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Como o delivery de comida mudou a rotina da cidade

Impulsionado pelas plataformas digitais, o hábito de pedir refeições vem transformando o cenário gastronômico e até a arquitetura de São Paulo

Por Gabrielli Menezes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Saulo Yassuda Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 20 jan 2022, 09h46 - Publicado em 13 mar 2020, 06h00

Antes uma ação esporádica — aquela pizza no jantar de domingo —, encomendar uma refeição para ser entregue em casa ou no trabalho virou uma constante de muita gente da capital. O almoço da firma, anteriormente no bandejão da empresa ou em um bufê por quilo, agora pode ser feito na mesa do endereço comercial — e com sushi e hambúrguer recém-desempacotados. O pijama, quem diria, pode virar o figurino de um jantar com pratos vindos do restaurante fino — mas no conforto do sofá de casa. Nem é mais necessário ferver a água de manhã — o cafezinho nosso de cada dia chega de motoca, pronto para ser tomado. O delivery tem mudado (e muito) essas e outras cenas do cotidiano da cidade. Faz tempo que solicitar comida de fora deixou de ser um ato contra a preguiça de cozinhar. Uma comodidade hoje desfrutada 24 horas por dia, a prática tem crescido com força extraordinária na era digital. De acordo com a pesquisa Crest, realizada pela GS&NPD em parceria com o Instituto FoodService Brasil, os pedidos movimentaram 20,5 bilhões de reais no país em 2019. “Observamos que o número de encomendas cresce em variadas ocasiões de consumo, como o café da manhã. Não é só no óbvio momento do jantar nos fins de semana”, diz Vólia Simões, gerente de inteligência de mercado da Govêa de Souza. A importância dessas mudanças de hábito se agigantou tanto que até o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tem estudado como fazer o acompanhamento na próxima Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).

Muito desse movimento, que afeta até a arquitetura da cidade — prédios comerciais, residenciais e shoppings vêm recebendo adaptações estruturais para se adequar à rotina do trânsito de produtos —, se deve ao crescimento de plataformas que facilitam o serviço pelos smartphones. É difícil fugir delas. Só no setor digital, os pedidos cresceram 71% em 2019, de acordo com a Crest, ou seja, de 387 milhões para 662 milhões. As encomendas por telefone ainda representam 53% desse mercado, mas estão longe de demonstrar crescimento.

Sócio, advogadas e estagiários do KLA: delivery virou hábito no almoço do escritório (Alexandre Battibugli/Veja SP)

As agregadoras, como são chamados os aplicativos, reúnem em um único lugar um sem-número de restaurantes e outros estabelecimentos culinários, prontinhos, à espera de que você os acione com alguns poucos toques no celular e faça a sua escolha. Se há quem passe horas na Netflix selecionando o que vai assistir, acredite: há quem gaste boa parte do tempo decidindo o que vai comer no iFood, no Uber Eats ou na Rappi.

A mais famosa dessas marcas nacionalmente é o iFood. Nascido em 2011 em São Paulo, transformou-se em um gigante no mundo do delivery após aportes, fusões e aquisições — está presente em 912 cidades do país, conta com 131 200 restaurantes parceiros e atende 26,6 milhões de encomendas por mês (dado de novembro de 2019), além de manter operações no México e na Colômbia. Os números da capital não são divulgados, embora a empresa confirme que está entre seus maiores mercados. O funcionamento é parecido com o dos outros dois grandes players: ele faz a intermediação do contato entre restaurante e consumidor — e cobra uma taxa por isso. “Temos o compromisso de revolucionar o universo da alimentação e de inculcar o hábito do delivery no brasileiro”, diz o diretor comercial Felipe Crull. De acordo com o iFood, uma pesquisa da Kantar Ibope Media — Monitor Evolution mostra que a empresa foi o maior anunciante em TV do país na categoria serviços entre janeiro e novembro de 2019. Esse fenômeno invade até o terreno da ficção, com o merchandising em novelas como A Dona do Pedaço, sucesso de Walcyr Carrasco, colunista de VEJA, levado ao ar no ano passado.

