ir nem dinheiro para alugar um imóvel ou pagar pensão. Trinta e oito delas receberam o auxílio-aluguel da prefeitura, no valor de 400 reais por mês, mas não conseguiram sacar o dinheiro por causa da greve dos bancários.
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“Está tudo fechado e o gerente não atende a gente. Com esse auxílio já é difícil alugar alguma coisa; sem esse dinheiro, não tenho para onde ir”, afirma José Carlos Bellucci, de 72 anos, que mora há três no local.
É também o caso de Ana Shelri, de 32 anos, que se mudou há um ano para o Cine Marrocos com seus três filhos após o marido ser demitido do emprego de garçom e o casal ficar sem dinheiro para pagar 600 reais em uma pensão no Glicério, no centro da capital. “Se tivessem dado um auxílio, pelo menos a gente tentava encontrar uma pensão. Estou desesperada. Vão tirar a gente daqui no sábado e não sei o que fazer com meus filhos”, conta.
A reintegração foi determinada no fim de agosto pelo juiz Emílio Migliano Neto, da 7.ª Vara da Fazenda Pública da capital. A primeira ordem para desocupar o prédio, que deveria ter sido cumprida no começo do mês passado, foi suspensa a pedido da prefeitura porque os ocupantes do edifício ainda não tinham assistência social. O prédio será reformado para abrigar a sede da Secretaria Municipal de Educação.
No local ainda há muitos idosos, mulheres e crianças brasileiros e estrangeiros. Segundo a Missão Paz, organização da Igreja Católica que mantém a Pastoral dos Migrantes, o prédio chegou a abrigar 253 imigrantes e refugiados de 25 nacionalidades que vieram para São Paulo nos últimos três anos. “Cheguei aqui há três meses e não sabia que ia ter de sair tão logo. Para mim não ofereceram nada porque não tenho documento brasileiro”, diz a peruana Cíntia Valencia, de 31 anos, que trabalhava como costureira no próprio edifício ocupado.
Quem já saiu foi para casa de parentes, abrigos oferecidos pela Prefeitura, outras ocupações de prédios na região ou foi morar na rua, muitos temendo um confronto violento com a polícia na reintegração.
Até o mês passado, a liderança da ocupação era do Movimento Sem Teto de São Paulo (MSTS), cujos organizadores foram presos em uma operação contra o tráfico de drogas na Cracolândia. Cada família pagava entre R$ 200 e R$ 400 por mês, dependendo das instalações ocupadas, para custear as contas de água, luz e a limpeza do prédio.
Segundo o coordenador da Defesa Civil, Milton Persoli, o trabalho para uma desocupação amigável é feito há um ano pela Prefeitura e o auxílio-aluguel foi oferecido para famílias de vulnerabilidade social, conforme prevê a lei. “Todas as famílias estão sendo assistidas pela Prefeitura e nós já notificamos a juíza da ação sobre a dificuldade de sacar o auxílio-aluguel por causa da greve dos bancários. Vamos aguardar se a ação vai prosseguir ou não.”