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On-line ou off?

Por Matthew Shirts
Atualizado em 5 dez 2016, 14h57 - Publicado em 4 abr 2014, 17h30

Quando apareceu o Facebook, abracei-o com um entusiasmo maior até do que o do meu saudoso pai. Era ele o maior novidadeiro da família até então. Excêntrico, aderiu ao livro eletrônico tão logo saiu a geringonça. Fazia sua caminhada diária pela pequena cidade praieira de Del Mar, no sul da Califórnia, lendo e-books no primeiro Kindle da Amazon. Vestia um chapéu grande, quase um sombreiro mexicano, e óculos de sol. Era uma figura. Gravava podcasts, ainda na pré-história do gênero, quando ninguém fazia ideia do que se tratava, e os ouvia à noite, antes de dormir, com fones de ouvido, no seu iPod, outro aparelho vanguardeiro para a época, pelo menos na sua faixa etária.

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Mas mesmo meu pai tinha restrições quanto ao Facebook. Preocupava-se, como quase todo o mundo, com sua privacidade. Não sabia se fazia sentido entregar tantas informações pessoais a uma empresa da internet. Fui eu já mais atirado. Fascinei-me pelo formato de compartilhamento. Resolvi viver a experiência on-line em sua plenitude. Joguei os games. Respondia os questionários. Descobri que, se fosse bicho pré-histórico, seria um mamute, aquelas coisas. Assinalei, sempre que solicitado, todos os programas de televisão e filmes a que havia assistido ao longo da vida, os livros lidos e os artistas favoritos, dando de uma a cinco estrelinhas para cada um.

Quis saber se o computador seria capaz de me conhecer, tal como acontece com o ator Joaquim Phoenix no filme Ela.

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O Facebook não demorou para perceber que passara eu a vida entre o Brasil e os Estados Unidos. Pede a minha opinião sobre programas de televisão americanos da minha infância na Califórnia durante as décadas de 60 e 70 e sobre novelas brasileiras a partir dos anos 80, quando vim para cá. Sugere novas amizades, tanto de lá como daqui. Pergunta quais são minhas revistas prediletas. Nossa amizade parecia caminhar bem até que, sem sequer abordar o assunto comigo, o Facebook resolve que sou gay. Não chegou a dizer isso. Mas começou a me oferecer pacotes turísticos destinados a casais de homens, livros sobre o assunto, serviços de namoro com outros caras. Nada tenho contra o homossexualismo. Nadinha mesmo. Mas me senti ofendido. Depois de responder a tantas perguntas e digitar tantas informações, como é que o Facebook poderia cometer uma gafe dessas?

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Fui para o Twitter, outra rede social, menos íntima. Essa foi minha primeira reação. Mas depois comecei a refletir. Será que o Facebook sabia de algo que eu ainda não percebera? Os computadores são, afinal, muito poderosos nos dias de hoje. E eu lhe dera muitas informações inúteis, afinal. Mas concluí que não. Não chegara a esse ponto. Eu ainda sabia mais da minha própria sexualidade do que um programa de computador. Poderia ser uma piada, no entanto. Será que o Facebook tirara um sarro da minha cara? Não era impossível, concluí. E caíra eu como um pato. Tudo o que queria era contar a história para o meu pai. Ele ainda possui um perfil na rede. Mas não adianta. Tem coisas que os computadores ainda não aprenderam a fazer. Quem sabe no futuro?

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matthew@abril.com.br

 

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