O iFood se originou do Disk Cook, sua versão, digamos, primitiva criada em 1997. Na época em que pedir comida por telefone se traduzia em encomendar uma pizza, a precursora já fazia o meio de campo entre diversos tipos de estabelecimento e os consumidores — em uma escala muito menor em comparação com a que se vê hoje.

Braço de entrega da plataforma de mobilidade de mesmo nome, o Uber Eats nasceu em São Francisco (EUA) em 2015, chegou à capital no fim de 2016 e atualmente opera em mais de 100 cidades espalhadas pelo território nacional e em outros 36 países — soma 320 000 restaurantes cadastrados ao redor do globo. “O Brasil ainda pode crescer bastante nesse segmento. Nossa expectativa é que o país se transforme no segundo ou terceiro maior no mundo em entregas de comida on-line. Ainda há muito a fazer”, diz Fabio Tonetto Plein, diretor-geral da empresa no Brasil. Em 2017, foi a vez de a colombiana Rappi, fundada em 2015, desembarcar por aqui. Presente em outros oito países, todos na América Latina, a plataforma oferece, além do delivery de refeições, a opção “Qualquer coisa”, em que é possível também pedir pratos de lugares não cadastrados no app. “São Paulo reúne características únicas para que esse mercado seja potencializado, como o trânsito caótico e o dia a dia corrido”, acredita Fernando Vilela, head de growth, responsável pelo crescimento da empresa, que amplia seu escopo e faz até compras em supermercados, modalidade em que os outros dois concorrentes têm ingressado. A Rappi não divulga o número de estabelecimentos parceiros nem o de pedidos.

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Se iFood, Uber Eats e Rappi mostram a força no setor, há aplicativos que não são tão conhecidos ainda, como o James, exclusivo das redes de supermercados Pão de Açúcar e Extra, e o Apptite, dedicado à entrega de preparos caseiros. Outras plataformas não conseguiram vingar na capital. O espanhol Glovo, que teve um sopro de um ano de vida, decidiu sair do país em 2019 por causa do “mercado extremamente competitivo”. Por outro lado, há a expectativa de novidades. A 99, empresa de transporte adquirida pela chinesa Didi Chuxing em 2018, estreou o 99 Food no ano passado. Por enquanto, existem duas operações, uma em Belo Horizonte e outra em Divinópolis (MG).

O delivery pode representar uma alta fatia no faturamento dos restaurantes — de acordo com empresários entrevistados pela reportagem, a parcela pode chegar a 40% do total. Não por acaso, marcas que antes pouca gente imaginava que enviassem quentinhas para casa agora estão realizando essa prática. É o caso do Gero Panini, da grife Fasano, e da casa de grelhados Rubaiyat, ambas de grupos com a maior coleção de prêmios COMER & BEBER em 23 anos de publicação do guia anual de VEJA SÃO PAULO. “Talvez cinco anos atrás tomássemos um susto ao dizer a palavra ‘delivery’”, confessa Mayra Chinellato, diretora de operações de alimentos e bebidas do Grupo Fasano. “Como vimos outras marcas de luxo se dando muito bem nesse mercado, não tivemos receio em ingressar nele.”

A grande demanda por pratos em domicílio fez ganhar força um modelo de cozinha chamado de dark kitchen. Trata-se de espaço fechado ao público, projetado para o atendimento de entregas, onde podem operar restaurantes já estabelecidos ou grifes que não têm a intenção de dar as caras para a rua. A ideia é reduzir drasticamente custos e tornar a entrega mais eficiente. Uma das principais vantagens está na localização desses pontos, escolhidos estrategicamente para atender a clientela moradora de uma determinada região.

“De dia, as áreas que mais concentram pedidos são espaços com grande número de prédios comerciais e, à noite, onde estão muitos edifícios residenciais. Em alguns bairros mais nobres, há o encontro desses dois cenários, em especial na região que se estende da Paulista à Faria Lima, tendo Moema e Pinheiros como limites”, explica Tadeu Masano, presidente da consultoria Geografia de Mercado. “A demanda por delivery começou nos bairros mais ricos, onde o consumo ainda é mais forte, mas hoje já abrange regiões periféricas”, completa.

