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É possível desenvolver uma habilidade de bem-estar?

Daniel Cunha fala sobre métodos baseados e inspirados em tradições milenares para lidar com nosso mundo mental e emocional.

Por Daniel Cunha
25 dez 2020, 08h56

“Cada guerra no mundo começou na mente, com um pensamento de ganância ou ódio, que cresceu e cresceu, ampliou-se, e eventualmente inflamou um grupo de pessoas. Mas a raiz de toda violência e sofrimento é um único pensamento em uma mente. Portanto, nós não deveríamos subestimar o poder da mente de conjurar um sofrimento imenso e, ao mesmo tempo, de se libertar desse sofrimento. Nós não deveríamos pensar que, ao nos engajarmos em uma transformação pessoal profunda, não causaremos nenhum impacto.”  Matthieu Ricard. 

Eu o convido a parar por um instante para refletir sobre essa fala extraordinária do biólogo, escritor e monge budista francês Matthieu Ricard. Quão revolucionário seria se nossa cultura compreendesse a mente humana e as emoções destrutivas como a causa profunda dos nossos maiores problemas? Se entendesse que a transformação depende, realmente, de cada um de nós? Foi com a motivação de iniciar uma transformação global justamente pelo caminho da consciência que, desde o início deste século, programas educacionais têm surgido da união da ciência ocidental e das tradições de sabedoria do Oriente.

O neurocientista Richard Davidson, um dos pesquisadores mais reconhecidos no campo da meditação e entusiasta da secularização das práticas contemplativas, é um dos líderes desse movimento. “Nós nos tornamos cientistas ativistas. Defendemos a reivindicação de que o bem-estar é uma habilidade. Eu acho que as evidências para isso são arrebatadoras. Como cultivar essa habilidade e que tipos de pessoas podem se beneficiar de quais tipos de estratégias, essas são questões que ainda estão na mesa”, afirmou ele no podcast Mind & Life.

Um dos aspectos mais fascinantes dessa história é que o Brasil, por uma combinação mágica de causas e condições (talvez entre elas a liderança nos índices de ansiedade, segundo a OMS, e o sincretismo religioso), tem tido um grande destaque na expansão e disseminação desses programas. Vários deles vêm florescendo por aqui, com cada vez mais interesse do público e pessoas se capacitando para multiplicá-los em diferentes contextos.

A importância do autoconhecimento é hoje um consenso. A maioria das pessoas diz, por exemplo, que é fundamental aprender a lidar melhor com a raiva. Mas se alguém nos perguntar diretamente: “Como, exatamente, você está fazendo para lidar melhor com a raiva?”, talvez não saibamos o que responder. É isso que esses programas oferecem. Métodos precisos, baseados e inspirados em tradições milenares, para que lidemos com nosso mundo mental e emocional.

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Sua origem remonta ao ano de 1987. Por entender que a ciência era a estrutura mais bem habilitada para investigar a natureza da realidade e ajudar a melhorar a vida das pessoas no planeta, três seres visionários se reuniram para tentar responder à pergunta: que impacto poderia ser alcançado combinando a investigação científica com o poder transformador da sabedoria dos povos do Oriente? Em uma colaboração inédita, Tenzin Gyatso, o 14º Dalai-lama (o líder espiritual do povo tibetano e um defensor global da compaixão), o cientista e filósofo chileno Francisco Varela e Adam Engle, advogado e empresário, se reuniram para criar o Instituto Mind & Life, entidade que promove diálogos sobre a consciência entre cientistas e contemplativos.

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Oi? Contemplativos? Sim, vale a pena explicar. Enquanto a ciência se apoia na tecnologia, no empirismo, na observação “objetiva” e na análise, o Dalai-lama, Varela e Engle estavam convencidos de que práticas e métodos introspectivos como a meditação, em que a mente é observada de forma direta e sem intermediários, em primeira pessoa, poderiam ser usados como instrumentos equivalentes de investigação. Eles viram o potencial não apenas para tornar a própria ciência mais humana, mas também para garantir que suas conclusões tivessem um alcance maior e mais eficiente. Formaram o Mind & Life para eliminar essa divisão, promover o bem-estar humano e também a felicidade.

Em 2000, a já tradicional conferência promovida pelo instituto, ocorrida em Dharamsala, na Índia, teve como tema central as emoções destrutivas e gerou a publicação de um livro organizado por Daniel Goleman e publicado aqui com o nome Como Lidar com as Emoções Destrutivas, pela editora Campus. Ao final do encontro, o Dalai-lama desafiou os participantes a desenvolver um programa educacional que fosse amplamente acessível e oferecesse ferramentas práticas para uma gestão emocional mais eficaz.

“Quão revolucionário seria compreender as emoções destrutivas como a causa profunda dos problemas?”

O psicólogo Paul Ekman e o ex-monge budista Alan Wallace assumiram esse desafio e, como resposta ao pedido, desenvolveram o primeiro currículo do Cultivating Emotional Balance (CEB), ou Cultivando Equilíbrio Emocional, programa educacional para o cultivo do bem-estar que combina, de forma totalmente secular, práticas contemplativas com pesquisas científicas realizadas na área das emoções.

