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“É uma porta que ninguém vai entrar”, diz Sérgio Dias sobre Rita Lee

Em entrevista à Vejinha, o guitarrista fala da sua relação com o irmão Arnaldo Baptista e a turnê mundial, mas não sobre a ex-companheira de Os Mutantes

Por Tomás Novaes
Atualizado em 2 jun 2023, 09h33 - Publicado em 2 jun 2023, 06h00

Sérgio Dias, 71, atendeu a chamada telefônica de sua casa em Las Vegas, nos Estados Unidos.

Estava se recuperando de uma gripe, se protegia do frio com um casaco e um gorro. Ao longo da conversa, dava para ouvir que a residência estava cheia, com a companhia dos demais integrantes de Os Mutantes.

“Passamos sete dias aqui. Estamos mexendo em tudo, fazendo experimentos, gravando coisas”, contou o músico paulistano. É o momento de respiro para a turnê mundial da banda, que está na estrada desde 2006, quando, após 28 anos, voltou à atividade em uma nova formação.

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Nesta quinta-feira (1o), no Cine Joia, o grupo fez seu primeiro show no Brasil após a morte de Rita Lee (1947-2023), na cidade onde nasceu o trio original, completado por Arnaldo Baptista, irmão mais velho de Sérgio.

“É uma pena, gostaria de fazer muito mais shows em São Paulo. É a minha casa”, diz o guitarrista. Neste sábado (3), Sérgio também estará com a banda no festival João Rock, em Ribeirão Preto.

Leia sobre o último disco do grupo, a pandemia e a relação com Rita e Arnaldo.

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O último disco dos Mutantes, Zzyzx (2020), é inspirado pela sua vida em Nevada. Qual a história desse título?

Zzyzx é o que está escrito em uma das saídas da rodovia entre Las Vegas e Los Angeles, que leva à Área 51. Quando vi aquela placa, pensei: “O que é isso? Conheço Cleveland, Ohio, mas isso eu nunca ouvi falar na vida”. Então a gente entrou lá. Logo chegou um monte de polícia, não sei de onde, e tocaram a gente para fora. Eles disseram: “É melhor vocês saírem, porque aqui a gente tem direito de matar”. Então saí cantando pneu e fui embora. (risos) Disco voador é coisa que a gente conhece desde que nasceu. Minha mãe viu há muito tempo, e esses dias eu também vi uma formação inexplicável no céu. Adoraria investigar isso a fundo, para ver o que tem por trás da minha vida que eu não sei.

E como é morar fora do Brasil? Sente saudade daqui?

Eu defini isso em uma música chamada Cidadão da Terra, nos anos 70. O mundo agora virou uma coisa muito pequena, bicho. Por exemplo, essa turnê: nem sei quais são os países. Sei que vamos tocar na Grécia, na França, na Espanha, na Inglaterra, na Holanda. Isso tudo é a minha vida. Os palcos são os mesmos. Não faz diferença. Você entra no palco e está vivendo aquele momento que tem uma mágica e uma intensidade que nenhum outro momento na sua vida tem.

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Essa é a primeira grande turnê que fazem depois da pandemia. Compôs ou gravou algo nesse período?

Foi uma porrada. A gente lançou o disco em 2020 e parou. Foi uma hecatombe. Eu não tinha vontade de fazer porcaria nenhuma, então fiquei assistindo televisão, Downton Abbey umas cinco vezes ou The Crown. Chega a um ponto que, tecnicamente, você vai estudar o quê? Tenho o conhecimento do meu instrumento e tenho que ter um porquê de fazer isso. Aquilo não me motivava nada, ver aquelas covas. Eu disse tudo em todos os meus discos, está tudo lá. Em Estação da Luz (2000), todas as perguntas estão respondidas para a juventude do Brasil. Então, o que vou falar de novo? Agora, fazer live, essas coisas, é a coisa mais chata do planeta. Aquilo foi um pesadelo.

“Ninguém tem direito a isso. Dou a minha alma, entrego a minha vida, faço tudo, mas tem coisas que são minhas. Então isso, sinto muito, eu guardo para mim”

E como é voltar à estrada depois da pandemia?

Palco é o meu negócio. Nesses três anos, não fiz nada. Lembro que, na volta, fizeram aquilo de reunir 1 000 músicos para tocar no Allianz Parque e me convidaram para fazer A Minha Menina. Quando entrei, era tão grande, tão cheio de gente, tanta euforia, que foi uma porrada na boca do estômago. Fazia muito tempo que eu estava fora dessa frequência. Foi um absurdo, muito forte. E, logo depois, show atrás de show. E vem sendo maravilhoso.

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Acompanha a música brasileira atual?

Honestamente, não tem dado tempo. Desde 2006, a gente está na estrada. Nesse meio tempo, cancelei só um show, porque tive uma septicemia no corpo inteiro. No show seguinte, quinze dias depois, em Nova York, fui tocar com dois tubos no braço e uma sonda direto no coração, para jogar antibiótico. É esse o nível de velocidade da coisa. Você não dorme, come em posto de gasolina, não dá tempo. E como vou ouvir música brasileira se estou no mundo inteiro?

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Agora, gostaria de te perguntar sobre a Rita. Como você soube da notícia da morte dela?

Não. Isso é uma porta que ninguém vai entrar. Isso é meu e dela. Ninguém tem direito a isso. Dou a minha alma, entrego a minha vida, faço tudo, mas tem coisas que são minhas. Então isso, sinto muito, eu guardo para mim.

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Mantém algum contato com o Arnaldo?

Não tenho acesso a ele. Infelizmente. Depois que ele saiu da banda, não teve como. O lado dele não permite. Eu nem tento, porque, no fim das contas, quem vai sofrer é ele. Se acontecer, vai ser ótimo, as portas estão completamente abertas, escancaradas. Sempre estiveram, para todos eles. Para a Rita, o Arnaldo, o Dinho (baterista) e o Liminha (baixista). Você viu o que aconteceu. Toda vez que me pediram para tocar com qualquer um deles, sempre estive lá. O meu amor é incondicional. Agora, também tenho que defender a minha alma. Não posso ficar sofrendo por uma coisa que não me diz respeito.

Pensam em fazer alguma homenagem a Rita no show em São Paulo?

Como eu disse, de novo: nessa porta baterás e não entrarás. Sabe aquela coisa de Deus? Você sabe me dizer quem é Deus, para você? Sabe determinar isso? Então, está aí a sua resposta. Nessa coisa de crenças e afins, não se mexe. Mas você me perguntou sobre homenagem: em todas as músicas que vamos tocar que são parte da nossa vida, ela está lá.

No dia da morte da Rita (8 de maio), eu conversei com a Esméria (atual vocalista do grupo Os Mutantes), e ela disse que a homenagem eterna é seguir tocando as músicas de vocês três. Você também pensa assim?

Ela, Arnaldo, eu, Liminha e Dinho. Aquilo era uma unidade completa. Nunca foi o Arnaldo e os Mutantes, eu e os Mutantes, Rita e os Mutantes. Éramos nós três.

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