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Conheça as quatro últimas videolocadoras da capital paulista

Estabelecimentos com décadas de história mantêm viva a cultura da mídia física e exaltam o cinema de arte

Por Mattheus Goto
22 mar 2024, 06h00

Andar pelos corredores e perder-se entre as prateleiras apinhadas de fitas ou DVDs à procura do título perfeito. Essa experiência, que ficou no passado para muitos, ainda é realidade para uma parcela da população cinéfila paulistana. Quatro videolocadoras mantêm viva na capital a cultura da mídia física nos tempos dominados pelo streaming — uma no Centro, duas na Zona Sul e outra na Zona Leste. Elas são as únicas que sobreviveram às ondas da digitalização do audiovisual após os anos de ouro do segmento, entre as décadas de 70 e 80.

Visitar esses lugares tem algo de nostálgico, mas não se trata apenas de saudosismo. Clientes ainda encontram neles atributos inexistentes nas plataformas digitais. Tente buscar no streaming obras do diretor polonês Wojciech Has (1925-2000), admirado por grandes nomes como Martin Scorsese, por exemplo. A filmografia de Akira Kurosawa (1910-1998), um dos cineastas mais importantes do Japão, com mais de cinquenta títulos, tem meros dois representantes em serviços sob demanda (Ran, no Telecine, e Kagemusha, no Star+). Ou seja, para amantes de clássicos e filmes de arte, garimpar em acervos digitais, escassos nesse tipo de obra, pode ser frustrante.

Para acompanhar as mudanças de comportamento, o serviço de locação ficou mais flexível. Os preços para alugar um filme variam de 10 a 15 reais, mas há pacotes mais em conta para quem levar mais. A devolução também já não segue a rígida cartilha das diárias. Na Eject Video, na Vila Clementino, o prazo é combinado entre o proprietário Ricardo Luperi, 60, e o locatário. “A região é um paraíso, porque é perto de faculdades, hospitais. Sempre funcionou bem com esse público”, conta. “Um dia, entrou uma criança com os pais e falou: ‘Olha, é filme de verdade!’.”

Ricardo (em pé) e Lara: pai e filha tocam a Eject Video, na Vila Clementino
Ricardo (em pé) e Lara: pai e filha tocam a Eject Video, na Vila Clementino (Leo Martins/Veja SP)

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Outra vantagem apontada pelos entusiastas dos DVDs é o contato humano, a recomendação personalizada. “Tem gente que vem aqui só para conversar, nem aluga nada, eu fico feliz”, afirma Gilberto Petruche, 67, dono do Charada Clube, na Vila Tolstoi. “Indico filmes para quem gosta de ovo e para quem gosta de omelete.”

O mesmo acontece na Horus, em Mirandópolis, administrada por Valdirene Ramos, 54, e Roseli Carvalho, 57. “Quando uma pessoa chega na loja perguntando por um filme que não temos, saímos para procurar”, conta Valdirene. “No streaming, parece que nós somos algoritmos”, brinca Roseli. A renovação do acervo é uma das dificuldades que o setor enfrenta, já que não há mais grandes lançamentos de distribuidoras. Para conseguir novos títulos, os donos dependem de colecionadores, doações ou do mercado internacional.

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O público varia. Existem habitués, que frequentam desde os anos 80, mas na Video Connection, dentro do Edifício Copan, o que tem chamado atenção é a frequência jovem e com perfil mais cult. “Antigamente, o maior público era do próprio prédio. Agora, vem gente de Perdizes, Mooca, Tatuapé, e estudantes de cinema, como da Faap”, conta o proprietário Paulo Pereira, 67.

Uma das últimas videolocadoras: Horus, administrada por Valdirene (à esq.) e Roseli (à dir.)
Uma das últimas videolocadoras: Horus, administrada por Valdirene (à esq.) e Roseli (à dir.) (Leo Martins/Veja SP)

Nesses estabelecimentos, os filmes adultos andam em baixa, apesar de haver sempre uma pequena seção, numa estante escondida nos fundos ou em pastas que não ficam à mostra.

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O movimento, claro, não se compara ao de outrora. No Charada Clube, o recorde de locações foi de 880 em um único dia, em janeiro de 2001. Hoje, são cerca de 300 num mês inteiro. Para fechar a conta, os estabelecimentos recorrem a estratégias como a realização de feiras. O Charada organiza, há mais de dez anos, eventos de música gratuitos, que atraem o público para consumo no local. A principal fonte de renda da Video Connection tem sido o serviço de digitalização de fitas, enquanto a Horus também vende CDs, livros e incensos.

“Em 2012, quando muitas fecharam, achei que iria junto, mas dava dó pensar em me desfazer do acervo”, afirma Pereira. Petruche faz coro: “É uma resistência, porque no meu caso, aqui na periferia, é preciso resistir para continuar”.

Roteiro nostálgico

Onde ficam e o que encontrar nos últimos redutos cinéfilos

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Video Connection, no Copan
Video Connection, no Copan (Reinaldo Canato/Veja SP)

Video Connection
Avenida Ipiranga, 200, República
> Desde 1985, no Copan, oferece um variado acervo de 25 000 títulos que tem atraído um público jovem, formado por estudantes. Da lista, é a única que afirma ainda alugar VHS.

Charada Clube
Rua José Antônio Fontes, 62, Vila Tolstoi
> Aberta em 1995, é a mais distante do Centro e também a maior, com capacidade para receber eventos de até 300 pessoas. O acervo tem 12 000 DVDs e 3 000 VHS.

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Eject Video
Rua Dr. Bacelar, 324, Vila Clementino
> O acervo de 11 000 filmes contempla a obra de diretores de todo o mundo. Filha de Ricardo, Lara, 19, cresceu na locadora. Juntos, eles viajam para locais onde foram gravados seus favoritos.

Horus Videolocadora
Avenida Senador Casemiro da Rocha, 960, Mirandópolis
> Criada em 2009 por Valdirene (à esq.) e Roseli (à dir.), tem cerca de 5 000 títulos, focados em arte e cultura.

Publicado em VEJA São Paulo de 22 de março de 2024, edição nº 2885

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