Se para alguns empresários esses aplicativos são uma possibilidade de melhorar o desempenho financeiro, há quem revele que o casamento não é uma eterna lua de mel. Uma das maiores críticas é a comissão, que, embora varie de acordo com o contrato firmado, pode chegar perto de 30%, segundo donos de restaurantes. “Como sou exclusivo do iFood, tenho uma das melhores taxas do mercado”, gaba-se o sócio de um estabelecimento que prefere não ser citado. Em algumas cidades do mundo, há esforços para regulamentar essa cobrança, como ocorre em Nova York.

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Renata Cruz, da Foodness: “relação com os aplicativos é um cabo de guerra” (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Outro ponto que dá o que falar é a maneira como os restaurantes aparecem na plataforma. Empresários reclamam de que os locais mostrados no topo — e que tendem a receber o maior número de pedidos — são aqueles que já possuem boas vendas e, muitas vezes, têm algum tipo de acordo com as agregadoras. “Pelo que entendi, são os aplicativos que determinam quem vai vender”, queixa-se Carolina Bastos, sócia do Jiquitaia. Depois de um ano oferecendo comida por dois apps, a empresária desistiu do delivery. “Com meu volume de vendas, não consegui destaque na plataforma, aí ficou difícil crescer. Cansei de ficar mendigando aos caras.” De acordo com agregadoras, que não admitem privilegiar certos lugares, critérios como hábitos de consumo do usuário e avaliações dos consumidores são levados em consideração na hierarquização dos estabelecimentos. As promoções feitas pelas redes gigantes e “truques” de alguns restaurantes, como criar marcas diferentes nos apps para aparecer mais vezes mesmo vendendo produtos idênticos, também entram na lista de insatisfações. Sócio da rede La Guapa Empanadas e do restaurante Mangiare Gastronomia, Benny Goldenberg considera que questões do gênero são explicadas pelo tempo de mercado. “Como é algo muito novo, nem os restaurantes nem as plataformas sabem ainda como jogar esse jogo de forma saudável”, diz. “Quem depender de constantes promoções não vai sobreviver a longo prazo.”

A relação entre os aplicativos e o restaurante é como um cabo de guerra”, avalia Renata Cruz, chef e fundadora da Foodness, consultoria de negócios gastronômicos.“Quando alguém cria uma empresa para posicioná-la só dentro das plataformas, é importante que entenda os riscos de não ter contato direto com os clientes. O crescimento fica dependente de um terceiro”, sentencia.

Pensando em emancipar-se dos grandes players, empresas vêm lançando seus aplicativos, ainda que muitas delas também operem em parceria com eles. Em geral, acabam tocando vidas paralelas, como o Cabana Burger e o Frutaria São Paulo. Fundada em 2016, a Delivery Direto, parte do grupo Locaweb, cria o aplicativo para mais de 1 800 restaurantes e cobra uma assinatura mensal. “Antes tínhamos de explicar todas as vantagens de ter um canal próprio. Hoje, os empresários nos buscam com a ‘dor’ definida”, diz o diretor Allan Panossian.

Com a evolução do mercado, muitos proprietários passaram a prestar atenção em outro elo importante, os entregadores, a maioria motoboys. Eles podem trabalhar de maneira direta para as casas ou cadastrar-se pelas agregadoras. “A gente tem copa, café, água e banco para sentar”, diz Julio Raw, do Z Deli, que deve estrear um complexo maior em Pinheiros, com mais espaço para os colaboradores. “O delivery é uma tendência que veio para ficar, e em cada local existem adaptações quanto a legislação e norma”, acredita Marco Amatti, da Mapa Assessoria, voltada para negócios em alimentação fora do lar.

