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Por Raul Juste Lores
Redator-chefe de Veja São Paulo, é autor do livro "São Paulo nas Alturas", sobre a Pauliceia dos anos 50. Ex-correspondente em Pequim, Nova York, Washington e Buenos Aires, escreve sobre urbanismo e arquitetura
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Jardim Lidiane: obra em marcha lentíssima no conjunto de cores vibrantes

Só metade dos 240 apartamentos foi entregue; reurbanização da área, que previa praça, telecentro, quadra poliesportiva e jardim arborizado não começou ainda

Por Raul Juste Lores Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 2 nov 2020, 16h27 - Publicado em 30 out 2020, 06h00

Da paleta de cores vibrantes, escolhida pelo artista João Nitsche, ao movimento da fachada, este conjunto habitacional na favela do Jardim Lidiane, na Zona Norte, tem mais arquitetura e graça que 99% dos condomínios chiques de Itaim e Moema. A moradia popular saiu da prancheta do badalado escritório Andrade Morettin, os mesmos arquitetos que fizeram o Instituto Moreira Salles (IMS), na Avenida Paulista. Ainda é uma demonstração de alta densidade em terrenos compactos sem recorrer à verticalização excessiva (tem apenas quatro andares).

Infelizmente, a obra começou em 2011 e só metade dos 240 apartamentos foi entregue. A reurbanização da área, que previa praça, telecentro, quadra poliesportiva (que pode servir como piscinão) e jardim arborizado, nem começou. Mais grave: os 23 boxes comerciais, prometidos para os pequenos comerciantes da favela que ocupavam aquela área (e morariam no conjunto), estão prontos, mas ainda estão lacrados. É pena que esse vexame moroso não tenha entrado no radar dos candidatos a prefeito.

O Jardim Lidiane é parte de um premiado programa da gestão Kassab que previa urbanizar 278 áreas de favelas, mantendo as comunidades nas mesmas localidades de origem, mas com saneamento básico, canalização de córregos, abertura de novas vias, áreas de lazer, e com a construção dos tais predinhos. Liderado pela arquiteta Bete França, promoveu um concurso de arquitetura que selecionou o quem é quem dos escritórios em alta à época, muitos que jamais tinham tido a oportunidade de projetar habitação social. Áreas de risco e a precariedade dos assentamentos foram os critérios prioritários.

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Mas como continuidade não é o forte da política brasileira, mesmo entre os autoproclamados “progressistas”, o programa foi desidratado pela gestão Haddad, que preferiu adotar o federal Minha Casa Minha Vida, o BNH da era petista, em que a preocupação com arquitetura e urbanismo era marginal. Em tese, o MCMV, por nivelar por muito baixo, produziria mais unidades e muito mais baratas que as feitas por bons arquitetos.

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Não aconteceu nem uma coisa nem outra. Haddad passou a pasta da Habitação ao PP, como culminação da sua famosa foto com Paulo Maluf e Lula, e entregou menos de 13 000 unidades em quatro anos (dado que costuma ser menosprezado pelos analistas políticos de Vila Madalena e Vila Buarque). Em dezembro de 2014, a gestão Haddad até prometeu licitações das obras em 22 favelas do programa original de Bete França, que não foram feitas. Os apartamentos do Lidiane, mesmo com o capricho dos Andrade Morettin, custaram 115 000 reais de então, o mesmo valor dos caixotões do MCMV.

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Com a diferença de que os residenciais petistas não seriam erguidos na mesma área dos beneficiários, provocando deslocamentos de famílias — e nem receberam espaços comerciais nos térreos, repetindo os guetos do BNH, onde serviços e comércio ficam distantes dos moradores.

Se o programa, chamado Renova SP, entrou em banho-maria-quase-parando com Haddad, não melhorou muito na gestão Doria-Covas. Por um curto período, até parecia que algo tinha mudado.

 

Cores vibrantes, ventilação e áreas comuns do conjunto Jardim Lidiane (Raul Juste Lores/Veja SP)

Como o Jardim Lidiane, vizinho à alça da Marginal Tietê com a Ponte Julio de Mesquita Neto, era um com as obras mais adiantadas antes da mudança de governo, faltava pouco para ser retomado. No fim de 2017, primeiro ano de gestão Doria, com Fernando Chucre como secretário de Habitação, foram entregues 50% das tais unidades coloridas, 120 apartamentos de 50 metros quadrados e dois quartos cada um. Com a chegada de Covas à prefeitura, houve mudança de titular na Habitação e, novamente, o projeto perdeu todo o fôlego (repetindo a gestão Haddad, não só no projeto do Anhangabaú…). É bom lembrar que só o orçamento da Câmara Municipal é 50% maior que o da Secretaria Municipal de Habitação

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Os moradores da metade finalizada dizem que, em dias ativos, três pedreiros são vistos no canteiro. Nas duas horas de uma quinta-feira em que estive lá, não vi um único operário (em véspera de eleição, só asfalto e recapeamento são velozes). Parecia feriado. Uma ironia melancólica é que boa parte dos moradores da favela, que mantém um belo centro de tradições nordestinas, trabalha na construção civil. Ou seja, o que não falta é pedreiro experiente por ali.

A morosidade custa em dobro para a prefeitura: o auxílio-aluguel para quem deixou a casa para permitir obras de reurbanização pela cidade toda custava 68 milhões de reais ao ano em 2012. No ano passado, foram 120 milhões com esse custeio. E vários parques lineares previstos continuam em alguma gaveta. A gestão DoriaCovas entregou apenas 13,5 mil unidades até setembro, repetindo a performance modesta de Haddad.

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Publicado em VEJA São Paulo de 04 de novembro de 2020, edição nº 2711

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