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Incêndio na 25 de Março expõe vulnerabilidade de prédios do Centro

Instalações antigas que não seguem os padrões atuais de segurança e falta de fiscalização adequada deixam região suscetível a novos incêndios

Por Hyndara Freitas
Atualizado em 22 jul 2022, 12h56 - Publicado em 22 jul 2022, 06h00

O fogo que afetou prédios da Rua 25 de Março e adjacências no último dia 10 custou aos bombeiros mais de setenta horas de trabalho para ser apagado (e dois deles internados com queimaduras) e evidencia um problema recorrente: os incêndios em imóveis na região central. A não adoção de técnicas de prevenção de incêndio, instalações antigas que não seguem os padrões atuais de segurança e a falta de documentação e fiscalização adequadas deixam as edificações vulneráveis — o que potencialmente vai acabar em novos incêndios na área.

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Não é a primeira vez que um incêndio de grandes proporções atinge a mais importante rua de comércio popular do país. Em 2018, as chamas destruíram um edifício que abrigava uma loja de tecidos. Naquele mesmo ano, o Edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, desabou após pegar fogo, uma tragédia que terminou com sete mortos e dois desaparecidos.

Ocorrências menores em prédios e galpões do Brás e do Bom Retiro, por exemplo, também foram vistas nos últimos anos. Antonio Fernando Berto, pesquisador do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e especialista em segurança contra incêndio, destaca que bombeiros têm por obrigação vistoriar os imóveis, mas “há um passivo muito grande para o Corpo de Bombeiros vistoriar, e a corporação é muito desfalcada no estado”. Em sua visão, “as fiscalizações não são rigorosas como deveriam” e há “falta de temor dos proprietários em algo que deveria ser obrigatório”.

A legislação sobre o tema em São Paulo é recente. Em 2015, foi criado o Código Estadual de Proteção contra Incêndios e Emergências, que deu poder de polícia aos bombeiros, autorizando os agentes a entrar nos imóveis para fiscalizar sua segurança e notificar e multar os locais em situação irregular. Mas foi apenas em 2018 que a lei foi regulamentada, especificando as regras para as vistorias e para os proprietários.

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Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, foram 2 473 incêndios no estado em edificações sujeitas à regulamentação dos Bombeiros em 2021, uma média de mais de seis incêndios por dia. De janeiro a maio de 2022, foram 852 casos nesse tipo de imóvel. A lei prevê que qualquer edificação com mais de 750 metros quadrados de área construída ou mais de 12 metros de altura ou mais que três andares precisa ter o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB).

No incêndio ocorrido na região da 25 de Março no último dia 10, nenhum dos prédios atingidos tinha a documentação. Foram nove edifícios interditados, e um deles está em processo de demolição. “Ao construir um edifício, eu preciso do AVCB para poder ocupar a edificação. É necessário apresentar uma documentação aos bombeiros, que fazem a vistoria, e, se for aprovado o projeto de segurança, é emitido o auto. O AVCB tem validade e quando ele vence, para manter a edificação regularizada, tem de ser renovado, algo que deve ser solicitado pelo proprietário do imóvel. Mas nem sempre isso acontece”, explica o especialista.

No caso de prédios antigos, é comum que os responsáveis não busquem a regularização — algo que em muitos casos exige gastos com reformas nas saídas de incêndio ou na ventilação. Outro problema comum na área central é que imóveis oficialmente destinados a escritórios, por exemplo, passam a servir de depósito de produtos vendidos no comércio, guardando materiais altamente inflamáveis. Os bombeiros fazem fiscalizações frequentes nos imóveis, mas o capitão André Elias, porta-voz da corporação, admite que seria “utópico” conseguir vistoriar todas as construções. “Por isso, existe um plano de fiscalização que prioriza determinadas edificações. Só neste ano, foram 9 387 fiscalizações (no estado), uma a cada trinta minutos”, diz.

A recorrência do problema é tanta que ensejou a abertura de um inquérito civil pelo Ministério Público de São Paulo para apurar as políticas públicas adotadas na prevenção de incêndios na capital. O promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo Roberto Pimentel explica que a cada novo caso são abertas investigações específicas, mas foi necessário um procedimento mais amplo e contínuo por causa da dificuldade de acompanhar individualmente cada prédio da cidade.

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“Os casos pontuais, evidentemente, não deixaram de ser acompanhados, mas passaram a ser incorporados, sempre que se tem conhecimento deles, aos inquéritos civis estruturais, o que facilita e enriquece, por meio, inclusive, do planilhamento de dados, essa visão mais ampla da conjuntura em questão”, afirma o promotor. No âmbito desse inquérito, o Ministério Público questionou o Corpo de Bombeiros sobre fiscalizações feitas nos prédios da 25 de Março, o que ainda está em andamento — o que causou o fogo também continua em investigação.

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Publicado em VEJA São Paulo de 27 de julho de 2022, edição nº 2799

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