Apesar do avanço do delivery — e de novos hábitos, como retirar um cappuccino na portaria do prédio —, o costume de frequentar lugares para comer está longe de desaparecer. “As pessoas vão a bares e restaurantes para se relacionar, para viver, para se realizar humanamente, namorar, paquerar…”, acredita Percival Maricato, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-­SP). Nem tudo pode ser embalado, em especial o calor humano do atendimento. Mas o negócio da entrega ainda tem chão. “É um mercado jovem que está amadurecendo muito rápido”, diz a gerente de inteligência de mercado Vólia Simões. Não estranhe, portanto, se vir drones ou robôs trazendo a sua comida — esse tipo de transporte está em testes em algumas empresas, como Uber Eats e iFood. Vai parecer cena de filme futurista — tipo aqueles que você vê por streaming.

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Tacos além-mar

(Divulgação/Divulgação)

“É um restaurante virtual”, afirma o restaurateur português Olivier da Costa sobre seu Savage. A marca, que atende apenas via delivery, brotou em Lisboa no começo de 2019 e chegou a São Paulo em outubro do mesmo ano. A princípio, a ideia do empresário — responsável por endereços badalados em Portugal e no mundo, entre eles o Seen, na capital paulista — era montar um food truck. Mas, com a tendência das entregas em domicílio, acabou optando por tornar o negócio um restaurante-fantasma, como muita gente apelida as grifes que não têm salão e funcionam com uma dark kitchen — a cozinha paulistana fica no Hotel Tivoli Mofarrej. Burritos, sushis e tacos, como o de creme de Nutella, morango e pipoca (foto), estão entre os itens de sucesso. O Savage operou uma versão física temporária em Lisboa de abril a maio do ano passado. Por aqui, ainda não há previsão de que saia do “virtual”.

Fasano no sofá

Embalagens do Gero Panini: entregas com motoboys próprios (Bruno Geraldi/Divulgação)

A frase acima pode chocar alguns. Mas é verdadeira. O grupo Fasano, dono do tradicional restaurante homônimo de alta gastronomia, se rendeu. Pela primeira vez, entrou no mundo das entregas de comida em casa. No entanto, só com sua casa mais pop, o Gero Panini, sanduicheria aberta em junho passado e vencedora de um prêmio VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER. “A marca já nasceu com essa ideia de delivery”, revela a diretora de operações de alimentos e bebidas da companhia, Mayra Chinellato. “É algo muito, muito novo para o grupo. Tivemos de estudar bastante.” São levados à clientela marmitas de massas como penne alla vodca e sanduíches recheados de porchetta (foto) e outros frios. Por enquanto, os pedidos se dão via aplicativo próprio ou à moda antiga, por telefone. Dois motoboys trabalham exclusivamente fazendo as viagens. “Eles ficaram uma semana no restaurante aprendendo sobre os produtos e como se comunicar com os clientes. Queremos que levem um pouco de nossa experiência”, garante Mayra. Se você pensa em devorar no sofá as refinadas opções dos outros restaurantes da grife, como Fasano e Parigi, os sócios são enfáticos: elas nunca chegarão à sua casa.

Cozinhar “às escuras” também é para chefs

O chef do Mondo Delivery: produtos criados só para entregas (Clayton Vieira/Veja SP)

Dark kitchen: conceito em inglês que define uma cozinha fechada ao público que dispensa salão, mesas, garçons e demais atributos de um restaurante para operar com foco único, o delivery. O modelo, adotado por quem tem vontade de empreender no ramo mas não tem interesse ou não possui capital para abrir um endereço formal e também por donos de restaurantes estabelecidos, reduz significativamente os custos do negócio se comparado a um estabelecimento convencional e tem sido a aposta de empreendedores que querem faturar com as vendas por aplicativo. “A dark kitchen é o novo food truck. Todo mundo quer ter”, acredita Benny Goldenberg, sócio da rede La Guapa Empanadas, que possui oito lojas, sendo a da Alameda Itu quase inteiramente voltada para entregas.

