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Por Arnaldo Lorençato
O editor-executivo Arnaldo Lorençato é crítico de restaurantes há mais de 30 anos. De 1992 para cá, fez mais de 16 000 avaliações. Também é autor do Cozinha do Lorençato, um podcast de gastronomia, e do Lorençato em Casa, programa de receitas em vídeo. O jornalista é professor-doutor e leciona na Universidade Presbiteriana Mackenzie
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Reportagem de 2011 que revelou bastidores das cozinhas de SP segue atual

Conheça em detalhes como foi a apuração da grande pesquisa que deu origem à reportagem “Por dentro da cabeça dos chefs”

Por Arnaldo Lorençato Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 20 jan 2022, 14h23 - Publicado em 16 out 2020, 06h00

Depois de quase duas décadas trabalhando como crítico de restaurantes e editor de gastronomia de VEJA SÃO PAULO, além do breve período de 2000 a 2005 na extinta Gazeta Mercantil, sentia falta de escrever uma matéria que fosse uma radiografia do setor. Corria o ano de 2011, os cursos universitários completavam pouco mais de uma década e a carreira de chef nunca havia sido tão valorizada. Mas não queria fazer mais do mesmo, mostrando a profissão, digamos, do momento.

Queria dar voz a personagens que lideravam cozinhas, de uma pizzaria a uma casa de grelhados. A fonte de inspiração para a capa “Por dentro da cabeça dos chefs”, que chegou às bancas em 20 de abril de 2011, foi um artigo semelhante publicado três anos antes pela Time Out Nova-Iorquina, que mais se parecia com papo sobre o que rola nos bastidores com meia dúzia de pessoas. Parti para uma grande pesquisa, coisa inédita naqueles moldes em território nacional.

Bolei perto de cinquenta perguntas, que foram formatadas com o apoio do Departamento de Pesquisa e Inteligência de Mercado da Abril Mídia, responsável por computar e analisar os da dos. Não havia temas tabus. As questões versavam sobre a conduta profissional de cada um deles, o tratamento com a clientela, a maneira de encarar a concorrência, salários, uso de álcool ou drogas, opinião sobre colegas, e os melhores e piores endereços da cidade, entre tantos outros temas.

Como pretendia fazer um levantamento de fôlego, o formulário foi destinado a quase 200 profissionais selecionados entre os mais de 600 restaurantes publicados por VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER na ocasião. O envio dos questionários impressos foi feito pelo correio ou por motoboy — naquela época, as pesquisas digitais ainda engatinhavam. Para garantir total anonimato, na retirada eram depositados lacrados e sem identificação numa urna, num esforço gigantesco de logística. Um detalhe de bastidor: por um erro no processo de retirada feito por motoboys, só um dos envelopes não retornou à redação.

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Capa 2011: Por dentro da cabeça dos chefs (Divulgação/Veja SP)

O chef blogueiro a quem a correspondência foi destinada queixou-se em uma postagem que, sem sua opinião, a pesquisa não teria validade. Era uma resposta não contabilizada entre 170 outras computadas. Compiladas as respostas, os resultados ainda se mostram muito reveladores. A maioria absoluta dos entrevistados estava satisfeita com a carreira, num total de 90%. Eles enxergavam três pontos como os melhores da profissão: servir boa comida aos clientes, preparar pratos inovadores e dedicar-se à elaboração de clássicos.

Havia um atrativo extra nesse nicho de líderes: os salários. Na época, 53% dos participantes se concentravam em duas faixas, com contracheques que iam de 3 001 a 5 000 reais e de 5 001 a 10 000 reais. Em valores atualizados pelo IGP-M (FGV) em setembro deste ano corresponderiam a de 5 652 a 9 417 reais e de 9 419 a 18 834 reais. Do total, 21 deles declaravam que faziam retiradas mensais de mais de 20 000 reais, o que hoje equivaleria a 37 669 reais, salário de um alto executivo.

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Ao mesmo tempo, eram apontados os piores problemas de exercer o ofício: excesso de horas trabalhadas (55%), controlar a brigada nos momentos de pico (15%), ou seja, quando havia uma alta concentração de pedidos, e tolerar o ego de outros cozinheiros (14%), uma situação muito comum na fogueira de vaidades que passou a arder nos bastidores dos restaurantes. Os chefs indicaram suas preferências etílicas — poucos se declararam abstêmios. A maioria garantiu que a bebida favorita era o vinho, seguida pela cerveja. Tomavam de duas taças por semana a doses diá- rias da bebida diretamente associada a harmonizações gastronômicas. Também responderam que o consumo de álcool em excesso se refletia nas tarefas cotidianas, já que mais de 70% deles tinham presenciado colegas se alcoolizando para enfrentar as estafantes jornadas diárias.

Mais do que isso, 46% contaram já ter visto companheiros da equipe ou de outros endereços no batente sob o efeito de drogas. Apontaram quais eram os colegas mais admirados. O campeão de preferências com 25% dos votos foi Alex Atala, até hoje o mais prestigiado cozinheiro do país no exterior e dono do primeiro restaurante brasileiro, o D.O.M., a figurar no ranking 50 Best, da revista inglesa Restaurant, uma referência internacional. Se a pesquisa fosse hoje, talvez Atala dividisse essa primazia com concorrentes como Jefferson Rueda, titular de A Casa do Porco Bar e promotor dos encontros internacionais de chefs Porco Mundi, além de celebridades televisivas como Paola Carosella, Erick Jacquin e Henrique Fogaça, jurados do MasterChef Brasil, reality em cartaz há seis anos e fundamental para a divulgação da profissão.

Helena Rizzo: chef do restaurante Maní (Fernando Moraes/Veja SP)

A reportagem de 2011 também lançava luz numa incoerência. A presença constante de Atala sob os holofotes teve efeitos colaterais em seus pares. O chef era o segundo mais criticado pela inconsistência de sua cozinha. Frases pinçadas nos questionários o apontavam como um marqueteiro interessado apenas em ganhar dinheiro. Só perdeu esse título para Sergio Arno, do extinto La Vecchia Cucina, hoje longe dos fogões e dedicado à administração da rede de franquias La Pasta Gialla, com mais de uma dezena de endereços no país, sete deles em São Paulo.

Também ficava claro que a cozinha de restaurantes era um território masculino. Tanto que apenas 25% dos contratados eram do sexo feminino. Pôde-se destacar uma melhora nesse panorama quando mulheres passaram a ser eleitas chefs do ano por VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER, guia anual do qual sou editor. A primeira foi Helena Rizzo, do Maní, em Pinheiros, em 2009. Depois, receberam essa faixa representantes com garra para empreender, caso de Paola Carosella, do Arturito, em Pinheiros, em 2010, e Viviane Gonçalves, do ChefVivi, na Vila Madalena, em 2019.

Igualmente, chamou a atenção a renovação das brigadas. Na época, 44% tinham até 35 anos. Aquela nova safra era encabeçada por Rodolfo De Santis, de 24 anos e mais jovem participante da pesquisa, titular do extinto Biondi, no Itaim Bibi. Depois de bater cabeça, o cozinheiro ergueu, com o sócio Marcelo Guimarães, o pequeno império Famiglia Nino, que tem dez casas. Não por acaso, o então garoto prodígio italiano faturou do COMER & BEBER os títulos de chef do ano em 2016 e restaurateur do ano em 2019. Passados os efeitos deletérios da pandemia, preciso tocar uma nova pesquisa para fazer um raio X atualizado das cozinhas profissionais paulistanas.

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