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Guru do momento, Prem Baba é autor de best-sellers e tem templo na Índia

O líder espiritual conquista simpatizantes como artistas, políticos e profissionais bem-sucedidos ao combinar meditação com mensagens de paz e amor

Por Débora Crivellaro
Atualizado em 29 jun 2018, 08h35 - Publicado em 29 jun 2018, 06h00

A aula de ioga acontecia em uma sala acanhada, no bairro do Imirim, na Zona Norte de São Paulo. Corria o ano de 1979 e, naquela manhã, Janderson Fernandes de Oliveira, então com 14 anos, se iniciava na prática com o objetivo de ganhar elasticidade para melhorar o desempenho no kung fu. Eis que o adolescente entrou em uma espécie de transe místico. “Uma voz falou dentro de mim: ‘Aos 33 anos, você irá para a cidade de Rishikesh, na Índia’.

Eu, um garoto com pouco dinheiro, de família nordestina e sem cultura global, logo esqueci o assunto”, conta. Dezenove anos depois, terapeuta com boa clientela, Janderson foi para a Índia em viagem de lua de mel. Ao se aproximar de Rishikesh, surgiu a lembrança da profecia. Começava a nascer ali Sri Prem Baba (em híndi, mistura de “auspicioso”, “amor divino” e “homem santo”), um líder espiritual que conquista cada vez mais discípulos e simpatizantes com um discurso palatável, transitando entre jovens de classe média e alta, profissionais bem-sucedidos e artistas.

Entoação de mantras na Awaken Love House, na Vila Mariana (Ricardo D'Angelo/Veja SP)

Suas mensagens, calcadas na filosofia hinduísta, trazem dois pilares: o autoconhecimento e a meditação. Segundo ele, as pessoas estão infelizes porque não encontraram o seu sentido da vida — e todos temos uma missão a cumprir. “O remédio para todos os males é o amor”, repete, como um mantra.

Tanta popularidade tem um preço. O guru, de 52 anos, recebe críticas por aparecer ao lado de políticos, a exemplo do ex-prefeito João Doria, da candidata à Presidência Marina Silva, do senador Aécio Neves e do vereador Eduardo Suplicy, entre muitos outros. “Sou apartidário”, argumenta. “O objetivo é dialogar com os representantes do povo sobre educação e meio ambiente.” Também não se furta a dividir os holofotes com celebridades. “Quero divulgar minha mensagem em escala”, explica. Entre seus simpatizantes estrelados aparecem os atores Reynaldo Gianecchini, Juliana Paes e Letícia Sabatella e a jornalista Gloria Maria.

Ratna: de advogada com síndrome de pânico a professora de meditação (Leo Martins/Veja SP)

O apresentador Marcio Garcia, que organizava grupos de meditação em sua casa, no Rio, foi uma das principais personalidades a introduzir o místico nesse meio. “Nós nos tornamos amigos e conversamos com frequência por WhatsApp”, conta o global. Na seara estrangeira, o mestre já teve contato com o ator Will Smith e o líder budista tibetano Dalai-Lama. Prem Baba detém um considerável latifúndio espiritual. Possui três ashrams, os templos de origem hindu. Um na Índia, em Rishikesh (o primeiro deles, de 2011), outro em Nazaré Paulista, no interior de São Paulo, e um terceiro em Alto Paraíso de Goiás, em Goiás.

No ano passado, por exemplo, 15 000 devotos de cinquenta nacionalidades passaram pelo cerrado durante os 45 dias nos quais Baba esteve por lá, ministrando palestras. Para ouvi-lo falar e usufruir a programação, que inclui ioga, meditação e canto de mantras, o visitante não paga nada. Se quiser se hospedar, desembolsa uma diária que varia de 125 a 210 reais. Para participar de um dos periódicos retiros de silêncio de treze dias, o interessado gasta 1 600 reais pelo pacote.

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Os domínios do paulistano se estendem ainda à badalada Awaken Love House, na Vila Mariana. Trata-se de um belo casarão onde rolam cursos, aulas e prática de terapias. Todas as sextas à noite, cerca de 170 discípulos lotam o local para entoar mantras durante duas horas. As palestras são um dos principais meios de comunicação do guru. Ele ministra uma média de 150 por ano, em diversos palcos, de eventos pela paz a shows, passando por fóruns de lideranças e até parque aquático.

