Paulo Kotzent lança primeiro menu como titular do Santovino
Antes de se tornar chef de cozinha, Paulo Kotzent cursou arquitetura no Mackenzie. A culinária surgiu em sua vida depois de uma viagem a Roma de estudos. Começou a encarar o fogão na capital italiana e caiu de amores pelas receitas. Na volta ao Brasil, descobriu o curso de gastronomia da Anhembi Morumbi por sugestão […]
Antes de se tornar chef de cozinha, Paulo Kotzent cursou arquitetura no Mackenzie. A culinária surgiu em sua vida depois de uma viagem a Roma de estudos. Começou a encarar o fogão na capital italiana e caiu de amores pelas receitas. Na volta ao Brasil, descobriu o curso de gastronomia da Anhembi Morumbi por sugestão da irmã, Lilian, que estudava moda na mesma universidade. Antes de concluir a faculdade, começou a estagiar no extinto Supra (2002-2008), do qual se tornou subchef. No ano seguinte, se conquistou o posto chef do requisitado Piselli, que deixou no dia 31 de janeiro deste ano para ser titular cozinha do Santovino Ristorante.
Há pouco mais de um mês na casa, Kotzent lança o primeiro cardápio hoje.
Confira os detalhes na entrevista que fiz com ele e veja o glossário de termos de cozinha:
Como foi a criação do menu?
Quando eu e o Gustavo [Araújo, sócio e administrador do Santovino Ristorante] acertamos o novo conceito da casa, ele me pediu para fazer um menu italiano, com clássicos e pratos mais autorais, sem fugir da linha italiana. Adorei. Era o que eu queria ouvir, tanto que isso foi fundamental para a minha decisão em sair do Piselli. Disse a ele que não me prenderia a uma única região, pois gostaria, principalmente na parte mais autoral, de ter total independência com ingredientes e métodos de cozimento. A partir daí, foram noites e noites discutindo e até executando algumas receitas com meu braço direito no Santovino Ristorante (meu subchef, Caio Zakia, com quem trabalhei no Supra), para montarmos um menu. Optei por um cardápio enxuto, pois quero trabalhar apenas com produtos frescos e mudar alguns pratos, conforme a disponibilidade de ingredientes no mercado. No fim, ficou um pouco maior do que eu gostaria, mas ainda assim acredito que tenha ficado com a minha cara.
Quais regiões italianas você privilegiou?
Como disse antes, não me prendi a uma só. Faço baccalà mantecato, típico de Veneza, terra dos meus ancestrais italianos, como uma homenagem a eles, só não sirvo com a polenta cremosa. Troquei por crocantes com a polenta. Do Piemonte, aparecem alguns clássicos. Entre os exemplos estão o agnolotti dal plin e o brasato al vino rosso, além do uso de pasta de trufas na ausência das frescas trufas sazonais. O tartare di capesante uso ovas de ouriço, como na Puglia. Os carbonara sem creme de leite são meu orgulho, da época que morei em Roma. As olive all’ascolane são feitas conforme a receita da família dos meus primos que moram em Roma, no Lácio, mas nasceram no Marche. Fiz um leitãozinho inspirado nas terras fronteiriças com a Áustria, com ingredientes e combinações regionais. As bruschettas de cogumelos frescos são como as que comi em Florença, na Toscana. E por aí vai…
Quais são os mais clássicos e quais aqueles que têm uma linha mais autoral?
Dos mais clássicos posso citar o espaguete à carbonara, o brasato ao vinho tinto, o tagliolini aos frutos do mar e o vitello tonnato. Nesses caos, busco sempre utilizar os ingredientes legítimos para que os pratos sejam fiéis às receitas tradicionais. Dos mais autorais, o tartare di capesante e ricci di mare, a própria carne cruda foi revisitada, o baccalà mantecato, que recebeu uma apresentação e guarnições minhas, as codornas, os tortelli di costola di maiale, o leitãozinho, o tagliatelle ao bacalhau.
Quantos pratos são no total?
São 36, sem contar as sobremesas e as opções de entradinha para beliscar na varanda ou no bar. Não pretendo alongá-lo, pois assim fico livre também para sempre colocar novidades. Conforme a época do ano, pretendemos mudar 1/3 do menu para acompanhar as estações, a sazonalidade, etc. E acredito que menu enxuto dá para trabalhar com excelência de execução e qualidade da matéria-prima, estoque fresco.
Existe alguma receita que você recomende em especial?
