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Revitalização da Avenida Santo Amaro atrai investimentos imobiliários

Via da Zona Sul terá calçadas mais largas, plantio de árvores e corredores e pontos de ônibus reformados, com previsão de entrega para 2024

Por Guilherme Queiroz
6 out 2023, 06h00

No futuro, comparada à Faria Lima e à nova Rebouças, mas, enquanto a terra ainda é revirada, chamada até mesmo de decadente. A Avenida Santo Amaro — caminho que existe na cidade desde tempos pré-coloniais — liga bairros da Zona Sul ao centro expandido da capital paulista e assiste a parte de sua paisagem se transformar radicalmente nos últimos meses. Em 2022, a prefeitura iniciou uma obra de requalificação que promete mudar para melhor a cara da avenida. A primeira parte da mudança, ao custo de 77,5 milhões de reais, deve ser entregue em abril de 2024 (o restante, no segundo semestre). O projeto visa 2,7 dos quase 8 quilômetros da via, entre as avenidas Juscelino Kubitschek e Bandeirantes, passando por alguns dos metros quadrados mais caros da cidade, como Moema e Itaim Bibi. “Esse pedaço estava superdecadente. A Santo Amaro está em uma transição para ser mais nobre”, opina o arquiteto Greg Bousquet, 50, sócio-fundador do Architects Office.

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Mas o que vai mudar, na prática? “A avenida é antiga, com calçadas apertadas e muitos postes no caminho. Teremos mais acessibilidade”, diz Marco Alessio Antunes, 47, diretor de obras da SP Obras, braço da prefeitura responsável pelo projeto. O plantio de 980 árvores deve contribuir para o embelezamento do pedaço, praticamente sem verde. As calçadas, que hoje variam de 1,6 a 2 metros de largura — ou menos ainda na prática, considerando que é preciso desviar dos postes —, passarão a ter de 3 a até 5 metros de largura. A quebradeira necessária para o enterramento do emaranhado de fios é a primeira etapa da obra: 10,8 quilômetros de cabos de energia, telefone e internet serão levados para baixo da terra, com 240 postes sumindo do caminho. Também no subterrâneo, tubulações de 1,8 metro de diâmetro vão modernizar o escoamento de água do pedaço, que é uma área de passagem de córregos que saem do Parque Ibirapuera e deságuam no Rio Pinheiros. E 486 novos postes vão iluminar a via com lâmpadas de LED.

Imagem mostra avenida sem árvores e com fiação aparente. Duas faixas estão em foco e pessoas passam em calçada apertada
Avenida Santo Amaro como é atualmente (SP Obras/Divulgação)

A expectativa de mudança motiva investimentos no pedaço. “O projeto requalifica o espaço urbano como um todo e um dos efeitos é reforçar os fluxos comerciais da região”, analisa o arquiteto e professor da Faap Sergio Sandler, 66. “Uma transformação como essa valoriza os terrenos, o que faz com que as incorporadoras corram atrás da área”, diz o arquiteto Bousquet, do escritório que elaborou dois projetos residenciais de luxo em quadras vizinhas à reforma: um retrofit na Avenida Hélio Pellegrino e um novo em folha na Rua Tenente Negrão, a serem entregues até 2026.

Imagem mostra croqui com trecho da Avenida Santo Amaro com mais árvores, calçada mais larga, sem fios aparentes e com ponto de ônibus central renovado
Depois da reforma: enterramento de fios e 980 mudas de árvores serão plantadas no endereço (SP Obras/Divulgação)

“Não enxergávamos sentido em fazer um projeto do tipo triple A em uma avenida que tinha ficado para trás”, diz Andrea Coelho, 49, diretora-executiva de incorporações do Grupo Marquise, que vai entregar na Santo Amaro em 2025 um edifício corporativo com cerca de 3 000 metros quadrados de área locável e comércios no térreo, a chamada fachada ativa. “O prédio será inaugurado depois da reforma. O projeto da prefeitura foi um fator decisivo para o investimento. Perdemos uma área do nosso terreno para o alargamento da calçada, mas vimos com bons olhos as mudanças, no estilo Faria Lima”, explica Andrea.

