Os melhores e piores do ano, segundo os críticos de Veja São Paulo
Especialistas em cinema, concertos, dança, exposições, shows e teatro deixam suas impressões sobre o que se destacou em 2012
Qual foi o show mais bacana de 2012? E o filme mais marcante? Como de praxe, fim de ano é época de relembrar a agenda cultural paulistana, eleger as melhores e espinafrar as piores. Os críticos de VEJA SÃO PAULO fizeram sua seleção. Confira abaixo suas escolhas e também palpite!
***
Carolina Giovanelli, crítica de dança, escreve também o blog Bichos
Melhor espetáculo de dança de 2012:
São Paulo Cia. de Dança – Bachiana Nº 1
Em um ano de várias estreias, a companhia paulistana brilhou na montagem Bachiana Nº 1, preparada especialmente para o elenco pelo coreógrafo mineiro Rodrigo Pederneiras, do aclamado Grupo Corpo. O espetáculo estreou em abril, no teatro do Sesc Vila Mariana. Embalado pela Bachiana Brasileira Nº 1, de Villa-Lobos, contava com enérgicos movimentos em conjunto que casaram perfeitamente com a trilha. Um pas de deux bem executado mostrou sensibilidade ímpar.
Pior espetáculo deste ano:
Legend Lin Dance Theatre – Chants de la Destinée
A coreografia da companhia taiwanesa não conseguiu conquistar o interesse de parte da plateia em suas apresentações no Teatro Alfa, em novembro. Apesar de um cenário exuberante, Chants de la Destinée, que exaltava a cultura oriental, tinha a maioria de seus passos interpretados em uma velocidade impressionantemente lenta. Algo que podia ser resolvido em poucos minutos se alongava por até meia hora. As cenas, de tão vagarosamente executadas, faziam o palco lembrar uma pintura. Por isso, não funcionaram muito para alguém que esperava assistir a uma dança tradicional. Na segunda parte do espetáculo, até apareceram alguns trechos mais dinâmicos, mas que foram ofuscados pelos fragmentos entediantes iniciais.
***
Carol Pascoal, crítica de música, escreve também o blog Passagem de Som
Melhor show de 2012:
Milimetricamente pensado e ensaiado, o espetáculo Verdade uma Ilusão, de Marisa Monte, ofuscou todas as megaproduções internacionais que passaram por São Paulo em 2012 (inclusive o impressionante muro erguido e destruído por Roger Waters no Estádio do Morumbi). Apesar de o ótimo repertório contribuir para o êxito, a apresentação surpreendeu pelo inovador diálogo que estabelece entre música e artes plásticas. A beleza está no fato de as projeções não roubarem o brilho de cada canção. Mais solta no palco, a ponto de arriscar passos de dança, a cantora também tinha como trunfo a presença do power trio da Nação Zumbi. Dengue (baixo), Lúcio Maia (guitarra e violão) e Pupillo (bateria) foram responsáveis por dar vigor ao show, mas sem tirar a delicadeza do roteiro.
Pior show deste ano:
Dado Villa-Lobos, Marcelo Bonfá e Wagner Moura
Em maio, o guitarrista Dado Villa-Lobos e o baterista Marcelo Bonfá subiram ao palco do Espaço das Américas para celebrar os trinta anos de existência da Legião Urbana. O problema foi a brilhante ideia que eles tiveram de convidar Wagner Moura para assumir o posto que pertenceu a Renato Russo. Assim que os primeiros acordes de Tempo Perdido e a voz do ator ecoaram, foi possível prever que aquele show (catastrófico) também seria um tempo perdido na vida de qualquer um ali presente. O tamanho da paixão mostrada por Moura naquela noite pode ser considerado inversamente proporcional ao seu talento como cantor. Ao longo do espetáculo, ele arruinou canção por canção (numa espécie de Capitão Nascimento do meio musical). Apesar de extasiado, o público estava disposto a curtir o momento independente da qualidade apresentada. Pela primeira vez, a péssima acústica do Espaço das Américas serviu para alguma coisa: abafar as derrapadas do vocalista.
