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Os paulistanos que ainda produzem árvores naturais de Natal

Cultura da tuia, espécie em formato de cone popularmente vendida como pinheiro natalino, tenta resistir na região de Parelheiros, extremo sul da cidade

Por Matheus Prado
Atualizado em 13 dez 2019, 13h00 - Publicado em 13 dez 2019, 06h00

A São Paulo rural, no extremo sul da metrópole, é, e tenta continuar sendo, o coração do Natal da cidade. Dali, do bairro de Colônia Paulista, região de Parelheiros, saem os “pinheiros” que decoram as festividades dos paulistanos. Ou pelo menos saíam. A cada ano, a procura pelas árvores naturais diminui em relação às sintéticas, o que faz com que os produtores reduzam suas plantações ou abandonem a cultura de vez. As vendas na Ceagesp, por exemplo, caíram de mais de 33 000 árvores, em novembro de 2012, quando a cultura já estava em crise, para cerca de 10 000, no mesmo período do ano passado. Os motivos para o abandono da tradição incluem a baixa durabilidade da planta dentro de casa — aproximadamente um mês — e a possibilidade de reuso da árvore de plástico por vários períodos natalinos. Mas cerca de cinquenta famílias, à espera de que esse mercado volte a se aquecer, ainda reservam um bocado de suas terras para as tuias, coníferas pertencentes à família Cupressaceae que têm formato, cor e cheiro característicos dos dias 24 e 25 de dezembro.

A tradição, que sobrevive a mais de 50 quilômetros do centro da cidade, vem passando de pai para filho há pelo menos três décadas, o que acrescenta ainda uma camada de afeto ao plantio. “É um trabalho em família. Meu pai fica na produção, eu e meu irmão levamos as plantas de caminhão para o Ceasa, minha irmã vende e minha mãe comanda a contabilidade”, explica Allan Helfstein, um dos remanescentes e mais otimistas produtores que investem no plantio da espécie na Zona Sul paulistana.

Apesar disso, os produtores sentem na pele as mudanças do mercado. “A gente já chegou a vender 15 000 árvores por ano, hoje não chega a 1 000 por produtor. Precisamos fazer um trabalho de formiguinha para conscientizar e recuperar a clientela. Natal representa vida, nada melhor que decorar sua casa com uma árvore viva”, argumenta Luciano Santos, 44, agricultor e diretor do Sindicato Rural de São Paulo. Para estimular a compra do produto, ele pensa em investir no cicloturismo, entre outras coisas. O objetivo é criar rotas, mostrar produtores e produção aos visitantes, estreitando laços com esse mundaréu de gente que vive ao norte.

Fim de ciclo: Luiz Bueno vende o que pode ser sua última safra de tuias (Romero Cruz/Veja SP)

Seus antepassados, parte da colônia alemã na região, trabalharam com produtos alimentícios até sentirem o boom das espécies ornamentais na década de 80. Vislumbrando um aumento nas receitas, a família Santos, assim como muitas outras no pedaço, começou a dividir seus campos e esforços entre os tubérculos, as hortaliças e as tuias. “Em 1 000 metros de terra, a gente conseguia plantar 1 000 pés da árvore e ir cuidando deles. Como elas só vendem bem no fim do ano, era um dinheiro garantido para esse período das famílias”, resume.

Com a queda das vendas, tem-se aí um dos pontos que mais pesam no bolso dos produtores. A muda demora, em média, seis meses até soltar raiz. Depois, fica um ano no canteiro, para ganhar corpo. Já no solo, leva mais três anos até chegar aos 60 centímetros, medida mínima para encontrar compradores. É praxe ainda deixá-la crescer mais, até 5 metros de altura. A planta leva mais de uma década para alcançar a estatura desejada. Além disso, precisa de pelo menos três podas anuais para manter o formato de “árvore de Natal”.

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Qualquer corte errado pode atrasar o processo em pelo menos mais quatro estações. Pesando tudo isso na balança, o produtor Luiz Bueno, 49, chegou à conclusão de que talvez esteja na hora de aposentar as tuias. “É um produto caro e trabalhoso. A gente mantém algumas tuias porque gosta das plantas. Mas, hoje, se tenho 200 plantadas na minha terra, é muito”, conta. Para substituir a custosa árvore, vários agricultores têm apostado no buxinho, aquele arbusto arredondado que costuma ocupar os jardins de casas de alto padrão. Ele também pode ser podado em formato de cone e tem um grande diferencial: sobrevive o ano inteiro com menos cuidados.

A administradora de empresas Luiza Porto, 57, até pensou em parar de comprar tuias para a decoração de Natal justamente porque elas acabavam morrendo depois de passar aproximadamente um mês dentro de casa. Começou então a borrifar água diariamente na planta e, depois das festividades de fim de ano, a dar as árvores a sua funcionária para que replantasse no sítio em que mora. Assim conseguiu manter a tradição de usar “pinheiro” de verdade. “Certa vez comprei uma árvore sintética, mas meus filhos, que eram pequenos na época, não gostaram. Não tinha aquele cheirinho de Natal”, lembra. Ela conta que chegou a comprá-las diretamente na Ceagesp, mas acabou adotando a comodidade das floriculturas da Avenida Doutor Arnaldo. Por lá, ainda há árvores à venda. Os preços começam em 80 reais. Já na Ceasa, a planta sai mais em conta — custa a partir de 30 reais.

Em família: Allan Helfstein segue os passos do pai e vive da plantação de tuias (Rogerio Pallatta/Veja SP)

O CAMINHO DAS TU(I)AS

A árvore de origem asiática e americana que não é pinheiro mas parece

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> O início Em São Paulo, as tuias são produzidas há pelo menos trinta anos por famílias de origem alemã e japonesa na região de Parelheiros.

> Crescimento Majoritariamente voltados para a plantação de hortaliças e tubérculos, os produtores viram nas tuias uma opção de renda extra.

> Longa espera As tuias demoram para ficar prontas — pelo menos seis meses para desenvolver raízes, mais um ano no canteiro e outros três até os 60 centímetros mínimos para o comércio.

> Na sua casa As pessoas iam até Colônia Paulista para comprar a árvore. Depois, até a Ceagesp. Após alguns anos, os clientes já preferiam a comodidade das floriculturas da Doutor Arnaldo. Hoje vão ao shopping e levam a árvore de plástico.

> Queda A tuia perdeu espaço não só na casa das pessoas, mas também nas plantações, para outras espécies ornamentais, como o buxinho.

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