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“As pessoas esperavam que eu fosse um docinho de coco”, diz Manu Gavassi

Atriz, cantora e compositora fala sobre a série Maldivas, o estereótipo de “princesa” do qual busca se desprender e o espírito de liderança em seus projetos

Por Barbara Demerov
Atualizado em 27 Maio 2024, 21h52 - Publicado em 17 jun 2022, 06h00
Manu Gavassi posa com as duas mãos do lado esquerdo do rosto
Manu Gavassi. (Julia Rodrigues/Netflix/Divulgação)
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Manu Gavassi é um nome em constante ascensão. A paulistana de 29 anos começou sua carreira na música em 2010 e, ainda que essa área de atuação tenha sido seu principal foco, também trabalhou em novelas, ficou em terceiro lugar no Big Brother Brasil 2020 e, agora, é uma das estrelas de Maldivas, série da Netflix criada por Natalia Klein.

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Manu interpreta Milene, síndica de um luxuoso condomínio, e atua ao lado de Bruna Marquezine, Carol Castro, Sheron Menezzes e Vanessa Gerbelli. A trama é afiada no suspense e no sarcasmo — elementos que agradam à artista.

Maldivas tem mulheres na criação e em praticamente todo o elenco. Acha que é um reflexo das reivindicações por mais destaque do mundo feminino no streaming?

Com certeza, e, além de eu querer muito trabalhar com a Netflix em um grande projeto, sempre gostei do trabalho da Natalia Klein. Ela tem um humor irônico e sarcástico, que eu adoro. E a Milene é incrível. Era tudo o que eu queria, porque ela dá margem a várias camadas. Dá pra brincar com a parte estereotipada, com a máscara que ela usa em público. Ao mesmo tempo, existe o lado real, com uma tristeza e vulnerabilidade que trazem identificação.

A série satiriza a elite alienada. Pensa que o humor mudou nas produções recentes?

Sim. O humor existe para cutucar feridas. Sempre fez a gente rir do absurdo, depois pensar: “Meu Deus, não é tão absurdo assim”. E ainda traz o constrangimento do quanto daquilo é verdade, quanto pode existir um pouco dentro da pessoa também. O papel da sátira na história sempre foi esse, e é isso que Maldivas faz. Há diversos personagens que existem na vida real.

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Você lançou um álbum visual em 2021. Acha que a música deve vir atrelada a outro elemento audiovisual para chamar atenção?

Cada um tem uma relação pessoal com a música, mas eu não consigo fazer música sem o audiovisual. Não dá para contar uma meia história, quero contar algo inteiro. O processo é como se fosse um “minifilme” e a maneira de divulgar não é tão interessante para o algoritmo, mas eu entendo o meu papel. Não comparo minha carreira com outras. Penso que bons trabalhos são bons trabalhos e eles ficam para sempre. É assim que faz sentido para mim, mas de jeito nenhum considero isso uma regra.

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Na música Gracinha, você diz que está presa numa pose de princesa. Como se libertar do estereótipo?

Eu me coloco um pouco nesse lugar. Depois de toda a exposição no BBB 20, eu pensava: “Cheguei até aqui e não posso decepcionar”. É estranho participar de um reality porque você não vê sua trajetória sendo construída. Você sai e ela já está pronta. Me senti muito representada pela história que contei lá dentro da casa, mas ao mesmo tempo ela me colocou uma pressão para não errar. Eu escrevi a música em um momento triste e reflexivo. Tenho orgulho desse álbum. Acho que ele vai continuar reverberando e alcançando pessoas. Ele é o inimigo do algoritmo, e eu amo essa rebeldia.

Você se afastou das redes sociais na época em que escreveu o álbum?

Sim. Foi na época em que eu estava criando, rodando e gravando o álbum. Também estava rodando Maldivas. Fiz tudo ao mesmo tempo e, com a internet, não teria conseguido. Fiquei nove meses longe. Foi maravilhoso porque eu não precisava prestar contas aos outros, a vida ficou mais leve. Quando voltei, foi um baque, mas me sinto mais equilibrada com meu uso nas redes hoje, pois entendi até onde é bom e até onde eu não preciso mais. Já sinto os resultados de ter tomado as rédeas da minha vida pública.

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Seu trabalho nas redes durante o BBB fez sucesso. Após duas edições, acha que a influência da internet no reality passou dos limites?

Não dá para comparar a edição de 2020 com as outras porque a gente não sabia que era um sucesso. Esse foi o fator determinante. O fato de não fazer ideia faz você agir naturalmente. Lembro que, quando o Tiago Leifert falou em “cancelamento”, eu nem era familiarizada com o termo. A nossa inocência acabou tornando a experiência única. Não tem como entrar depois não sabendo que você pode colocar tudo a perder.

Pensa que o mundo está mais polarizado?

Hoje nós temos muita informação e corremos o risco de ficar presos em nossa própria bolha. Isso é perigoso e mina a capacidade de conversar com outras pessoas, porque parece que são mundos diferentes. Isso é extremamente nocivo, porque a comunicação entre dois lados tem de existir.

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As redes sociais se tornaram tóxicas?

Com certeza. Você estar em uma plataforma na qual vê a opinião de tanta gente sobre seu trabalho, sua vida, sua aparência… É impossível isso não te afetar. Eu já mudei de comportamento no meu trabalho de tão insegura que fiquei depois de ler algo na internet que me abalou. E a pessoa nem me conhecia. Era esse o medo que eu sentia antes.

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Em seus anos de carreira, já sofreu algum tipo de intolerância por ser mulher?

Por ter começado muito nova, eu não reparava tanto. Demorei para perceber que isso era real. Mesmo com os privilégios de ter minha própria equipe e de ter autonomia, eu me culpava por ser uma líder. As pessoas esperavam que eu fosse um docinho de coco. Um homem na mesma posição era um excelente líder, mas eu era apenas mandona. Isso está impregnado em absolutamente tudo o que as mulheres fazem. Para nós, é mais difícil — e você ainda tem de tentar ser fofa. Hoje eu tirei um pouco desse peso. Serei uma boa líder e não vou pedir desculpas.

Em um de seus shows, você se posicionou politicamente (contra o presidente Bolsonaro). Ficou com receio da reação do público ou da mídia?

Nunca tive. Cresci em uma família politizada, que sempre foi muito clara sobre seus ideais. Não sinto medo de falar o que penso.

O que deseja realizar no futuro?

Me sentir satisfeita com o que faço. Eu me cobro tanto que sinto que nunca é suficiente. O que eu mais desejo é poder saborear minha vida e profissão com projetos autorais. E sair dessa corrida comigo mesma.

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Publicado em VEJA São Paulo de 22 de junho de 2022, edição nº 2793

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