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Movimento ‘hype’: jovens gastam 3 000 reais em moletom e 6 000 em tênis

Eles buscam peças raras de marcas da moda 'streetwear' e sustentam o "vício" revendendo itens com lucros que atingem os 350%

Por Adriana Farias
Atualizado em 19 jun 2018, 10h42 - Publicado em 15 jun 2018, 16h09

Nas últimas semanas, dois vídeos com os títulos “quanto custa o outfit?”, parte 1 e 2, viralizaram na internet e bateram 6 milhões de visualizações. Eles mostram uma galera jovem, e até crianças, vestindo looks diferentões que, contando todas as peças, chegam na casa dos 33 000 reais. Gravado em um evento no bairro do Belém, na Zona Leste, pelo canal no YouTube Hyped Content Brasil, o material surpreendeu o público pelos valores exorbitantes dos itens e abriu discussão para se entender o fenômeno.

Trata-se da moda de rua streetwear. Quem está inserido nesse segmento diz ser do movimento hype, um dos muitos termos em inglês usados pela turma (confira glossário no fim da matéria). “É o lance da raridade, por isso as peças são caras. Você calçar um tênis que quando vai para rua não vai encontrar ninguém usando igual”, explica a estudante de publicidade Larissa Kora, 21, considerada a paulistana mais hypebae da área. Traduzindo: a garota com mais itens raros no armário – o homem com esse perfil leva o título de hypebeast.

Dos quarenta tênis que Kora possui, 28 deles aparecem na lista dos difíceis de encontrar. É dela, por exemplo, um par do Converse Off-White. Apenas 34 unidades do produto chegaram ao país. Seu xodó, entretanto, consiste em um Balenciaga, adquirido há duas semanas, vindo de uma distribuidora inglesa. O preço? 6 000 reais.

“Beira a ostentação, mas não é”, garante o advogado Fellipe Escudeiro, 27, e namorado de Kora, um dos fundadores do canal Hyped Content Brasil e um legítimo hypebeast. “É mais o orgulho de ter conseguido aquela peça do que o valor dela em si. Eu chego em casa, uso um pouco, enjoo e já revendo mais caro para comprar outro.”

A revenda, inclusive, se mostra um dos pilares da cultura streetwear. A turma consegue, por exemplo, comprar uma peça por 700 reais e revender por até 3 000 reais. Assim, angaria posição no movimento e dinheiro para sustentar o “vício” em roupas e tênis raros e caros. A maior parte dos itens leva a marca de empresas como Supreme, Off-White, Bape e Heron Preston, que não são vendidas no Brasil. Elas ganham projeção principalmente por meio de artistas estrangeiros do hip-hop, a exemplo de Kanye West, Travis Scott e Rich The Kid.

A seguir, Fellipe Escudeiro, Larissa Kora e a stylist Izabelle Capuzzo, 32, considerados grandes influenciadores em São Paulo desse segmento, explicam como o fenômeno se disseminou na capital, falam sobre uma bolsa de valores de tênis na internet, entre outras curiosidades desse universo.

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O advogado Fellipe Escudero, fudnador do canal Hyped Content Br: esse visual completo custou 13 270 reais (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Felipe Escudeiro, 27 anos, advogado e fundador do Hyped Content Br (@fellipeescudero e @hypedcontentbr)

“Aos 15 anos de idade, eu me viciei em tênis por conta do meu pai que também gosta, ando de skate desde os 10 e amo hip-hop. Gosto de tudo relacionado ao streetwear. Entrei de vez no segmento há dois anos depois que vi a cena hype explodir na Europa e nos Estados Unidos. Passei a acompanhar tudo pela internet e vi que daria para fazer uma grana com isso, comprando os itens raros e vendendo bem mais caro por aqui. Caí de cabeça nisso e me apaixonei quando conquistei o Air Force 1, primeiro tênis lançado pelo cantor Travis Scott. Fiquei quarenta horas na fila em uma loja no Rio de Janeiro. Paguei 600 reais e hoje ele vale 2 000 reais porque só saíram 48 pares no país todo. Esse eu não revendi. Me tornei um grande admirador de design, sobretudo do Virgil Abloh, fundador da marca Off-White.

Eu tenho 25 tênis e entre eles oito são exclusivos. O que eu mais gosto é o Converse Off-White, o mais raro que saiu no país. Peguei três dele. Deu um total de 4 450 reais. Eu faço revenda, busco lucro de 50 a 60% em cima, mas não mexo como se fosse um empreendedor, faço mais para bancar meu hobby. Também tenho nove roupas raras, que dão uns 12 000 reais, além de doze relógios – o que mais gosto é de um Corum de 28 000 reais.

