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Rodrigo de Pádua: docinhos, timidez e os segredos de um caderno

Ele era um rapaz gentil, inteligente, reservado e produzia beijinhos caseiros. Fazia pouco tempo que família notou algo estranho com seu fascínio pela apresentadora Ana Hickmann

Por Daniel Bergamasco, de Juiz de Fora
Atualizado em 27 dez 2016, 17h36 - Publicado em 27 Maio 2016, 14h00

Rodrigo Augusto de Pádua tinha 30 anos, era fã da apresentadora Ana Hickmann e, no sábado (21), acabou morto após invadir o quarto do hotel onde ela estava em Belo Horizonte. É o que o Brasil sabe sobre o jovem de Juiz de Fora (cidade mineira de cerca de 500 000 habitantes a 272 quilômetros da capital), que levou sua paixão pelo ídolo a uma história com desfecho triste. Após ameaçar sob uma arma a estrela da Record e o casal de cunhados dela, Giovana e Gustavo, acabou acertando tiro na segunda e morrendo alvejado por dois tiros, pelas mãos do terceiro, com quem travou luta corporal.

A reportagem foi até sua cidade para saber mais sobre ele e o que pensam seus familiares sobre o caso. Leia abaixo:

– Para a mãe, Wanda, 74, e o pai, Hélio, 72, ele não seria capaz de matar. A irmã (única mulher entre os cinco irmãos, dos quais Rodrigo era o caçula) concorda. “Acho que ele queria a atenção, mas não atiraria”, diz. “Nós sentimos muito pelo que aconteceu e não desejamos o mal de ninguém. Queremos a recuperação da Giovana. Só quero limpar o nome do meu irmão, ele não era um assassino. E que sejam feitas todas as investigações, para que a tese de legítima defesa não seja automática. Se tivessem atirado na perna, imobilizado, meu irmão estaria aqui.” A polícia de Belo Horizonte analisa perícia e depoimentos para dar o desfecho ao caso.

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– “Reservado”, “gentil” e “Inteligente”. Na academia Fox Fitness, freqüentada por ele, são os termos mais usados para descrever Rodrigo. Ninguém ali sabia qualquer coisa sua vida pessoal, e os comentários eram superficiais – falava sobre o Flamengo (time pelo qual era fanático), a beleza das mulheres do pedaço (nunca de forma grosseira) e o noticiário. “Ele comentava umas coisas de câmbio do dólar, de política, uns assuntos que ninguém entendia direito”, conta Rony Cleverson Junior, que lhe passava as séries.

– Fazia cerca de três meses que Rodrigo Augusto de Pádua havia chamado com entusiasmo sua mãe, Wanda, à sala do apartamento onde viviam, na região central de Juiz de Fora. Apontou para a TV ligada no programa Hoje em Dia, da Record, ao qual não assistia diariamente: “A Ana Hickmann está usando o vestido amarelo que pedi para ela colocar”. Ele voltaria a mencionar o figurino no quarto do hotel Caesar Business, em Belo Horizonte, onde morreu após colocar apresentadora, o cunhado Gustavo e a mulher dele, Giovana, sob a mira de um revólver.

+ Ataque foi premeditado, diz polícia

– Dois detalhes em seu quarto, cuja janela dava de frente para uma avenida, indicam que o fascínio pode ter começado bem antes. Até então nunca visto pela família, o caderno no qual anotava os estudos de física (se preparava para o vestibular de medicina), com super-heróis na capa, trazia nas três últimas folhas declarações de amor a Ana Hickmann. “Bom dia princesa”, escreveu com canetinha em duas páginas, em ambas desenhando um coração flechado em vermelho. “Princesa” é como se referia à estrela. Em outra folha, anotava, em caneta hidrográfica: “A mulher mais bonita do mundo”, “Minha linda princesa” e uma data de mais de um ano atrás: “14/01/2015”.

