Plano de aterrar Pedreira do Dib e acabar com paredão gera protestos
Ponto de prática de esportes radicais, antigo local de mineração pode virar parque em processo que vai levar pelo menos dez anos e preocupa moradores
Rapel, escalada, slackline e palco de clipes de artistas como Ludmilla em um local de mineração desativado nos anos 1970. Localizada em Mairiporã, a Pedreira do Dib se tornou um ponto turístico e foi usada por décadas para a prática de esportes radicais, mas, desde abril, está fechada. O lugar é privado e pode entrar em obras em breve. O motivo: o aterramento do lago formado ali, usado pela população da cidade e turistas para lazer, e o enterramento de 74 dos 114 metros de altura do paredão do local, onde são praticadas modalidades esportivas. O objetivo, segundo os proprietários, é a recuperação ambiental da antiga cava de minério e a construção de um parque. Os moradores temem consequências ambientais e problemas estruturais nas casas da região.
Marco Antônio Gonçalves, o Jota, trabalha com turismo e frequenta a Pedreira desde 2013. “Seria uma grande perda para os esportes de aventura em São Paulo.” Presidente da ONG Inclusão Radical, William Bezerra, que tem um projeto voltado para a prática de rapel com deficientes, diz que o local se tornou escola de escaladores. “Vamos perder grande parte das vias de rapel (por ali).”
A Pedreira é utilizada também para ensaios fotográficos de casamentos, como o do engenheiro civil Guilherme Gomes com a publicitária Karine Bonfim. “Eu me encantei muito com o lugar”, afirma Karine. “Não tem outro local perto da capital com aquele cenário”, comenta o videomaker Henri Hideki.
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Os novos planos, no entanto, podem ou não sair do papel. O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) instaurou um inquérito em 2012 que investiga por que a área não passou por recuperação ambiental após o encerramento da Pedreira: o aterramento da cava de mineração para a construção de um parque foi a solução apresentada pelos proprietários, a empresa Portal da Cantareira.
Caso o projeto deslanche, por dez anos, quarenta caminhões devem circular diariamente pela região, para despejar 1,5 milhão de metros cúbicos de terra. A empresa conseguiu autorizações da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e da Fundação Florestal. Ao fim, um parque com quadras poliesportivas, quiosques, playground, área de escalada e um centro de recuperação de animais silvestres estão previstos para o endereço. Serão plantadas mais de 1 400 mudas no local, que tem 40 000 metros quadrados, duas vezes o Parque Buenos Aires. “Será uma área segura, ali não existe tela de proteção, banheiros. Já ocorreram acidentes”, diz João Aguiar, dono da empresa Destino Ambiental, que toca as obras.
“(Autorizamos) a intervenção na Área de Proteção de Mananciais Alto Juquery”, informa a Cetesb, em nota conjunta com a Fundação Florestal.
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“Se eles despejam terra contaminada, as consequências podem ser catastróficas”, afirma a advogada ambiental Bruna Tamassia, que auxilia os moradores contrários ao projeto. Segundo um parecer técnico do Centro de Apoio Operacional à Execução (Caex), braço do Ministério Público, o lago que pode ser aterrado conta com cursos de água que afloram dentro da antiga cava de mineração. Essas nascentes, segundo o Caex, são provenientes do lençol freático que forma o Reservatório Paiva Castro, do Sistema Cantareira, que abastece 8 milhões de pessoas na Grande São Paulo. “Não existem nascentes ali, temos um laudo que diz isso. Toda terra que será posta (no aterramento) virá de doação, solo natural, com certificado de origem e destino, é muito controlado”, afirma João Aguiar. Segundo a Cetesb, a formação do lago é fruto da “ocorrência de chuvas e da ação do lençol freático elevado. Portanto, trata-se de um lago artificial”.
“Essa movimentação (dos caminhões) vai abalar a estrutura das moradias”, diz a presidente da associação de moradores do bairro Cachoeira, Luana Chumen. “E toda a emissão de carbono que vai ter com esses veículos, para uma recuperação ambiental? Qual o sentido?”, questiona a presidente da Associação da Vila Renascença, Carla Domingos. Existem três bairros com cerca de 500 casas ao redor da Pedreira.
“A obra está paralisada pelo impasse com a prefeitura. Eu preciso do alvará (municipal) apenas para o parque. O empreendimento vai acontecer”, diz João Aguiar. “É um patrimônio natural que vai se perder. Se depender de mim, não vai acontecer”, responde Walid Ali Hamid, o Aladim (PSDB), prefeito de Mairiporã. “Eles precisam de cinco alvarás da prefeitura, que ainda não têm, e tentaram começar sem, por isso embargamos a obra”, afirma o procurador-geral do município, Edison Pavão. A empresa tenta o direito de iniciar o aterramento sem a anuência municipal por meio de um mandado de segurança: de acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo, “não há previsão” para a decisão sobre o pedido.
Procurado, o MP-SP afirma que o projeto apresentado contempla o retorno às “condições originais de topografia e vegetação no local”. Diz, no entanto, que a assessoria técnica do MP apresentou observações de ordem técnica e “preocupações” sobre o impacto que será causado. O MP solicitou manifestação da Fundação Florestal sobre as consequências ambientais, já que a Pedreira é vizinha, por exemplo, do Parque Estadual da Cantareira. “A vinda desses elementos será necessária para a avaliação do encaminhamento da investigação”, finaliza o órgão.
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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de junho de 2021, edição nº 2744