Beira a ostentação, mas é mais o orgulho de ter conseguido aquela peça rara do que o valor dela em si. Como a gente trabalha com isso, todo mundo sabe mais ou menos o valor que custa. Existe uma bolsa de valores dos tênis na internet, Stock Ex, é nisso que me baseio para fazer as revendas. O item pode estar valendo 1 000 dólares hoje e amanhã, 900 dólares, e depois de amanhã 1 200, depende de qual artista o usou naquele momento. O meu negócio é ter acesso. Compro esse tênis, que acho maravilhoso, aí chego em casa e agora eu posso vender. Já não ligo mais.”

Larissa Kora possui 28 pares de tênis raros: o mais caro custa 6 000 reais (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Larissa Kora, 21, estudante de publicidade (@larissakora)

“Entrei nesse segmento no final de 2016 quando comprei de um conhecido o modelo Yeesy Beluga 1.0, colaboração do Kanye West com a Adidas. Paguei 2 000 reais e a partir daí não parei mais. No início, minha mãe, que é empresária, me ajudava com a grana. Hoje, banco tudo e consigo fazer isso porque também revendo itens como o Fellipe, meu namorado. Como virei referência na área, consigo até 350% de lucro em cima dos itens. Já peguei exemplares por 700 e revendi por 3 000 reais. Depende do tênis, da exclusividade, do modelo. 

Rastreio as lojas e sei previamente as datas que os pares chegam ao país, não só da Nike e Adidas, como de outras. Já viajei para os Estados Unidos e trouxe sete pares. Da Europa, vim com mais outros três, mas a maioria compro nos lançamentos nas lojas físicas ou pela internet no Brasil todo. Tenho 28 pares raros. Nas redes sociais, sigo muito o inglês Ari Petrou (@aripetrou), o cara mais hypebeast do Reino Unido. Ele usa itens da Gucci e une com um tênis, um moletom. Esse é o universo streetwear e eu vivo isso.

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É o lance da exclusividade. Quantas pessoas você conhece que usam Heron Preston (ela tem moletons da marca que não saem por menos de 3 000 reais)? Nenhuma! E quantas você conhece que usam Zara? É isso.”

A estilista Izabelle Capuzzo: pochete por 4 300 reais e manguitos inspirados em jogadores de basquete (Reprodução Instagram/Veja SP)

Izabelle Capuzzo, 32, stylist (@izabellecapuzzo)

“Moro em Goiânia, mas todo mês estou em São Paulo em eventos de revenda de tênis e fazendo negócios. Virei sócia de uma loja de tênis, a Foot Club Sneakers, e a gente consegue tênis de todo lugar do mundo. O streetwear para mim é uma peça de alfaiataria junto de um tênis. É o high fashion com o street, a alta costura com a moda da rua. Um blazer, uma saia lápis e um tenisão é a combinação perfeita.

O movimento está fortemente ligado aos anos 80 e 90, com o hip-hop contaminando os centros de São Paulo e Rio de Janeiro. Procuro tênis com design assinado. A Adidas tem o modelo Collab Y3 com assinatura do Yohji Yamamoto, Adidas com Alexander Wang. Eles não são fáceis de achar. Veio sessenta pares do Yeezy para o Brasil. Eu paguei 1 199 reais e depois revendi por 4 000 reais. Com o dinheiro, comprei uma pochete da Prada por 4 300 reais. Ao todo tenho uns 100 tênis, desse total uns 30% a 40% são raros. O mais caro foi um Givenchy, saiu por 3800 reais. 

O que as pessoas mais falam é que não têm coragem de sair na rua como eu saio. Elas têm medo de usar o que realmente gostam. Tenho segurança e poucos vem fazer crítica comigo. Muitos chegam com olhar de admiração. Admiram porque é diferente. Eu gosto disso.”

Glossário do movimento “hype”:

Hypebeast = homem que se veste com itens raros e exclusivos da moda streetwear;

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Hypebae = mulheres que se vestem com itens raros e exclusivas da moda urbana;

Retail = preço pago de acordo com o sugerido pela loja;

Resale = preço pago de revenda, e pode ser até quatro vezes mais caro que o valor de retail;

Cop = a pessoa compraria o tênis;

Drop = a pessoa não compraria o exemplar (drop também pode significar lançamento de um modelo);

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Resellers = pessoas comuns que fazem estoques de tênis raros e acompanham a bolsa de valores dos itens para vender em determinado período;

Quicksale = venda rápida de algum item.

 

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