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Vandalismo contra semáforos aumenta, assim como risco para motoristas

Segundo especialistas, as falhas colocam os condutores em perigo; secretário afirma que reparos são como enxugar gelo

Por Clayton Freitas
4 mar 2022, 06h00

Ao rodar diariamente pela cidade de São Paulo, sobretudo na Zona Leste, sede da empresa onde trabalha, o caminhoneiro Gabriel Pereira, de 27 anos, depara cotidianamente com algum semáforo em pane em seu caminho.

“Raro é o dia em que eu não vejo nenhum com problema. E tem de tudo, inclusive locais onde os aparelhos foram simplesmente levados. Parece que tem aumentado bastante”, afirma.

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Essa percepção é confirmada pelos dados da própria Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que apontam um crescimento de 63% na quantidade de semáforos vandalizados no início deste ano no comparativo com igual período de 2021.

De 1º de janeiro até o dia 24 de fevereiro, 1 009 semáforos (dos 6 659 existentes) foram danificados por alguma ação criminosa — o número não inclui problemas provocados por questões climáticas —, numa média de dezoito por dia. Em igual período de 2021, foram 625 ocorrências do tipo, média de onze por dia.

“Eu nunca acreditei que ia chegar a esse patamar, é uma coisa de maluco. A cidade não tem dinheiro para manter os equipamentos e cuidar do vandalismo”, afirma Ricardo Teixeira, secretário municipal de Mobilidade e Trânsito.

Imagem mostra equipamento em poste danificado.
Equipamentos danificados: prejuízo para a cidade. (Companhia de Engenharia de Tráfego/Divulgação)

A maior parte desses casos de vandalismo está relacionada a furtos da fiação elétrica usada nos equipamentos, além de dispositivos chamados controladores, que têm a função de comandar as cores de um conjunto de semáforos. Só neste ano foram levados 72 quilômetros de fiação. Se colocados em linha reta, cobririam desde a Praça da Sé até a entrada de Santos, no litoral.

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No caso dos cabos elétricos, o intuito dos criminosos é vender o cobre dos fios no comércio ilegal de compra e venda de sucata. Com os controladores, o objetivo é destrinchar os equipamentos para tirar os dispositivos eletrônicos — tais como placas — para serem comercializados separadamente.

A maior parte desses crimes ocorre no período da noite e madrugada, segundo os registros da CET. Os dados dos primeiros dois meses de 2022 já correspondem a 19,3% de todos os 5 213 semáforos vandalizados em 2021, que, até então, foi o período com mais casos. Só no ano passado, foram gastos 12 milhões de reais apenas com os consertos.

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“Já tivemos casos de técnico colocar o fio de um lado e perceber que estava entrando muito rápido (no conduíte). Foi ver e percebeu que estava sendo puxado por um bandido do outro lado. É desesperador. Eu me sinto o verdadeiro cachorro correndo atrás do rabo. É como enxugar gelo”, afirma Teixeira.

Um relatório interno obtido pela reportagem indica que a maior parte desses casos ocorre na Zona Leste. O cruzamento da Avenida São Miguel com a Rua Taiuvinha, em São Miguel Paulista, é o campeão no ranking, com mais de quarenta casos só no decorrer de 2021.

Outro ponto é no número 1 796 da Avenida dos Metalúrgicos, em Cidade Tiradentes, com 33 casos. Para tentar contornar o problema, o secretário conta que estão sendo feitas várias alterações, tais como colocar as caixas dos controladores semafóricos em posições mais elevadas, concretagem e solda nas tampas das caixas de passagem de fiação e fechamento das janelas de inspeção das colunas semafóricas.

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Especialistas afirmam que essas soluções são paliativas. “Não é colocando uma pedra em cima de uma caixa que essa questão será resolvida. E altear um controlador é uma boa ideia, mas traz um problema para a manutenção”, afirma o consultor em transporte e mobilidade Sergio Ejzenberg.