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Imagem mostra croqui de prédio corporativo de três andares, com fachada envidraçada e carros passando em rua
O prédio comercial do Grupo Marquise: investimento após anúncio da reforma (Grupo Marquise/Divulgação)

Na esquina da Santo Amaro com a Juscelino Kubitschek, outra aposta. É um misto de hotel, com 187 quartos, residencial, reunindo 51 apartamentos, corporativo, com oferta de vinte escritórios e mais doze lojas no térreo. Serão duas torres, sendo a mais alta com 24 andares e a mais baixa, 22 pavimentos, que ocupam um terreno de 6 500 metros quadrados, a serem inauguradas em 2024. “A mudança na Santo Amaro é como o caso da Rebouças, que antes era uma área perdida”, diz Dario Abreu Pereira, 57, sócio diretor da SDI Desenvolvimento Imobiliário, uma das responsáveis pelo negócio.

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No entorno, o mercado segue a todo vapor. Desde 2018, os distritos de Itaim Bibi e Moema receberam, juntos, 23 735 novas unidades de apartamentos, versus 18 110 de Campo Belo e Santo Amaro, que ficam na ponta da avenida que não foi contemplada pela obra: 31% mais empreendimentos na parte renovada, segundo dados do Secovi-SP. No âmbito dos aluguéis, os bairros dali contabilizam valorização do metro quadrado de até 15%, caso do Itaim Bibi, pouco acima da média da cidade nos últimos doze meses, de 10,6%. “É uma região sempre muito demandada e com alguns dos tíquetes mais elevados da cidade. Mas o que a gente observa não é muito distante do que acontece no restante da cidade, por enquanto”, diz o economista do QuintoAndar Vinicius Oike, 30. “Quando as obras da Santo Amaro forem entregues, podemos começar a ver uma mudança no preço do aluguel”, afirma Oike.

Imagem mostra senhora de óculos em relojoaria, com vários relógios ao fundo. Ela apoia a mão direita em cima de uma bancada que mostra várias pulseiras de relógios
Mary Watanabe: dona de um comércio na área em que 112 imóveis serão parcial ou totalmente desapropriados para as obras (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Os antigos comércios, a maioria em sobrados, ainda têm forte presença na avenida. “Para o nosso empreendimento, compramos cerca de nove terrenos. Ali tinha lava-jato, restaurante, casas, escritório, estacionamento e uma loja de estofados bem acabada, caindo aos pedaços”, diz Andrea Coelho, do Grupo Marquise. A mudança na rua também entra para o lado de dentro dos imóveis. A prefeitura realiza 112 desapropriações na avenida para as ampliações previstas, sendo 97 parciais e quinze totais, ao custo de 151 milhões de reais. A comerciante Mary Watanabe, 64, é uma das afetadas. A família dela é dona de uma relojoaria que está há cerca de 65 anos na Santo Amaro. O negócio mudou de ponto há dois anos, quando a antiga sede foi demolida para a construção de um novo empreendimento na região. No novo espaço, Mary conta que os primeiros 3 metros da entrada da loja serão para a nova calçada. “Tem vários clientes que não vêm para cá porque não conseguem atravessar a avenida.” A prefeitura divulgou que são disponibilizadas passagens provisórias para viabilizar a entrada e a saída aos estabelecimentos.

