Financiamento é coisa de gente rica!
Como as emoções atrapalham na hora de comprar Pouco mais da metade das famílias brasileiras possui algum tipo de dívida financeira. Nesse grupo são levadas em conta dívidas de financiamento e dívidas por falta de pagamento de algum compromisso assumido. Tanto em um caso quanto no outro a consequência financeira imediata é a cobrança de […]
Como as emoções atrapalham na hora de comprar
Pouco mais da metade das famílias brasileiras possui algum tipo de dívida financeira. Nesse grupo são levadas em conta dívidas de financiamento e dívidas por falta de pagamento de algum compromisso assumido. Tanto em um caso quanto no outro a consequência financeira imediata é a cobrança de juros. Os juros representam uma indenização paga pelo devedor ao fornecedor do crédito. Um carro popular de R$ 25.000,00 pode sair por mais de R$ 40.000,00 se for financiado em alguns anos. É melhor comprar à vista ou a prazo? A resposta a essa primeira questão é óbvia. É sempre melhor comprar à vista. Se esse é o caso, por que tanta gente compra a prazo? A resposta a essa segunda questão não é tão simples e há fatores emocionais que participam desse processo.
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Primeiro um pouco de conta. Quando alguém decide comprar um carro a prazo como no exemplo acima, significa que essa pessoa não possui os R$ 25.000,00 para pagar à vista. Pouca gente se dá conta mas, na verdade, não é o carro que custará R$ 40.000,00 no fim do financiamento. Acredite… o carro custou apenas R$ 25.000,00. Então de onde vem e para onde vai a diferença de R$ 15.000,00? Na verdade, quem decide adquirir um bem financiado com juros está comprando duas coisas diferentes: o bem a ser adquirido (ele será pago à vista!) e o dinheiro necessário para pagar esse bem (que, repito, será pago à vista). Então veja que interessante. A pessoa não tem carro e tampouco o dinheiro para comprá-lo. Então o que acontece durante uma venda financiada é que, antes de comprar o carro, a pessoa compra o dinheiro necessário para a aquisição do carro. Isso é feito de forma tão integrada que pouca gente percebe que está comprando dinheiro também. Vejamos.
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Seguindo com o exemplo do carro popular, alguém que tenha aderido àquele financiamento comprou 40 mil para pagar um carro de 25 mil, ou seja, a pessoa pagou R$ 1,60 para cada R$ 1,00 usado no pagamento do carro. Dito de outra forma… imagine que você vá sem dinheiro à concessionária e o vendedor lhe mostre o carro de R$ 25.000,00. Você gosta e quer levar mas não tem o dinheiro necessário. É como se ali mesmo na concessionária tivesse uma barraquinha com uma plaquinha em cima: “Vende-se dinheiro”. Você pergunta para o moço da barraquinha: “Quanto custa essa moeda de um real?” Ele responde: “Hoje está na promoção: custa só R$ 1,60. Você pode me pagar em 60 vezes.” E você fecha o pedido: “Veja pra mim 25 mil dessas!” (25.000 X 1,60 = 40.000). Depois de pegar suas vinte e cinco mil moedas de um real você as repassa ao vendedor do carro e volta pra casa motorizado. Só que agora você tem 60 parcelas R$ 666,66 para liquidar ao longo dos próximos 5 anos. Essa regra é a mesma para qualquer tipo de crédito ou financiamento. Se houver juros, significa que você está comprando dinheiro. Simples assim.
Mas por que alguém compraria uma moeda de um real por um real e sessenta centavos? Aí é que entram os aspectos emocionais. Nosso sistema nervoso evoluiu para aprender com a experiência. Uma das características desse processo de aprendizagem é que nosso cérebro é mais sensível às consequências imediatas do nosso comportamento do que àquelas de longo prazo. Quando entramos em contato com algo que nos seja bom, há imediata liberação de dopamina (e outras moléculas mediadoras da comunicação entre os neurônios) em centros cerebrais que processam o prazer. Quanto mais imediata a consequência prazerosa de um comportamento, maior a motivação para emitir tal comportamento. Da mesma forma, quanto mais demorada for a consequência prazerosa, menos motivação teremos para emitir esse comportamento. Quando compramos algo a prazo, entramos em contato imediatamente com a parte prazerosa da história, que é o bem adquirido. A parte aversiva, que é o pagamento, fica diluída no longo prazo. Isso significa que nossa motivação tende a aumentar diante de contextos assim. As empresas se aproveitam desse conhecimento para nos motivar a comprar. No exemplo do carro, a comparação que nosso cérebro acaba fazendo não é R$ 25.000,00 versus R$ 40.000,00. Essa seria fácil de resolver de modo satisfatório. Na verdade, a comparação que nosso cérebro faz é “carro novinho em folha” X R$ 666,66. É como se estivéssemos pagando pouco mais de seiscentos reais pelo carro… porque essas são as consequências de curto prazo de nossa escolha.
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Há pessoas que passam a vida comprando bens financiados. Eu costumo brincar que financiamento é coisa pra gente rica. Sim… porque só faz sentido comprar dinheiro por uma quantia maior do mesmo dinheiro quem tem ele sobrando. De fato, o que sucessivos financiamentos fazem e pouca gente se dá conta é esmagar o poder de consumo das famílias com o constante pagamento de juros: juros do financiamento, juros do empréstimo consignado, juros do cheque especial, juros do cartão de crédito, juros do carnê varejista e assim por diante. Para evitar cair nesse tipo de cilada para onde nosso cérebro tende a nos empurrar é preciso ter coragem de quebrar o ciclo em algum momento. Isso significa passar algum tempo em contato com a parte aversiva da história (menor consumo combinado com poupança regular de parte da renda) para, depois de um tempo acumulando recursos, poder pagar mais barato pelos bens que quiser. Isso significa que você poderá consumir cada vez mais. Basta conseguir fechar o primeiro ciclo. A partir do segundo ciclo você sempre poderá entrar em contato com os aspectos prazerosos também no curto prazo. Você vai parar de comprar dinheiro e sobrará, com isso, mais recursos para você consumir com coisas que realmente sejam necessárias e prazerosas para você e sua família.