– Ao vasculharem seus pertences no quarto, encontraram uma carta manuscrita assinada por “uma admiradora secreta”. No papel (com sinais de dobra, mas ainda não amarelado pelo tempo), há frases de aconselhamento pouco específicas, que podem sugerir conhecimento sobre sua paixão por Ana: “Não é Jesus que está colocando você nessa situação (…). Você é uma pessoa inteligente, recupere sua auto-estima, você é um rapaz muito bonito, não precisa de ninguém, só de Jesus (…) Não espere por ninguém.” Não há qualquer pista da remetente.

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– Se na internet seus posts apaixonados haviam se tornado obscenos, fora do mundo virtual o comportamento pouco mudou. No trato, seguia o mesmo: dócil e, apesar de tímido, sempre descontraído. Não cultivava outras amizades e deixou de jogar peladas eventuais após trocar de academia, no fim do ano passado. Os momentos de lazer se davam quase sempre na companhia do pai, Hélio, que ajudou a sustentar a família com sua fábrica de cocadas, e, especialmente, da mãe, a cabeleireira Wanda, de 74. O filho a enchia de beijos e abraços a todo momento.“Ele dizia que eu era o amor da vida dele e, quando morresse, ele iria junto comigo”, recorda. Iam a programas como pizzarias ou cinema.

– Rodrigo dormia cedo, por volta das 21h, e às 6h estava em pé para trabalhar. Fazia doces para vender, e nas formas perfeitas exercitava uma das características mais evidentes: ser extremamente detalhista. Eram beijinhos enrolados como bastões, no formato do chocolate Batom, vendidos a 15 reais a caixa com vinte, que recebiam o selo R & W (“Rodrigo e Wanda”). A mãe, mais despachada, tinha a função de acertar as encomendas com amigos e vizinhos e realizar as entregas. A atividade rendia, em média, 1 200 reais mensais.

+ Cunhado revela detalhes sobre o atentado

– Havia, porém, duas mudanças. Primeiramente, andava mais vaidoso. Começou a consumir whey protein e tomava há ao menos três meses o remédio contra acne Roacutan, a fim de eliminar cravos no nariz. A droga é conhecida pela possibilidade de efeitos colaterais sérios, como depressão (psiquiatras ouvidos pela reportagem, porém, descartam relação com o surto, pelo pouco tempo de uso). Passou ainda por uma cirurgia para eliminar o suor excessivo das mãos, disfunção que causa frequentemente isolamento social.

– Em paralelo, disse que se mudaria para São Paulo, por estar “cansado de Juiz de Fora”, segundo a mãe. Duas semanas atrás, tirou sua primeira carteira de trabalho, mas, segundo explicava, no início seguiria vendendo os doces. Usou a viagem para justificar a venda de boa parte de seus pertences pela internet: a cadeira com estofado de couro, o videogame Playstation (que andava meio fora de uso), a TV com tela plena e um notebook (manteve o computador de mesa). Suspeita-se que adquiriu a arma e a munição em uma favela da cidade, em uma noite na qual saiu a pretexto de comer um lanche e demorou mais que o de costume para volta.

– Na quarta-feira (18), alterou os planos: disse que iria passar uns dias em Belo Horizonte. Para os pais, fica claro, agora, que havia acabado de saber da presença de Ana Hickmann na capital. Na sexta, pediu à mãe, Wanda, que cortasse seu cabelo.

+ Ana Hickmann se emociona ao relembrar atentado

–  No dia seguinte, a irmã descobriu que ele não se hospedou na casa de Helisson, o irmão que vive na capital. Este demorou para localizá-lo ao celular. Ouviu que estava em um hotel longe de sua casa, e precisaria “resolver algumas coisas” antes de visitá-lo. Foi menos de uma hora antes da tragédia. Não demorou para que Helisson soubesse, por sua namorada, da notícia de um homem morto após invadir o quarto de hotel em que estava Ana Hickmann. Ao confirmar pessoalmente o desfecho, ligou para a irmã, que correu à casa dos pais e deu a notícia triste.

– Para os pais e irmãos, além da vontade de entender melhor a cabeça de Rodrigo e o que de fato aconteceu naquele quarto, ficou, claro, a tristeza e o inconformismo diante de uma história surreal. “Pensa no quanto um filho pode ser amoroso. O Rodrigo era muito mais”, diz o pai.

 (Colaborou Ulisses Campbell)

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