Caso do anexo do Espaço Itaú de Cinema derruba diretor de patrimônio
Pedido para preservação já havia sido protocolado há quatro meses; advogado Orlando Correa da Paixão, agora ex-diretor do órgão, nega que esse foi o motivo
A demora de quatro meses para avaliação do pedido de preservação do anexo do Espaço Itaú de Cinema e o Café Fellini, na Augusta, foi o estopim para a saída do advogado Orlando Correa da Paixão do cargo de diretor do DPH (Departamento de Patrimônio Histórico). A sua exoneração do cargo foi publicada nesta sexta-feira (17) pelo Diário Oficial da Cidade. Procurado, o advogado nega que esse tenha sido o motivo de sua saída. “Não há nenhuma relação. Foi feito um estudo minucioso e muitos casos demoram”, afirma. (leia mais detalhes sobre a versão do diretor abaixo).
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Na prática, Paixão já não despachava no órgão desde o dia 2 de fevereiro. A Vejinha apurou que foi realizada uma reunião na última sexta-feira (10) na sede da Secretaria Municipal de Cultura para avisar da saída do diretor.
Diferentes fontes da própria prefeitura indicam que Paixão era próximo do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que assinou a exoneração, porém, colecionava uma série de atritos com a secretária municipal de Cultura, Aline Torres. Aline é cotada para a vaga de vice numa eventual tentativa de Nunes de tentar a reeleição. Paixão confirmou que os atritos com a secretária existiram. “Atritos sempre houveram em função de visões diferentes”, diz o advogado.
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Uma das principais atribuições do diretor do DPH é ditar o ritmo dos pedidos de tombamento que chegam ao órgão. Ainda não foi divulgado quem o sucederá no cargo.
Anexo
A pressão em relação ao tombamento do anexo do Espaço Itaú de Cinema e o Café Fellini começou a aumentar em janeiro deste ano, quando uma ação civil pública questionou o motivo pelo qual um pedido feito em 17 de outubro de 2022 para que a área do cinema e do café fossem enquadradas em Zepec-APC (Zonas Especiais de Preservação Cultural – Área de Proteção Cultural) não havia sido analisado até agora. A autoria do pedido é da Samorcc (Sociedade dos Amigos e Moradores do Cerqueira César), que luta pela preservação do espaço.
Na última terça-feira (14) a Justiça deu um prazo de 72 horas para que a prefeitura se explicasse a respeito, prazo que vence hoje. A Vejinha confirmou que o pedido de enquadrar a área do Espaço Itaú de Cinema e o Café Fellini em Zepec-APC foi analisado nesta quinta-feira (16). A tendência dos técnicos é pela preservação não só do Espaço Itaú de Cinema e o Café Fellini, mas também de outros cinemas de rua da capital que têm valor histórico e artístico.
Assim que receber a resposta da prefeitura, o juiz Otavio Tioiti Tokuda, da 10ª Vara de Fazenda Pública, que analisa o caso, deve decidir se obriga o Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da cidade de São Paulo) a analisar se de fato o local deve ser protegido ou não.
O que diz o ex-diretor
Paixão foi procurado cerca de uma hora antes deste texto ter sido publicada. O primeiro contato foi feito por telefone às 11h18, e o segundo por meio de mensagem de WhatsApp, às 11h22.
Às 13h09, após a publicação, ele procurou a reportagem para apresentar a sua versão. Paixão defende não haver relação alguma de sua saída com a questão da análise do pedido da Samorcc. Segundo ele, diferentemente do que indica a ONG e a denúncia do Ministério Público Estadual, o processo teve andamento dentro do órgão, embora essa informação contradiga o informado no pedido protocolado pelo Ministério Público Estadual à Justiça. “Até o momento, no entanto, não houve qualquer manifestação do órgão preservacionista municipal”, menciona a representação assinada por três promotores.
“A Samorcc fez o pedido e a análise do pedido chegou ao fim em janeiro”, afirma o advogado. “Quatro meses de análise técnica aonde você tem que fazer um estudo minucioso, onde você tem que fazer uma pesquisa histórica, não é nada. Tem processos de tombamento que levam dois, três anos de estudo. Quatro meses de análise é para quem nunca lidou com o tema achar que é muito tempo”, afirma. Ele diz ainda que o DPH é um órgão absolutamente técnico e que possui “pessoas extremamente comprometidas com a causa da preservação cultural na cidade”, diz. “Mas, este caso do Felini, em questão, foi analisado dentro da escala de prioridade. Processos assim, costumam levar muito mais tempo”, explica.
Em relação aos atritos com a secretária Aline Torres, o advogado afirmou que eles sempre existiram. “Atritos sempre houveram em função de visões diferentes, em função de querer potencializar o órgão. A gente sempre tentou de todas as formas criar uma melhor dinâmica na análise dos processos”, diz. “Na nossa gestão o DPH-Conpresp passou a produzir muito mais e melhorando a qualidade das análises. De fato, com a falta de funcionários que tínhamos, difícil conseguir dar vazão aos mais 600 processos que estão em análise”, afirma.
Outro ponto de tensão mencionado por ele foram os pedidos não atendidos para contratação de mais efetivo para o órgão. “Sempre aquele processo demorado, sempre aquela situação de não entregar pra gente as ferramentas que a gente precisava para trabalhar. Então isso, realmente houveram muitos atritos. A secretária tem um posicionamento centralizado nela”, afirma. “Mesmo com a falta de apoio da secretária Aline, durante todo o período que estive lá, o órgão continuou produzindo com eficácia e responsabilidade, ganhando bastante notoriedade e destaque na administração, o que a incomodou profundamente”, complementa.
Ele afirmou que seu trabalho sempre foi pautado por pela “retidão, cuidado e seguindo as normas técnicas.”
Questionado sobre a ação civil pública, ele diz que essa pergunta deveria ser feita para o promotor do caso.