Mapa mostra antes e depois da avenida em um croqui que mostra mais espaço nas calçadas e pontos de ônibus centralizados. Ao fundo, mapa da região da Avenida.
Avenida Santo Amaro (Prefeitura de São Paulo/ Reprodução/Veja SP)

Entre julho de 2022, quando começou a empreitada, e setembro deste ano, apenas duas das seis faixas da avenida estavam interditadas. Reportagem da Vejinha publicada em agosto revelou que a SP Obras pedia ao menos quatro faixas impedidas para avançar com o projeto. “No início de setembro, começamos a trabalhar com três faixas para a obra e três para o tráfego”, diz Marco Alessio Antunes, da SP Obras. Durante a interdição, a pista no sentido Centro-Bairro fica aberta, com a da esquerda liberada para todos os veículos no sentido centro, a faixa central exclusiva para o transporte coletivo e a da direita, encostada à calçada, liberada para todos os veículos no sentido bairro. A faixa exclusiva para ônibus é reversível, operando no sentido bairro das 9h às 22h e no oposto no restante do tempo. Atualmente, 22% do trabalho está completo. “Decidimos dividir a obra em dois trechos. O primeiro é da Rua Afonso Braz até a Juscelino Kubitschek (de 1 quilômetro). Depois, vamos da Rua Afonso Braz até a Avenida dos Bandeirantes (de 1,7 quilômetro). O cronograma está em dia e estamos com a meta de entregar até abril o primeiro pedaço”, diz Antunes. A segunda parte ainda tem o cronograma “em planejamento”. No contrato, a conclusão está prevista para 30 de setembro de 2024.

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Quem mora e frequenta a região, claro, sente os efeitos desse período das obras. “Moro em Interlagos e percorro a Santo Amaro de ônibus quase inteira para chegar aqui. Tem vezes que demoro trinta minutos só para percorrer os últimos dois quarteirões antes de chegar na faculdade”, diz Leonardo Nascimento, 22, estudante de psicologia da FMU Santo Amaro, que fica no pedaço que é reformado. Atualmente, passam por ali pouco mais de 2 000 ônibus por dia em cada sentido e cerca de 2 100 carros por hora no horário de pico. “A rua onde eu moro está agora sempre com congestionamento, das 8h até as 14h”, relata o empresário Carlos Baktejian, 74, que vive na Rua Baltazar da Veiga, na Vila Nova Conceição. Moradores contam que o trânsito migrou para os miolos dos bairros do entorno. “Essa reforma é muito bem-vista, estamos felizes de sermos contemplados. Mas enfrentamos congestionamentos que estão travando o interior do nosso bairro. A Santo Amaro, em termos de capacidade de trânsito, não terá nenhuma novidade”, diz Marcus Abrantes, 36, presidente da Associação de Moradores da Vila Nova Conceição, citando a possibilidade do prolongamento da Avenida Faria Lima até a Praça Roger Patti para melhorar a situação.

Imagem mostra jovem em ponto de ônibus olhando para a frente. Dois ônibus passam atrás do rapaz. Ele segura uma mochila
Leonardo Nascimento, estudante que cita o tempo longo para percorrer a avenida de ônibus (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Antes do início da obra, em 2019, a velocidade média de um carro na Santo Amaro no horário de pico da tarde era de 15 quilômetros por hora no sentido centro e 7 quilômetros por hora no sentido bairro, segundo a CET. “O tempo de circulação com automóveis nos bairros dessa região é muito difícil. Você cresce a ocupação, mas a infraestrutura viária permanece a mesma. Também tem outra questão: quanto mais espaço se abre para os automóveis, mais automóveis vão estar naquele lugar. Esse setor da cidade, o da Santo Amaro, deveria receber novos modais além do ônibus e alternativas mais eficientes do que o automóvel”, opina Sergio Sandler, da Faap. “É positivo fazerem a reforma? Sim. Mas poderiam colocar ali instrumentos como a cota de solidariedade (em que empreendimentos destinam parte do terreno à habitação de interesse social)”, pontua Valter Caldana, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie.

“É um sacrifício (o período das obras), mas acho que vai ficar bem legal. A Santo Amaro era muito feia”, diz Annelies Beicht, 62, corretora de imóveis e moradora de Moema. “Os que reclamam terão os seus patrimônios valorizados. É uma dor do parto”, finaliza o professor Caldana.

Publicado em VEJA São Paulo de 6 de outubro de 2023, edição nº 2862

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