Bastidores do samba: quem afina os instrumentos para o grande dia?
Por trás das baterias de escolas, um requisitado ex-ritmista desfila para ajustar os instrumentos antes do Carnaval
O instrumento fala comigo e eu digo ‘calma, vou te ajudar a tocar’”, explica, todo romântico, o responsável pelas caixas, surdos e repiques que desfilam no Carnaval com as escolas de samba paulistanas. Há quase dez anos, é Eduardo Rocha, o Tio Edu, quem cuida da manutenção dessas peças para grupos como Acadêmicos do Tatuapé, Sociedade Rosas de Ouro e Unidos de Vila Maria.
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“A coisa é bem manual, algo que máquina nenhuma faz, e toda hora invento uma ferramenta nova para complementar o alicate, a chave e o meu martelo, que todo mundo chama de martelinho de ouro.”
Ritmista da Império de Casa Verde nos anos 1990, Eduardo investiu na profissão após ter sido contratado por Robson “Zoinho”, o mestre da casa. “Eu era o garoto chato que ficava atrás para saber como tudo funcionava, mas demorei para ter prática. Depois de trabalhar com prestação de contas por trinta anos, decidi fazer só o que gosto. Meu hobby virou profissão.”
Com o sócio Matheus Pinheiro, ele mantém a loja de instrumentos Redenção e comanda a DM Manutenções, que prepara adesivagens personalizadas para os aparatos carnavalescos e atende blocos, grupos de faculdade e times de futebol. O carro-chefe, no entanto, ainda é o serviço feito ao vivo nas principais escolas da capital.
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“Algumas nos pagam todo mês para ter esse suporte e outras me contratam perto do Carnaval, quando preciso visitar duas ou três vezes por semana para checar e ajustar tudo.” Fora de época, costuma cobrar mensalidades de cerca de 300 reais. “Poucos diretores de bateria botam a mão na massa, pagam para fazer e chegam no Anhembi bonitos, perfumados, de apito no peito”, brinca.
A equipe é pequena e inclui uma mãozinha do afilhado, para quem pretende passar o bastão dos negócios no futuro. “Eu sou chato, entendeu? Levei para trabalhar na loja comigo e claro que leva umas broncas, mas hoje algumas coisas ele faz melhor do que eu.”
Com a chegada dos desfiles em São Paulo, marcados para ocorrer até o dia 23 de abril, Eduardo tem a tarefa de deixar todas as baterias prontas — e a ansiedade das escolas transparece nas ligações em seu celular. “Apesar dos muitos compromissos, sou realizado e minha esposa me apoia, me acompanha e, assim que termino de arrumar tudo, digo ‘deixa eu ir que a delegada está de olho’”, diverte-se. “Perto dos desfiles, tem aqueles que já me ligam preocupados com qualquer coisinha. Agora estou com uma desculpa nova: minha agenda está lotada. E está mesmo.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 27 de abril de 2022, edição nº 2786