O chef Antonio Mendes, com passagem por restaurantes franceses, além de ter trabalhado no Martín Berasategui, na Espanha, montou o Papila Deli, especializado em poke (prato havaiano de pescados), num imóvel do Itaim Bibi pensando exclusivamente nas entregas. “Quis abrir algo de qualidade para mudar a ideia de que delivery é sempre pior que comer em um restaurante”, diz. Assim como o Papila, o Sush1, que vende a peça de sushi a pouco mais de 1 real, e o Savage, do chef português Olivier da Costa, existem apenas no mundo virtual. Ainda que a opção mais prática disponível atualmente seja o aluguel de espaços em cozinhas compartilhadas, donos de restaurantes mais bacanas preferem construir uma do zero.

É o caso do chef Salvatore Loi, do Mondo Gastronômico. Junto dos sócios, decidiu lançar o Mondo Delivery, marca de massas e itens de padaria que vai funcionar a partir de abril exclusivamente pelo iFood. O espaço de onde sairão os pedidos está em reforma nos Jardins. “Nossa atual cozinha é pequena e não poderíamos tumultuar o serviço de lá”, explica. “Atualmente o delivery é uma fatia interessantíssima do mercado, mas é uma operação diferente, à parte do restaurante”, acredita. Buscando eficiência, o empresário Benny Novak montará uma “três em um” para atender às entregas do francês Ici Bistrô, do italiano Tappo e ainda de uma nova marca, exclusiva para delivery, que terá pratos queridos pelos clientes do cozinheiro-empresário, incluindo opções do extinto 210 Diner.

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Rodrigo Oliveira, do Mocotó, já faz sucesso entregando em média 3 440 pedidos por mês e promete abrir uma cozinha em Guarulhos. “Seremos uma light kitchen, pois temos fachada e o cliente pode chegar, pegar e levar”, defende. Paulo Shin fará a sua estreia no setor com o Komah, coreano que funciona na Barra Funda. Suas ótimas receitas, que estarão disponíveis apenas no iFood, sairão de uma unidade sem salão em Pinheiros. As próprias plataformas têm investido em dark kitchens. A Rappi toca 100 unidades próprias e constrói em parceria com alguns estabelecimentos. Segundo apuração da reportagem, o iFood também tem projetos em andamento. A empresa não confirma a informação.

(VEJA SP/Veja SP)

Oito negócios em um

Rodolfo de Santis: delivery de quase todas as casas (Gladstone Campos/Veja SP)

Foi apenas uma questão de tempo para que Rodolfo De Santis, restaurateur do ano pela mais recente edição de VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER, bolasse uma maneira de levar seus pratos para dentro da residência das pessoas. “Um dos meus sócios já me pedia isso havia anos”, assume o chef, que enfim resolveu entrar no setor. O contrato do espaço onde funcionará a cozinha projetada para a função foi assinado na semana passada. Com investimento de 1,5 milhão de reais, o imóvel de 280 metros quadrados dará vida à Pierino, rotisseria com itens como molhos e massas para ser finalizadas em casa seguindo instruções dadas por De Santis por meio de vídeos que poderão ser acessados pelo público por QR code. Dentro da mesma loja digital serão comercializadas pedidas prontas para comer de cada uma das suas casas: Nino Cucina, Salumeria, Da Marino, Giulietta Fogo & Vino, Peppino Cantina, Forno da Pino e Madame Suzette (em construção). Bodega La Barra e Osteria Nonna Rosa ficam de fora porque têm sociedades distintas. “Essa união só é possível porque somos conhecidos como grupo”, acredita. Assim como todos os restaurantes, a nova empreitada ficará no Itaim Bibi. Diferentemente das dark kitchens, sempre escondidas, a cozinha terá uma fachada caprichada e um espaço para quem quiser passar por lá e pegar tudo para levar. A previsão é que as vendas comecem em julho.