***
Dirceu Alves Jr., crítico de teatro, escreve também o blog Na Plateia
Melhor peça de 2012:
Estamira – Beira do Mundo
O melhor espetáculo que passou pelos palcos paulistanos nesse ano, na verdade, veio do Rio de Janeiro e estreou por lá ainda em 2011. Com uma extensa carreira no grupo Doutores da Alegria, a atriz carioca Dani Barros, de 39 anos, tornou seu nome relevante na cena brasileira com o monólogo Estamira – Beira do Mundo. Entre o final de junho e todo o mês de julho, ela deu vida para a catadora de lixo Estamira Gomes de Sousa (1941-2011) no Sesc Pompeia. A personagem real já havia sido apresentada ao público no documentário lançado pelo cineasta Marcos Prado em 2005. Doente mental crônica, Estamira passou boa parte da vida no Aterro Sanitário do Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (RJ), e tinha uma percepção devastadora dos fatos. Escrito por Dani e pela também diretora Beatriz Sayad, o espetáculo aproveita a realidade perturbadora dessa mulher para fundir elementos de outra história delicada. Em um irrepreensível desempenho – premiado com o Shell e, no início de dezembro, pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) –, Dani ainda evocou sua mãe esquizofrênica e fez do espectador um cúmplice emocionado do sincero desabafo e do trabalho transformador em sua carreira.
Pior espetáculo deste ano:
O cantor Jair Rodrigues poderia ter comemorado cinquenta anos de carreira sem esse presente de grego. Escrito por Flavio Kenna e sob a direção cênica de Sebah Vieira, o musical Jair em Disparada mal aguentou duas semanas de setembro em cartaz no Teatro Brigadeiro. Com dramaturgia capenga, erros de pesquisa e um repertório discutível, o espetáculo – se é que podemos chamá-lo assim – repassou parte da vida e obra do artista e, muitas vezes, privilegiou a cantora Elis Regina ao oferecer a ela um espaço que transcende a parceria da dupla no programa de televisão O Fino da Bossa. Na pele de Jair, o ator Luciano Quirino esforçou-se o quanto pode, mas não escondeu as limitações como cantor, o que deveria ser um requisito fundamental, afinal o personagem é muito mais explorado musicalmente que dramaticamente. Tentando se aproximar ao máximo de Elis, Carol Bezerra (substituta às pressas de Claudia Ohana, que pulou fora do barco dias antes da estreia) exagerou na recriação da intérprete e foi além do limite de sua bela voz. Canções como Disparada, Deixa Isso pra Lá, Majestade, O Sabiá, Águas de Março, Como Nossos Pais e A Banda figuraram no repertório, tendo ao fundo casais de bailarinos em coreografias despidas de técnica e constrangedoras. Em um momento de apogeu do gênero no Brasil, nada justifica uma produção primária como essa.
***
Jonas Lopes, crítico de artes plásticas e música clássica
Melhor exposição de 2012:
Apesar de ser considerado o maior escultor do século XX, ao lado de Constantin Brancusi, o suíço Alberto Giacometti (1901-1966) ainda não havia ganhado uma retrospectiva na América do Sul. Uma mostra de grande porte na Pinacoteca, com 280 obras provenientes da Fundação Alberto e Annette Giacometti, de Paris, supriu a ausência histórica e permitiu aos paulistanos travar contato com diversos suportes adotados pelo artista: pinturas, desenhos, gravuras e, claro, esculturas. Destaque para o espetacular bronze Homem Caminhando, posicionado no octógono do museu e uma das figuras esguias que fizeram a fama de Giacometti pela habilidade em investigar a frágil condição do homem contemporâneo.
Pior exposição deste ano:
Depois de meses de especulação, a galeria londrina White Cube enfim inaugurou uma filial paulistana, na Vila Mariana. Infelizmente, na mostra de estreia a casa preferiu apostar no burburinho de mercado que na qualidade. Mesmo agenciando nomes brilhantes, a exemplo do alemão Anselm Kiefer e do canadense Jeff Wall, a White Cube trouxe uma individual da inglesa Tracey Emin. A polêmica artista ficou famosa ao explorar de maneira histérica e espalhafatosa a própria sexualidade – a obra mais conhecida da carreira de Tracey é My Bed, uma cama com resquícios de uma noite de sexo (lençóis sujos, preservativos). Na mostra paulistana, ainda em cartaz, ela exibe desenhos de mulheres se masturbando, em uma pretensa transgressão que logo perde o efeito, e neons com frases tolas (uma delas: “eu não acredito no amor, mas acredito em você”).
Melhor concerto de 2012:
Em um ano prolífico em grandes pianistas trazidos pela Osesp – Marc-André Hamelin, Jean-Efflam Bavouzet, Maria João Pires, Sergio Tiempo, entre outros –, quem sobressaiu foi o húngaro András Schiff. Sem dúvida um dos mais importantes nomes do instrumento em atividade, o músico solou em um concerto de Beethoven ao lado da Osesp, com regência de Carlo Rizzi. O ponto alto da visita a São Paulo, no entanto, foi um transcendental recital-solo. Schiff tocou as últimas sonatas de Beethoven, Schubert e Haydn, três composições marcadas pela proximidade da morte dos autores. No bis, entregou a ária das Variações Goldberg, de Bach.