“É um problema de segurança pública, trata-se de um mercado milionário. É preciso acabar com receptadores, já que essa cadeia está altamente estruturada e não é só em São Paulo, mas no Brasil todo”, complementa Ejzenberg.

Outra frente para tentar solucionar o problema é a modernização dos equipamentos. Emperrada desde 2019, a licitação de cerca de 900 milhões de reais foi liberada no fim de fevereiro pelo Tribunal de Contas do Município (TCM). O edital prevê melhorias em cerca de 2 600 semáforos da cidade e a manutenção de 5 800, num prazo de sessenta meses.

Imagem mostra mapa de São Paulo ao lado de tabela e gráfico sobre o vandalimso em semáforos na cidade.
Vandalismo em semáforos. (Companhia de Engenharia de Tráfego (CET)/Veja SP)

Teixeira explica que outra opção é que a manutenção semafórica seja incluída por meio de um aditivo na parceira público-privada (PPP) da iluminação pública. A ideia é que a mesma equipe que cuida do parque de luz trate dos semáforos, medida que pode gerar uma economia de 300 milhões de reais aos cofres públicos.

Sendo um ou outro, a esperança de Teixeira — que se diz bem religioso — é lançar a licitação neste ano e concluir o trabalho no centro expandido até o fim do mandato. “Realmente é preciso ter fé para conseguir tudo isso num prazo tão curto”, diz Ejzenberg.

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Para Silvio Médici, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Engenharia de Trânsito (Abeetrans), nem as mais novas tecnologias são capazes de frear a sanha dos bandidos. “Sempre os marginais se reinventam e acabam dando esse prejuízo para a cidade. É questão de segurança pública sim.”

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública afirmou em nota que tem atuado fortemente para combater esse tipo de crime. “Inclusive em parceria com órgãos municipais e concessionárias de serviços públicos. Para coibir o roubo, o furto e a receptação de fios e cabos elétricos, além das ações regulares de patrulhamento, as polícias reforçaram a fiscalização em estabelecimentos que comercializam esse tipo de material.”

Segundo a pasta, nos últimos três anos, apenas a 3ª Delegacia de Polícia de Investigações sobre Crimes Patrimoniais contra Órgãos e Serviços Públicos apreendeu mais de 52 toneladas de fios de cobre e prendeu 67 criminosos durante ações de combate a crimes dessa natureza.

“Também foram recuperados 1 tonelada de alumínio, comumente utilizados em redes de energia, oito carretéis de fibra óptica, 134 modems de internet, tampas de metal usadas em galerias subterrâneas, placas de trânsito, entre outros materiais.” Para o advogado especializado em direito de trânsito Ademir Rafael dos Santos, semáforos apagados podemgerar infrações ao motorista (multas), já que os radares podem estar funcionando.

“Isso sem falar que públicos mais vulneráveis, como idosos e crianças, simplesmente podem ser alvo (ao atravessar a rua) de motoristas mais afoitos”, diz o também presidente da Comissão de Trânsito da OAB-SP. A recomendação quanto aos problemas em semáforos é que os motoristas reduzam a velocidade e “negociem” a passagem com os outros condutores, segundo Luís Pompeo, mestre em urbanismo e professor da Universidade São Judas.

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“Sempre que houver falha, o risco de sinistro aumenta, à medida que o condutor tem menos orientação sobre o trajeto”, afirma o médico do tráfego Antonio Meira Júnior, da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego. “Quando estão piscando, quebrados ou mesmo desligados, os semáforos deixam de cumprir essa tarefa (de orientar). Em situações assim, é importante que o condutor redobre a atenção na via, e não apenas em relação ao tráfego de outros veículos, como também de pedestres e animais, assumindo a responsabilidade de organizar a passagem com segurança.”

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Publicado em VEJA São Paulo de 9 de março de 2022, edição nº 2779

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