Fabio Toreta: transformações, mas sem radicalismo (Leo Martins/Veja SP)

Afirma não cobrar pelas conferências, mas aceita doações voltadas à manutenção de seus projetos. As lições também são disseminadas nas redes sociais, onde o guia reúne mais de 600 000 seguidores. Diariamente, divulga ainda uma breve mensagem que é traduzida para dez idiomas, como hebraico e russo. Autor best-seller, tem quatro obras publicadas, com 200 000 cópias vendidas. Lançado em novembro de 2016 e o livro de maior sucesso, Propósito (Editora Sextante), síntese de sua pregação, está até hoje na lista de mais vendidos de VEJA.

Embaixador da meditação, Prem Baba virou adepto de um método próprio, concebido sob sua orientação por alguns de seus auxiliares próximos. Entre eles, aparece a professora Ratna. Há seis anos, ela era Giovanna Calandriello, uma promissora advogada que atuava no mercado de capitais. Então com 25 anos e bom salário, a jovem submergia em fins de semana regados a drogas e bebidas.

Foi diagnosticada com síndrome do pânico, e viu seus cabelos cair copiosamente. Observando o estado da filha, a mãe sugeriu um psiquiatra. Giovanna recusou o conselho e buscou um homeopata. Daí para a meditação foi um pulo. Viajou para a Índia para um período sabático e se encontrou no ashram de Prem Baba. “Mas resisti”, lembra Ratna. “Ir à Índia e escolher como líder um brasileiro é como viajar para os Estados Unidos e comprar Havaianas”, brinca.

Com Reynaldo Gianecchini: o ator é seguidor ativo (Divulgação/Veja SP)

Pediu demissão e raspou os cabelos, em um gesto de renovação. Hoje, tem uma marca de roupas de tecido indiano e é voluntária ativa do círculo do mestre. Em 2011, a então sócia de uma grande empresa de consultoria de gestão publicitária Patricia Ellen da Silva acabou conquistada assim que conheceu o guia na Índia. “Após seguir seus preceitos, nunca mais tive ansiedade, não fico sem meditação e cuido da alimentação”, comemora a empresária, com MBA de administração pública na Harvard.

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O executivo de marketing Fabio Toreta, de 38 anos, iniciou contato com o mestre em 2011, por meio dos cursos que unem psicologia e espiritualidade. “Mudei no meu trabalho, com a minha família, nos meus relacionamentos amorosos, mas nada radical”, conta. Do outro lado desse cenário de cura e redenção pessoal, há preocupações com os efeitos dos ensinamentos do guru.

Junto do Dalai-Lama, em 2004: encontro de líderes espirituais (Arquivo Pessoal/Veja SP)

Uma mãe que não quis se identificar viu sua filha, de 30 anos, abandonar o trabalho no mercado financeiro para morar em Alto Paraíso. “Ele prega uma filosofia muito simples, que uma criança de 12 anos poderia formular. É fraco, primário”, critica. Para ela, a filha e outros jovens de sua geração são atraídos pelas palavras de Baba porque se sentem massacrados pelo stress da vida urbana, com cobranças o tempo todo. Histórias de transformação são comuns nesse universo. O próprio Prem Baba é um exemplo de mudança radical.

Filho de pais adolescentes, Janderson foi criado pelos avós maternos, vindos de Pernambuco, na Zona Norte de São Paulo. “Conheci meu pai só aos 18 anos, apenas por curiosidade. Foi um contato único”, lembra. A grande referência se tornou a avó, a dona de casa Ana Maria da Silva — o avô, Pedro Correa, fazia serviços de manutenção em empresas. Muito religiosa, a senhora evangélica levava o neto para os cultos. Lá, diante de tantas perguntas não respondidas, o menino começou a ter o que chama de “fome de mistério”.

Percorreu vários caminhos: espiritismo, umbanda, budismo, ayahuasca… A busca não o impediu de mergulhar cedo na realidade. Começou a trabalhar como office boy aos 14 anos. Deixou a profissão aos 20, depois de várias promoções, para ser professor de ioga. Fez cursos de massagem, fitoterapia… Aos 30, estudou psicologia na Unip. Desenvolveu um método de sucesso em seu consultório na Vila Mariana, batizado de “caminho do coração”. Internamente, entretanto, estava mal. “Não via sentido na vida, apesar de ser bem sucedido.

