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“Minha equipe se entediaria no campo”, diz Otavio Zarvos

Dono de incorporadora escreve sobre plano da XP de sair da cidade e de empresas estenderem o home office

Por Otavio Zarvos
Atualizado em 27 Maio 2024, 17h58 - Publicado em 26 jun 2020, 06h00
Caixotões envidraçados sem atividade no térreo ou na calçada: a deficiência faria limer (Diego Grandi/Getty Images/Divulgação)
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Como atuo no mercado imobiliário através da minha incorporadora Idea!Zarvos, muitos amigos têm me perguntado sobre as mudanças que teremos nos prédios em virtude da pandemia.

Já ouvi várias ideias para os prédios residenciais. Terraços maiores para fazer um churrasco com os amigos, obedecendo uma distância segura; espaço para um escritório fechado, inclusive para sr. e sra., pois ambos podem precisar fazer uma reunião remota ao mesmo tempo; sala de crianças à prova de som, para que elas não atrapalhem o trabalho dos pais; áreas de serviço com sistema de desinfecção, para que os empregados possam vir trabalhar mesmo durante a quarentena; uma grande despensa gourmet, para não precisar ficar na fila do Santa Luzia… e tantos outros itens que o criativo mercado imobiliário vai inventar.

Os prédios de escritórios, por sua vez, vão ficar vazios, pois os chefes descobriram que trabalhar da praia ou do sítio é muito melhor. Até mesmo os funcionários que estão se apertando em casa e fazendo intermináveis reuniões pelo Zoom, com as crianças gritando ao lado, têm tido tempo de dar uma corrida até a pequena varanda (para aqueles que não a fecharam antes da pandemia para virar sala de jantar) no fim do dia e tirar uma foto do pôr do sol e postar no Instagram.

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Brincadeiras à parte, o que realmente me preocupa é como a nossa cidade vai sair desta quarentena, e com qual sequela.

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Na minha opinião, a cidade de São Paulo vivia seu melhor momento em muito anos. Tínhamos uma nova geração de pessoas ocupando os espaços públicos antes ociosos e aproveitando o que São Paulo tem de melhor: a possibilidade do encontro!!

Foi essa mistura de pessoas de todas as raças, origens e condição social que fez a cidade se tornar um caldeirão mágico que transforma sonhos em realidades. São incontáveis os casos de pessoas que aqui nasceram ou chegaram trazendo ideias, conhecimento e muita vontade de vencer, e que, ao se encontrarem pela cidade, acenderam essa faísca que tornou São Paulo uma cidade de prosperidade inquestionável.

Entre tantos que venceram aqui, temos o exemplo recente de uma empresa incrível do mercado financeiro, que se tornou uma referência em seu segmento: a XP Investimentos!

Na semana passada, a empresa que inovou no mercado de ações anunciou que pretende se mudar para alguma cidade do interior do estado e mudar radicalmente o seu modo de trabalho. A ideia, simplificando, seria manter uma base menor aqui e levar o seu pessoal para trabalhar em um ambiente mais arejado, longe da confusão de São Paulo, e promover, assim, uma melhor qualidade de vida para seus funcionários.

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Apesar de toda a inovação da XP no seu negócio, urbanisticamente esta não é uma ideia nova. Na verdade, se perguntarmos para dez urbanistas, provavelmente nove vão condenar essa mudança, pregando que são as grandes cidades os polos de atração para as pessoas que vivem no campo, e não o contrário, como planeja fazer a XP.

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Edifício João Moura
Edifício João Moura, em Pinheiros, da Zarvos: corporativo com terraços (F.BIZ/Divulgação)

Mas por que então, não apenas a XP, tantas pessoas têm pensado em oficializar o home office rural ou litorâneo quando passar a pandemia?

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Se a cidade as oprimia tanto, por que, ao menos aquelas que sempre puderam, não fizeram isso antes? As casas de praia e os condomínios de luxo no campo já estavam lá, mas ficavam muitas vezes vazios, mesmo nos fins de semana.

Sim, estamos falando de uma parcela mínima de pessoas que sempre puderam sair da confusão da cidade, arejar a cabeça no fim de semana e voltar na segunda-feira com a energia renovada.

Eu mesmo sou uma dessas pessoas. Tenho passado a quarentena com as minhas filhas entre a praia e o campo, e hoje penso que, apesar de sempre ter tido essa possibilidade, nem sempre eu conseguia: minhas filhas tinham uma centena de programas incríveis na cidade, que eu nunca consegui entender muito bem. Mas elas trocavam o pôr do sol no mar pela festa da prima do amigo do namorado, ou então o canto do passarinho de manhã no sítio pela exposição de fotografia de grafites na Vila Madalena. Ou qualquer outra coisa que eu não entendo como pode ser mais interessante do que sentir o cheiro da grama molhada, ou outros chavões poéticos atualmente presentes nos posts de Instagram daqueles que puderam passar a quarentena no conforto bucólico e que agora se questionam: por que não estender essa maravilhosa sensação para sempre e também para todos os meus funcionários?

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Na minha opinião, é justamente esse pensamento totalmente fora da realidade que levou a nossa cidade ao caos urbano que vivemos hoje, com uma pequena parte vivendo num oásis e a grande maioria tendo de atravessar o Saara para conseguir comer no dia seguinte. Minha geração e as mais velhas usaram a cidade para prosperar nos negócios, comprar sua casa no campo e resolver seu problema, mas pouco fizeram para tornar São Paulo menos hostil para a imensa massa de gente que não pode sair daqui no fim de semana.

A cada dez anos, quando voltamos a discutir o plano diretor da cidade, continuamos a não enxergar a grande maioria da população, que não pode estar nas reuniões de discussão ou audiências públicas porque tem de fazer o jantar dos filhos e tentar dormir quatro horas antes de pegar o ônibus no dia seguinte e ir trabalhar na parte boa da cidade, onde estão os melhores empregos.

Vamos aproveitar o tempo extra que nós privilegiados temos tido durante a quarentena para pensar em como fazer para que esta cidade tão incrível, e que permite que empresas como a XP e tantas outras apareçam e prosperem, seja também acolhedora para a maior parte da população. Agora, se mesmo tudo isso não lhe convencer, saiba que, apesar de nós, a cidade estava renascendo e não vai morrer, no máximo vai ficar um tempo no respirador, mas vai sair ainda mais forte, e vai atrair mais jovens, que são na verdade o grande motor que move tudo isso.

Além de tentar fazer com que os prédios da Idea!Zarvos melhorem a cidade para todos, eu não vou levar a minha equipe para trabalhar no campo. Conheço meus funcionários, assim como conheço minhas filhas, e sei que eles vão se entediar depois que o galo cantar três vezes, pois vão querer encontrar mais jovens como eles e trocar ideias sobre como fazer coisas complicadas ficar mais simples, da mesma forma que fizeram essas novas e incríveis empresas como a Nubank, QuintoAndar, XP e tantas outras que estão mudando a cidade… para melhor!!!

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Otavio Zarvos
(Fernando Moraes/Divulgação)

Otavio Zarvos: empresário e administrador de empresas, é sócio-fundador da incorporadora Idea!Zarvos

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 1º de julho de 2020, edição nº 2693. 

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