O caso da batata

As fritas afinaram. O palito de mais de 1 centímetro de largura, encontrado no salão do Z Deli, diminui para 4 milímetros na versão delivery. O motivo? Fininho, perde mais umidade na fritura e murcha menos no transporte. Outro segredo é não vedar 100% a embalagem. “Ou o cliente pega as fritas quentes e murchas ou um pouco mais frias e crocantes”, acredita Julio Raw, sócio da rede premiada pelo COMER & BEBER, que faz até 800 entregas por dia. Quando o Holy Burger começou a operar no sistema, em 2016, servia só chips para evitar o problema. Depois de queixas dos fregueses, optou pelas fininhas, também com 4 milímetros. A batatinha à moda delivery marca presença na McCain, que lançou um produto específico. Não é só na guarnição que há truques para vencer percalços da viagem. Vale tirar grelhados do fogo antes do tempo. “Caso contrário, a carne chegará no ponto errado”, diz Diego Iglesias, do Rubaiyat.

A supernanny dos restaurantes

Maroun, Andrade e Grande: sócios da Mimic (Elvis Fernandes/Divulgação)

Manter um olho no restaurante e o outro no delivery nem sempre é tarefa fácil. Quase como uma babá, a Mimic, startup criada há menos de um ano, inaugurou um modelo de negócio em que se encarrega da operação do delivery de uma marca parceira para que o empreendedor consiga continuar dando total atenção ao seu endereço. Lembrando uma franquia, a Mimic paga royalties sobre as vendas e promete reproduzir tim-tim por tim-tim os produtos para manter a qualidade. Sua função vai da construção da dark kitchen ao relacionamento com o cliente.

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The Coffee: o novo cliente da Mimic (Luis fertonani/Divulgação)

O funcionamento terá um plus tecnológico. Com implementação prometida para o fim do mês, o chamado Beeline é um sistema próprio integrado com informações da Rappi que faz com que as comidas sejam preparadas de acordo com a chegada dos motoboys, e não com a ordem do recebimento de cada pedido, como acontece na maioria das operações. “Isso fará com que o cliente espere no máximo trinta minutos para ter sua refeição em mãos”, explica o equatoriano Andres Andrade, fundador da empresa, que também tem como sócios Jean Paul Maroun e David Grandes. Com a conta bancária de quem recebeu um aporte de 9 milhões de dólares, a Mimic tem a capacidade de levar um restaurante para vários cantos da cidade. Há três dark kitchens em construção (Mooca, Barra Funda e Vila Mariana) e duas em funcionamento, nas avenidas Rebouças e dos Bandeirantes, que são ponto de partida dos sanduíches do Patties.

Cheeseburger, do Patties: sucesso no delivery (Luis Fertonani/Divulgação)

A hamburgueria se tornou um case depois de entrar no delivery: entrega 60 000 hambúrgueres por mês só na unidade da Rebouças. “Esse número é um dos mais altos do mundo”, garante Andrade. O sucesso não é por acaso. No catálogo de clientes, a preferência é por marcas com as quais o público já mantém uma relação de afeto e desejo. A rede curitibana The Coffee, que está em oito endereços paulistanos, é a mais nova parceira da empresa. Cafés e bebidas geladas são oferecidos individualmente e em combos com quitutes de dois outros parceiros, a Mundo Pão do Olivier e o Pão de Queijo Haddock Lobo a partir desta sexta (13). As próximas operações devem ser de sushi e de comida saudável.

Dividir para crescer

Combinado do sushi K: marca é do NKK (Ligia Skowranski/Veja SP)

No concorrido mercado da comida por celular, criar uma marca filhote pode se mostrar uma baita estratégia. O novato conquista outro público e a empresa aumenta as chances de faturamento. Um exemplo é a LC Futuro, versão “natureba” da rede Lanchonete da Cidade, com opções mais, digamos, saudáveis que as da marca-mãe, além de produtos exclusivos e que deve inaugurar uma loja física até julho. O japonês Nakka, com unidades no Itaim Bibi e nos Jardins, ganhou, no fim de 2018, o NKK, um rebento dedicado ao delivery. “Os clientes de salão que eventualmente não podiam aparecer pediam”, diz o sócio Roberto Nakamori. “E quem não sabia associou logo o NKK ao Nakka.” O empresário acaba de lançar um novo filho, o sushi K, de opções com preço mais razoável — o combinado de sushi e sashimi (foto) custa 35 reais. “O arroz e o pescado são os mesmos do NKK. Usamos máquinas para produzir mais rápido.” O próximo passo será lançar uma marca de poke em abril. Todos os preparos saem da mesma cozinha central, no Itaim. O restaurateur prevê a abertura de mais três dark kitchens neste ano, com investimento estimado em 3 milhões de reais, parte dele vinda de um aporte da Rappi, com quem mantém exclusividade. “O delivery representa de 10% a 15% de nosso faturamento e queremos alcançar 50%.”