Prem Baba em aula de meditação nos anos 80 (Arquivo Pessoal/Veja SP)

Sentia um aperto, um desencaixe.” Na época, deixou de acreditar em Deus, teve episódios de pânico e pensou em suicídio. Até que viajou para a Índia em 1998 e conheceu, aos proféticos 33 anos, o ashram de seu mestre espiritual, Sri Hans Raj Maharajji. Prem Baba herdou o templo do mentor, falecido em 2011, e começou sua trajetória em um espaço próprio. Apesar de ter se tornado um cidadão do mundo, o místico não cortou o cordão umbilical com o passado que o liga ao Janderson do Imirim.

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Os avós que o criaram já morreram, mas ele mantém contato com a mãe, a alagoana Maria Georgete da Silva, e com a irmã, Elaine Fernandes Juliare, quatro anos mais nova, moradora de Guarulhos. “Nós nos falamos por telefone e ele vem em casa”, conta a evangélica, fiel da Igreja Renascer em Cristo. “Ele tem um coração bom, nunca mudou. Prega aquilo que faz.” O líder ficou apenas um ano casado com a primeira esposa. Depois, trocou alianças outras duas vezes e afirma ter se tornado celibatário. Da terceira união, nasceu Nuyth Ananda de Oliveira, 14

A adolescente, que mora no bairro da Aclimação com a mãe, viaja bastante com o pai. Gosta da falta de rotina, que inclui aulas por Skype com um professor particular. “É a forma que tenho de ficar com ele”, diz. A garota tem apenas uma queixa: “Meu pai divide o amor com muita gente. Não é só para mim”. Prem Baba passa cerca de quatro meses na Índia e dois meses por ano em Alto Paraíso. No restante do tempo, visita centros que se desenvolvem baseados em seus ensinamentos.

Prem Baba: foto aos 9 anos (Arquivo Pessoal/Veja SP)

Entre uma viagem e outra, fica em São Paulo, onde tem um apartamento de 100 metros quadrados na Aclimação. Frequenta restaurantes, principalmente vegetarianos, como o Vila das Rosas, na Zona Oeste, e o Cheiro Verde, nos Jardins, e shoppings, como o Pátio Higienópolis. Nessas ocasiões, deixa de lado as túnicas e batas de cores claras para usar calça jeans, camiseta e tênis — a longa barba grisalha e os cabelos compridos encaracolados, entretanto, costumam entregá-lo. Periodicamente, ele se distrai com séries na Netflix. As últimas foram O Mecanismo e A História de Deus. Na medida do possível, faz caminhadas e cumpre uma série de exercícios orientado por uma personal trainer.

Sua marca registrada é a gargalhada. A cada frase solta umas duas, pelo menos. Tem fala calma, pausada. Os discursos, mesmo que às vezes monocórdicos, hipnotizam as plateias. Criticado, por exemplo, por permitir que os discípulos beijem seus pés e por demonstrar uma vaidade incompatível com o comportamento de um iogue, Prem Baba é também questionado por outros mestres hindus pelo fato de ser estrangeiro.

Prem Baba e sua filha Nuyth, de 14 anos (Reprodução Instagram/Veja SP)

Entretanto, segundo o professor especializado em novas religiões Silas Guerriero, do Departamento de Ciências da Religião da PUC-SP, o brasileiro não é diferente dos demais. “A prática do hinduísmo se dá a partir de um mestre espiritual e seus discípulos”, diz. O diferencial de Baba, de acordo com Guerriero, consiste em falar para os ocidentais, ao compor um discurso do amor incondicional, que mistura cristianismo, xamanismo, hinduísmo e outras sabedorias.

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Com essa mensagem, ele atrai os chamados “buscadores”, tipos muito comuns nos tempos atuais. “São pessoas que querem se libertar das amarras e buscam conhecimento espiritual”, explica. Em um ambiente hostil, a figura paternal de Baba e suas palavras de amor e paz fazem sentido para cada vez mais pessoas.

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