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O CEB foi a primeira de uma série de metodologias que surgiram da mesma motivação, combinando práticas com conhecimentos teóricos para o cultivo da consciência plena, compaixão e sabedoria. Richard Davidson, que também participou do time que desenvolveu a primeira versão do programa, costuma fazer uma analogia interessante para lembrar que essa abordagem vai muito além do desenvolvimento de mindfulness, prática que se tornou muito popular no Ocidente nas últimas décadas: “Mindfulness isolado de outras práticas é como se estivéssemos indo à academia para melhorar a saúde e exercitássemos apenas os membros superiores, negligenciando o resto. No fim, teremos um desequilíbrio”.

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Sou uma das pessoas que tiveram acesso a esses programas e viram neles a possibilidade de transformação que vai além da mera reconfiguração das condições de vida. Participei pela primeira vez do Cultivando o Equilíbrio Emocional em 2014, com os amigos da comunidade de transformação on-line o lugar, como uma das estratégias adotadas para lidar com as flutuações emocionais percebidas após o diagnóstico de uma doença neurológica. Encontrei ali muito mais do que técnicas para me equilibrar. Encontrei um caminho.

O impacto positivo foi tanto que, alguns anos depois, participei da formação de professores com os criadores do programa em um curso intensivo de cinco semanas na Itália e hoje ofereço esse treinamento a quem se encontra em uma busca semelhante a que eu me encontrava anos atrás. Por muitos anos, a formação de professores foi realizada num formato intensivo pessoalmente por Alan Wallace e Eve Ekman (filha de Paul Ekman). Em 2018, as professoras Elisa Kozasa e Jeanne Pilli foram autorizadas a oferecer a formação aqui, por meio da pós-graduação em Gestão Emocional nas Organizações, no Hospital Israelita Albert Einstein.

“Encontrei muito mais do que técnicas para me equilibrar. Encontrei um caminho”

Se assumirmos como premissa a afirmação de Ricard de que os grandes problemas do mundo estão fundamentalmente associados ao autocentramento, à ganância e a uma ausência de bem-estar, teremos então uma importante missão pela frente.

Como isso poderia acontecer? O cientista Richard Davidson tem um palpite. “Quando os seres humanos iniciaram sua evolução no nosso planeta, nenhum de nós estava escovando os dentes. Esse é um comportamento aprendido que virtualmente todas as pessoas do planeta fazem. E não é parte do nosso genoma. Então nós podemos fazer, é possível. E se passarmos mesmo o pouco tempo que passamos escovando os dentes nutrindo a nossa mente, este mundo vai ser um lugar diferente.”

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Conheça um pouco sobre os programas disponíveis

Há métodos precisos, baseados em tradições milenares, para que lidemos com nosso mundo mental e emocional

CEB (Cultivating Emotional Balance) | Cultivando o Equilíbrio Emocional

Desenvolvido por Paul Ekman, psicólogo que por décadas se dedicou ao estudo das emoções, e Alan Wallace, físico e estudioso das tradições meditativas, tem a intenção de oferecer recursos para que o participante aprenda a cultivar níveis cada vez maiores de bem-estar emocional. cebbrasil.net.br.

CCT (Compassion Cultivating Training) | Treinamento do Cultivo da Compaixão

Programa de oito semanas, desenvolvido na Universidade Stanford, com percepções e técnicas da psicologia, neurociência e prática contemplativa. Inclui técnicas de meditação baseadas em evidências, ferramentas práticas e exercícios projetados para aprimorar a consciência, a compaixão e a resiliência. instagram.com/cctbrasil.

MSC (Mindful SelfCompassion) | Programa de Mindfulness e Autocompaixão

Criado por Christopher Germer e Kristin Neff, combina habilidades com exercícios de mindfulness e autocompaixão para cultivar a bondade e a resiliência no cuidado de si e dos outros. drapaulateixeira.com.br/ mindfulselfcompassion.

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JOL (Joy Of Living) | Alegria de Viver

Criado pelo professor de meditação Mingyur Rinpoche e oferecido pela Comunidade Tergar, traz exercícios para lidar com as funções básicas da mente, como a atenção plena e os movimentos que nos aproximam da felicidade e afastam do sofrimento. portugues.tergar.org/ programs/o-que-e-a-alegriade-viver/.

SEE Learning (Social, Emocional and Ethical Learning | Aprendizado Social, Emocional e Ético

Desenvolvido pela Universidade Emory em parceria com o Dalai-lama, fornece aos educadores as ferramentas de que precisam para promover o desenvolvimento da inteligência emocional, social e ética para os alunos e para si próprios. Já está sendo implementado em algumas escolas do Brasil. seelearning.emory.edu.

Daniel Cunha com um microfone
Daniel Cunha: jornalista (Arquivo Pessoal/Divulgação)

Daniel Cunha é jornalista, um dos apresentadores do podcast Coemergência e professor do Cultivando Equilíbrio Emocional, programa educacional que combina, de forma secular, práticas contemplativas com pesquisas científicas da área das emoções.

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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de dezembro de 2020, edição nº 2719

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