Como vitaminar a tranquilidade
Felicidade plena, sem amarras, vem de dentro. É momentânea, mas é tão profunda que fica fazendo bem mesmo depois que passa, escreve Mariana Becker
Moro em um lugar onde, para muita gente, a felicidade é grana.
Obviamente que sem grana nenhuma, passando necessidades, ninguém é feliz.
No entanto, o lugar-comum “dinheiro não traz felicidade” nunca foi tão óbvio para mim. Quando o barco nunca é grande o suficiente, nem o jato particular, nem o número de bolsas, nem o quilate do diamante, nem a exclusividade das exclusividades, o mais caro dos valores para quem quer comprar o que ninguém pode ter.
O problema é que a felicidade plena, sem amarras, vem de dentro. É a mais “incomprável” das exclusividades. Felicidade sem poréns. É momentânea, mas é tão profunda e verdadeira que fica dentro de você, fazendo bem mesmo depois que passa. Como vitamina C. Já aconteceu, mas segue surtindo efeito. É a compensação das tristezas ou raivas, que também podem ter longo efeito como um patch maligno que fica destilando fel durante dias, meses ou anos.
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A coisa boa desses momentos de felicidade plena é que eles podem ser reacendidos. Hoje de manhã olhei para uma janela em um predinho antigo e vi roupas estendidas ao sol. Pensei no cheirinho bom do tecido recém-lavado, do quentinho dos raios de primavera entrando pela sala recém-despertada da noite de sono. Pensei que o dia estava só começando, ainda fresco, com a chance de ser bom e a gente fazer direito. Pensei que a pessoa que lavou aquela muda poderia estar com a sensação de que já estava completando bem uma das tarefas diárias. Sabe aquela sensação de dever cumprido, de organização?! de repente dá até tempo de tomar um cafezinho.
E ter a chance de espalhar o aroma pela casa e usar a xícara pequenininha, que requer calma para segurar e levar à boca. Tomara que esteja bom. E que aquele momento seja dedicado só a você. Um pequeno momento de felicidade que um iate no meio do Mediterrâneo só pode dar se o dono quiser ter tempo de apreciar os reflexos do sol, o cheiro do mar…
Com os anos, aprendi a identificar onde buscar as minhas pastilhas de vitamina C. No mar, é sempre certo. Quando entro, quando nado, mergulho, surfo ou velejo. E quando saio de lá também, para deixar de ser bicho marinho e voltar a ser bípede. De cabelos salgados, me sinto segura, poderosa, sabendo que a metamorfose pode acontecer quando eu quiser.
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Tenho trânsito livre para o Reino das Águas claras e também tenho certeza de encontrar felicidade na prateleira de contato e comunicação com animais. Seja qual for. A troca com outra espécie me faz carinho na alma, amplia os horizontes da vida e ainda sob o divertido manto do “cá entre nós dois”. Aquele papo quando descobrimos os grandes amigos no meio da multidão. Atos generosos meus ou dos outros também agem direto sobre a serotonina. É tiro e queda. Sempre funciona e, como efeito colateral, ainda contamina os outros.
E o sol… O sol da manhã, embora estimule a vitamina D, sempre é aquele golinho de vitamina C efervescente pra começar bem o dia. É a felicidade tranquila que faz a caminha para as outras coisas que vão acontecer na jornada. É só parar um minutinho e sacar o que te faz melhor. Aconselho, em doses homeopáticas, vitamina C e tempo.
Apaixonada por esportes radicais, Mariana Becker vive em Mônaco e já cobriu (e praticou) surfe,Rally dos Sertões e Fórmula 1. É apaixonada por viagens e pautas feministas. Semanalmente, em seu perfil @oficialmarianabecker, no Instagram, exalta mulheres no esporte no quadro Guria Boa, Essa. Após 25 anos de Rede Globo, Mariana seguiu o caminho da cobertura automobilística e fez sua estreia na Band em março de 2021.
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Publicado em VEJA São Paulo de 07 de julho de 2021, edição nº 2745