Registros instantâneos de Andrei Tarkóvski
Mostra no Masp reúne oitenta polaroides e revela o talento do cineasta russo também na fotografia
Nenhum cinéfilo precisa de maiores apresentações quando se trata de Andrei Tarkóvski (1932-1986). Nome por trás de algumas obras-primas das mais sensíveis e metafísicas da história do cinema, caso de Andrei Rublev (1966), Stalker (1979) e O Sacrifício (1986), o diretor tornou-se objeto de culto pelos takes longos e pela direção de arte esfumaçada. Não à toa, ele está sendo homenageado com uma retrospectiva na 36ª Mostra Internacional de Cinema.
O talento do russo, contudo, estende-se também a outro tipo de câmera, a fotográfica: ele chegou a registrar mais de 300 polaroides. Oitenta delas, clicadas de 1979 a 1984, foram reunidas na mostra Luz Instantânea, em cartaz no subsolo do Masp, e em uma caprichada edição da Cosac Naify (160 páginas; R$ 48,00).
Diminutas, as obras, apesar de mantidas em condições rígidas de temperatura, devem ser vistas pelo público enquanto ainda existem, já que as características das polaroides é começar a desbotar e não deixar negativos.
Tarkóvski fotografava nos intervalos de filmagens e no dia a dia. Os principais personagens dos trabalhos foram a sua mulher, Larissa Tarkovskaya, o filho deles, Andrei (curador da montagem, aliás), e o simpático cão da família, Dak (além de um gatinho menos presente, Grisha).
Os três aparecem retratados sempre sob um viés terno e gentil. Mas é nos espaços vazios — a casa de campo da família, um lago, o campanário de uma igreja, as ruas de uma cidade medieval — que o silêncio contamina o espectador e o obriga a se comover. O realizador consegue algo raro e admirável: suspender e, para citar o título de seu livro de memórias, esculpir o tempo.