Tenho muito orgulho dos pratos, inclusive dos clássicos, que desafiam a técnica e a receita à perfeição na execução. O baccalà mantecato é um deles. Desde que descobri minha paixão pela cozinha italiana eu sempre gostei da cucina veneta, para aprender mais sobre a cultura do lado italiano da minha família e este sempre foi dos meus pratos preferidos. Quando vou à Veneza, eu experimento em todos os restaurantes, suas versões. Tenho uma tia-avó nessa cidade que não aguenta mais eu pedir para ela fazer a receita dela quando apareço por lá. Na versão que incluirei no cardápio, quero dar uma apresentação. Na minha opinião, se tornou a mais bonita de todas as entradas.
Todas as massas são feitas no restaurante, inclusive as secas?
Apenas usamos três cortes industriais: espaguete, linguine e penne, pois não temos maquinário para produzi-los, ainda. São italianas, feitas com farinha de grão duro e de pastifícios pouco conhecidos, que não têm venda no varejo. As demais massas secas e recheadas são produzidas aqui, com farinhas italianas também, tanto a branca como a de sêmola. Também usamos ovos caipiras frescos, nada de corante ou gemas pasteurizadas.
O restaurante continua encomendando o molho de tomate como se fazia anteriormente no Santovino ou passou a prepará-lo no restaurante?
Desde o primeiro dia que pus os pés aqui, fiz questão de começar a fazer o molho de tomates. Tenho um cozinheiro responsável por todo o pré-preparo que cuida dos molhos de tomate como eles merecem. São poucas as massas que levam o molho de tomate na preparação, mas faço questão de fazê-lo. É a alma da cozinha italiana, o básico, tem de ser artesanal. Aliás, quase tudo que servimos no novo menu é produzido aqui. Ainda não tenho estrutura para fazer o pão italiano, mas temos o projeto de iniciar para o segundo semestre, uma vez que isso requer uma mudança estrutural nas cozinhas do restaurante. O que não conseguimos produzir, busquei parceria com pequenos produtores, como os queijos de cabra, por exemplo.
Glossário
Tartare di capesante e ricci di mare: em vez do salmão e do atum tão comuns em tartares servidos em restaurante da cidade, essa versão leva frutos do mar crus, entre eles vieiras. No tempero, entra gim junto do limão para fazer a marinada servida em uma taça de martini. O gergelim torrado e as ovas de mujol coroam o prato.
Carne cruda: reinterpretação do chef para o steak tartare à francesa. A carne é temperada com pasta de trufas e um toque de limão. Completam a mistura gelatina de caldo de carne, prepara da com um toque delicado de molho inglês, pepino em conserva e uma mousseline de gema de ovo caipira ao azeite extravirgem, que entra no lugar do ovo cru.
Baccalà mantecato: clássico creme feito de bacalhau e azeite extravirgem feito pelo cozinheiro com Gadus morrhua salgado em vez do peixe seco da receita original do Vêneto. No lugar da polenta cremosa, aparecem crocantes de polenta italiana bramata [moagem mais grossa dos grãos]. Há ainda um acréscimo de vegetais frescos (aspargo e tomate-cereja), lascas de azeitona preta e ovo de codorna cozidos, que remetem à bacalhoada portuguesa. Por cima, vão cubinhos de pancetta [aparentada do bacon] crocante.
Tortelli di costola di maiale: massa recheada de costelinha de porco. Se completa com um demi-glace [molho feito dos ossos do animal] e radicchio-roxo.
Tagliatelle al baccalà: aos fios de massa fresca de produção própria adiciona lascas de bacalhau Gadus morrhua salteada com alho poró e creme de leite reduzido com caldo de peixe. Na finalização, entram ovas de mujol espanholas e um ovo poché [depois de quebrado, cozido na água quente].
Codorna recheada: no interior da ave vai um mix de cogumelos frescos e secos e pancetta. Depois, ele é assada e servida sobre uma fina camada de molho de tomate freco na companhia de mandioquinha salteada, o que confere certa doçura ao prato.
Leitãozinho: a influência na preparação deste prato vem do norte e nordeste da Itália, de províncias como o Friuli, Venezia-Giulia e o Trentino Alto-Adige, que têm muita influência gastronômica do antigo império austro-húngaro. O porquinho assado vai à mesa com creme relativamente espesso de grão-de-bico com chucrute de repolho branco. É finalizado com coulis [tipo de molho de frutas e vegetais sem cozimento] de beterraba e o demi-glace de porco, além de brotos adocicados também de beterraba.
Clique nos links abaixo para conferir o novo cardápio do Santovino:
+ Entradas e pratos principais