Pior espetáculo deste ano:
Cenário e figurinos bem para lá da fronteira do kitsch, cantores microfonados, acústica totalmente inadequada do Ginásio do Ibirapuera: o violinista holandês André Rieu atraiu multidões para suas apresentações, mas toda a grandiosidade da produção não se traduziu em um concerto de qualidade. Sofrível, o repertório do “pop star da música clássica” abusou das valsas do fraco compositor austríaco Johann Strauss II e trouxe outras escolhas infelizes, como Balada de Adelina, tema brega celebrizado por Richard Clayderman, e Ai Se eu Te Pego, de Michel Teló. Tudo isso por ingressos que chegavam a custar R$ 600,00.
***
Miguel Barbieri Jr., crítico de cinema, escreve também o blog Tudo sobre Cinema
Melhor filme estrangeiro de 2012:
Não à toa, este irrepreensível drama iraniano levou o Oscar 2012 de melhor filme estrangeiro e foi o único a receber a cotação máxima de cinco estrelas em VEJA SÃO PAULO. Trata-se de uma absorvente história cujos temas exigem um posicionamento da plateia. Dos conflitos familiares às tradições islâmicas, o diretor Asghar Farhadi abre seu enredo a fim abordar a diversidade de ideias e opiniões das pessoas de seu país.
Pior filme estrangeiro deste ano:
O ator Liam Neeson não aprende. Além de ter estrelado o primeiro filme, retornou nesta sequência igualmente horrenda. O excesso de violência gratuita, o roteiro repleto de clichês e o desfecho para lá de previsível são alguns dos muitos defeitos. Ao invés de criar tensão e suspense, o filme ficou no nível do risível.
Melhor filme nacional de 2012:
Pouca gente acreditava que um filme sobre raves brasileiras poderia render algo bacana. Mas foi o que ocorreu com este drama do diretor Marcos Prado, que já tinha no currículo o ótimo documentário Estamira. Na mira da ficção, o cineasta construiu uma engenhosa história, que alterna passado e presente, para mostrar como uma descolada DJ se envolveu numa tragédia pessoal. O realizador, além de imagens lisérgicas de tirar o fôlego (a cena dos búfalos, por exemplo, é impressionante), trouxe belas locações em Amsterdã, um dos cenários do roteiro.
Pior filme nacional deste ano:
Embora saudado como uma revelação do humor, Fábio Porchat esteve na pior “coisa” que o cinema brasileiro lançou em 2012. A suposta comédia trouxe Fábio Assunção no patético papel de um repórter banana, fez de Ingrid Guimarães uma lésbica caricata e, pior, retratou uma favela carioca com os mais deploráveis estereótipos. Conclusão: um filme tosco na forma e grosseiro no conteúdo.
***
Tatiane Rosset, crítica de crianças
Melhor peça infantil de 2012:
Em um cenário simples, adornado por tecidos em tons claros, diversas histórias do famoso Livro das Mil e Uma Noites foram narradas de forma intrigante, com gosto de quero mais. Os principais responsáveis pela brilhante exposição dos contos foram os atores Manoela Pamplona e Fábio Coutinho que, ao interpretarem inúmeros papéis, conseguiram conferir diferentes aspectos a uma mesma montagem, como leveza, vitalidade e comédia. A direção de Amauri Falseti, também adaptador, acerta ao guiá-los por uma montagem com espaço reduzido, mas repleta de composições suaves e mudanças de cores, que se adaptam a cada nova narrativa. Tudo de maneira muito suave e, ao mesmo tempo, invasiva, instigando o espectador a conhecer mais afundo as passagens orientais.
Pior peça infantil deste ano:
Chaves Animado – Show ao Vivo
Famoso por seu papel na televisão, Chaves não foi tão bem recebido no picadeiro do Circo dos Sonhos. Seu espetáculo contava com um roteiro fraco e previsível e acabou frustrando os pais que levaram as crianças para assistirem as estripulias do menino do barril. A narrativa contava com um típico vilão que aparece como mocinho e só posteriormente é desmascarado pelos moradores da vila. Com produção precária, os cenários e bonecos dos personagens assustavam ao invés de entreter o público. Responsáveis por dar vida à turma, os atores da montagem se atrapalhavam durante as coreografias mal ensaiadas. Completava o pesadelo as canções de péssima composição da peça, foram reproduzidas de maneira abafada pelo sistema de som do local. Para aproveitar este passeio, só sendo muito fã da série que passa na telinha.