A marmita que salvou o restaurante

Rafael Azrak: assumiu o negócio da família (Alexandre Battibugli/Veja SP)

“Vou ser sincero: o Aguzzo estava praticamente falido”, assume Rafael Azrak sobre o restaurante de Pinheiros. O jovem empresário de 27 anos, que chegou em 2016 para ajudar a recuperar o estabelecimento do pai, Roberto, pouco a pouco viu o faturamento subir. Junto ao investimento em eventos, implantou as entregas, que cresceram de forma inesperada e começaram a levar mais clientes ao salão atrás de receitas como o nhoque de espinafre ao molho de gorgonzola e nozes. “O delivery é uma forma de divulgar a marca”, acredita. Outra estratégia de Azrak para fazer as encomendas bombar foi incluir pratos mais baratos, vindos dos restaurantes que levam a marca Aguzzo Trattoria, em Moema e nos Jardins, e criar promoções agressivas. “Hoje, o sistema de entregas representa 40% de nosso faturamento”, calcula. “O número de pedidos varia de 8 000 a 15 000 por mês, dependendo das promoções dos outros restaurantes e se há feriados.” Para padronizar o negócio, ele montou uma cozinha central em Pinheiros, de onde está saindo parte das receitas para ser finalizadas nas unidades. Até abril, a marca começa a operar na Mooca, em cozinha da Rappi.

Abalando as estruturas

O ponto de partida e o de destino dos entregadores que rodam a cidade sobre motos e bikes e até em patinetes e automóveis nem sempre estão preparados para recebê-los. Em prédios comerciais quem tomou a dianteira da organização do fluxo foi o próprio iFood. Há um ano, a empresa instala, em edifícios onde a concentração de pedidos é grande, armários em que a comida é depositada e o cliente os abre com um QR code. Veja outros exemplos ao lado.

Central delivery: onde ficam as entregas feitas nos pédios da Trisul (Divulgação/Divulgação)

> Das moradias…

Numa pesquisa feita com condôminos de prédios da Trisul, a construtora percebeu que ter espaço para receber compras pela internet, o que inclui comida pronta, era uma demanda. A partir de 2016, os lançamentos passaram a dispor de uma central de delivery, com geladeiras e armários que armazenam os produtos até que eles sejam retirados pelos clientes (à dir., imagem em 3D). Para Alexandre Lafer Frankel, CEO da Vitacon, achar uma solução para esse volume de entregas cada vez maior foi essencial para a segurança e o conforto tanto dos habitantes quanto dos motoboys. “Temos um sistema que avisa os moradores digitalmente de que a encomenda chegou”, conta.

Centrais em shoppings: ajudam a escoar a mercadoria (Divulgação/Divulgação)

…Às compras

Presente em treze shoppings paulistanos, como o Cidade São Paulo e o Mooca Plaza, a Delivery Center cria uma ponte entre os lojistas e as plataformas de entrega. Para melhorar o tráfego nos centros de compras, monta um estande (foto à dir.) onde os motoboys buscam os pedidos feitos aos estabelecimentos. “Ajudamos os shoppings a escoar a mercadoria de forma expressa”, explica um dos diretores, Saulo Brazil. Os funcionários retiram o item no restaurante e combinam com o motorista como será a entrega — o mesmo acontece com outros produtos. Em redes como a do Iguatemi, há o chamado iFood Hub, que organiza as encomendas feitas pelo app.

