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A origem do crescimento do bairro

Paróquia São Geraldo, que abriga o sino da Independência, e o Mosteiro de Santa Teresa, que deu lugar à PUC, fazem parte de Perdizes

Por Renata D’Elia
Atualizado em 1 jun 2017, 18h36 - Publicado em 26 fev 2011, 00h48

Por volta de 1850, o vendedor de garapa Joaquim Alves Fidelis e sua mulher, Maria de Santa Rita, fixaram residência próximo às chácaras do Pacaembu, em uma área repleta de aves nativas. Em pouco tempo, o fundo do terreno passou a abrigar a criação de diversos exemplares de uma barulhenta espécie. O tal “quintal das Perdizes” chamava tanta atenção que os pássaros acabaram dando nome ao bairro, oficializado na planta da cidade em 1897. Enquanto lugares como Lapa e Barra Funda cresciam no ritmo da chegada das fábricas e linhas de trem entre o fim do século XIX e o início do XX, ali as várzeas, riachos e montanhas relutavam em dar espaço às primeiras ruas. A principal seria batizada como Tabor em homenagem a um monte bíblico, ganhando só posteriormente o nome definitivo de Cardoso de Almeida, deputado e chefe de polícia que vivia na região. 

No então Largo das Perdizes, a pequena Capela de Santa Cruz serviu para a celebração de missas entre 1881 e 1902. Demolida, deu lugar à Paróquia São Geraldo, aberta com arquitetura provisória em 1914. A construção atual é de 1932. “O Conde Francisco Matarazzo foi um dos maiores apoiadores e financiadores da obra”, afirma o pároco José Augusto Schramm Brasil. A igreja também guarda um tesouro histórico: o sino Bronze Velho, que anunciou a proclamação da Independência aos moradores da cidade. “A doação ocorreu durante a reforma da Catedral da Sé, após uma procissão que foi até o Anhangabaú, em 1942”, completa. Anos depois, o largo ganhou o nome do padre Péricles, o primeiro pároco da capela, hoje sepultado sob o altar principal. 

Parque da Água Branca - 2206a
Parque da Água Branca – 2206a ()

A década de 40 marcou o início do desenvolvimento. O bonde Perdizes 19 ligava o bairro à Praça do Correio, e os alunos dos colégios Batista Brasileiro, Santa Marcelina e Assis Pacheco costumavam se agarrar a seu para-choque traseiro, sob as constantes broncas dos motorneiros. Outra linha unia os largos das Perdizes e da Pompeia e se conectava com a Barra Funda.

Um dos usuários era o lendário goleiro palmeirense Oberdan Cattani, com suas mãos de gigante. Ele chegou à cidade em 1941, vindo de Sorocaba, para jogar no então Palestra Itália, sendo campeão paulista em quatro ocasiões. Acabou se casando dentro do próprio clube, em 1945. “Naquela época quase não havia carros e todo mundo pegava o bonde: ricos, pobres, jogadores de futebol e artistas”, diz ele, hoje com 91 anos. Ainda não havia calçamento nem sistema de água e esgoto. “Um dia eu reclamei com o governador Adhemar de Barros, que se deu conta do problema quando ficou com o carro atolado ao vir me visitar”, relembra. “Logo depois, ele mandou calçar as ruas do trecho da Rua Desembargador do Vale e canalizou o córrego que desembocava na Pompeia”, completa Oberdan.

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O empresário sírio Elias Abud, de 83 anos, frequentava as sessões do Cine Esmeralda, na Rua Traipu, inaugurado em 1947. “O cinema tinha capacidade para umas 1.600 pessoas na plateia e outras 600 no mezanino. Ainda assim, ficava uma fila enorme.” Nos anos 70, Abud comprou o imóvel e instalou ali a loja de tecidos Center Fabril. “Moradores e comerciantes das ruas Turiaçu e Cardoso de Almeida transformaram o local em ponto de encontro”, afirma. 

Paróquia São Geraldo - 2206a
Paróquia São Geraldo – 2206a ()

A Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) foi fundada em 1946, mas o câmpus da Rua Monte Alegre só surgiu em 1949, no antigo prédio do Mosteiro de Santa Teresa, habitado por freiras carmelitas desde 1923. Os velhos quartos deram lugar às salas de aula, e o terreno de 18.000 metros quadrados abrigou o crescimento da instituição. Funcionário do setor de recursos humanos da PUC há cinquenta anos, Jorge Eugênio Alves se mudou para Perdizes na década de 1960 e lembra com saudade das vias de terra e de paralelepípedos cercadas por pés de amora e bananeiras. “A Avenida Sumaré terminava num pântano e tinha um ribeirão. Para cruzá-lo, as pessoas passavam por cima de tábuas de madeira”, diz. “Ao longo dela, havia dois campinhos de futebol de várzea, onde os moradores se encontravam nos fins de semana para partidas de solteiros contra casados.” Na PUC existia um gramado que abrigava os “rachões” de alunos.

Em 1965, Alves esteve presente na inauguração do Tuca, teatro anexo à universidade, com a apresentação de “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Mello Neto e música de Chico Buarque. “Fui para lá emprestado para trabalhar na administração e acabei ficando até 1971”, afirma. Durante os anos mais duros da ditadura militar, entre 1968 e 1975, o teatro recebeu diversos espetáculos que desafiaram a censura, de músicos como Caetano Veloso e atores como Gianfrancesco Guarnieri. Os espetáculos de vanguarda atraíam os jovens, mas não apenas eles. “Vi muitas famílias tradicionais voltarem para assistir à mesma peça várias vezes”, conta Alves. Quase cinco décadas depois, a agitação estudantil do Tuca segue convivendo com a placidez das árvores plantadas nas ruas do bairro.

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