Não é só questão de aparência

(Alexandre Battibugli/Veja SP)

“Falar de embalagem é parecido com falar de louça. Se investimos para que a comida do Lilu esteja sobre as cerâmicas mais legais possíveis, temos de cuidar das caixinhas”, entende o chef André Mifano. Ele estreia no iFood antes de abril com suas receitas autorais, após seis meses de planejamento — e de fazer 200 pedidos de delivery para testar a concorrência. Entre os itens que vai servir está o steak tartare com flocos de milho, que chegará à casa do cliente com os ingredientes separados em um estojo que custa 9 reais (Mifano promete não repassar o ônus). O pacote é a opção mais cara fornecida por Luiz Antonio Silveira, fundador da Scuadra, empresa de embalagens com travas e desenho patenteados e pensados para a entrega — os demais recipientes custam entre 1 e 3 reais. A fábrica, em Guarulhos, produz um volume suficiente para acomodar comida de 370 marcas, 90% delas paulistanas. “Estamos perto de vender 1 milhão de unidades por mês”, comemora Silveira, que reina entre restaurantes bacanas como Pobre Juan e Le Jazz Brasserie. “A Scuadra faz jus ao que a gente acredita ser ideal”, elogia Rodrigo Oliveira, chef e sócio do Mocotó. Além de evitar que molhos escorram e poder ser aquecida no micro-ondas e no forno até 200 graus, as embalagens têm a vantagem de ser feitas de papel biodegradável. É quase um alívio para o planeta, que sofre as consequências do descarte de materiais, como o plástico, que deve ser banido de estabelecimentos — inclusive dos que entregam — até o início de 2021, segundo nova lei.

Entregas no túnel do tempo

(Por Arnaldo Lorençato)

(VEJA SP/Veja SP)

Embora os pedidos de comida via aplicativos tenham explodido a partir de 2017, entregas em domicílio não chegam a ser novidade na capital. Menos ainda nas páginas de VEJA SÃO PAULO. A revista publicou duas matérias de capa sobre o tema anteriores a esta que o leitor tem nas mãos, a primeira delas em 1993 e a outra quinze anos depois. Em ambas se testava a qualidade do serviço oferecido em momentos diferentes. No primeiro, quando estava engatinhando, treze restaurantes se dispunham a mandar pratos pedidos por telefone aos clientes. Entre os locais avaliados encontravam-se o America, a Pizza Hut, o Lig-Lig e o McDonald’s. A comida chegava de moto, de bicicleta e também a pé, assim como hoje. No segundo momento, com o delivery já consolidado, os pedidos para o teste foram feitos em cinquenta endereços, pinçados de um universo de 2 500 restaurantes, a maior parte deles pizzarias, nos cálculos da Abrasel-SP à época. Era possível fazer pedidos pelo celular, ainda que eles não passassem de aparelhos sem fio para realizar e receber chamadas. Na lista de participantes estavam casas bacanas que continuam em atividade, como as churrascarias Dinho’s e Martín Fierro. O propósito de fisgar o freguês de carteira polpuda é, porém, mais antigo. Francês que foi um dos melhores da cidade em seus tempos de glória, o Freddy criou um sistema de embalagem para transportar clássicos de bistrô de seu menu em junho de 1994 (leia ao lado). Não é surpresa para mim que até a mais notável das grifes de alta gastronomia no Brasil, representada pelo italiano Fasano, tenha agora aderido ao delivery com o Gero Panini. Embora atualmente atendam pelo nome de dark kitchens, as cozinhas voltadas apenas para entregas remontam a décadas. Além de pizzarias com atendimento somente em domicílio, estão entre as pioneiras no setor as redes de culinária chinesa Lig-Lig e China in Box, ambas abertas em 1992. Ainda que o Sassá Sushi esteja longe de ser o precursor no delivery de cozinha japonesa — os extintos Haru e Sea House faziam isso nos longínquos anos 90 —, a marca deu um passo antes dos demais ao construir um dos primeiros espaços só para entrega em 2014 na Chácara Santo Antônio. Era chamada de cozinha central, transformada em fábrica para atender a redes de supermercado. Hoje, há mais duas dark kitchens do restaurante, uma em funcionamento na Vila Leopoldina e a outra a ser inaugurada em abril deste ano na Vila Mariana.

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