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O império do topázio

Encontrada numa única mina brasileira, em Ouro Preto, a pedra com tons que vão do amarelo ao cereja sobe na cotação dos joalheiros

Por Adriana Marmo, de Ouro Preto
Atualizado em 1 jun 2017, 18h24 - Publicado em 18 nov 2011, 23h50

Rodrigo Silva é um distrito minúsculo cravado nas montanhas de Ouro Preto, em Minas Gerais. À beira da Rodovia dos Inconfidentes, a 100 quilômetros da capital Belo Horizonte, as casas coloniais servem de testemunha da época em que o local viveu da mineração do ouro. Desativada há décadas, a estação de trem do século XIX, de onde escoava o minério, continua no centro da vida do lugar. Ali se apresenta a banda da cidade, que disputa com o time de futebol amador a chance de entreter os habitantes nas horas de lazer. Quatro quilômetros adiante da estação, seguindo por uma estrada de terra, três homens cavam rochas macias em busca da pedra preciosa da vez: o topázio imperial.


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Rodrigo Silva é a única região do planeta a produzir a gema cujas cores, dizem os locais, lembram o pôr do sol de outono: vão do amarelo, passando por laranja, rosa, lilás, ao chamado vermelho cereja do colar à esquerda. Azuis, verdes, cinzas e transparentes não entram na categoria “imperial”. São “simplesmente” topázios, encontrados em lugares tão diversos quanto o estado americano do Texas e a Austrália. “A raridade e a variação de tonalidades tornam o topázio imperial requisitado”, diz o joalheiro italiano Michele della Valle. Ele é expert em pedras coloridas — a Bulgari, conhecida pelas joias das cores do arco-íris, requisita sua avaliação — e percorre o mundo atrás de exemplares excepcionais. “Eu encaro a gema como uma alternativa para quem já tem diamantes, esmeraldas e águas-marinhas e procura algo novo.”

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Descoberto por volta de 1760, o topázio imperial existe apenas num perímetro de 150 quilômetros quadrados — o equivalente à superfície do Pantanal Mato-Grossense ou ao total de área das Ilhas Virgens Britânicas — nos arredores de Ouro Preto. Paquistão e Rússia, os antigos concorrentes do Brasil, não produzem mais desde a década de 70. Nessa área montanhosa de Minas Gerais, no entanto, todas as minas da época do império estão desativadas. Apenas uma está aberta: Capão do Lana. É nessa lavra que os tais três homens removem, a céu aberto e a unha, a argila cortada por uma retroescavadeira. Ao fim de um dia de trabalho, 80 quilates de topázio imperial (o equivalente a 16 gramas de gema bruta) terão passado por uma peneira gigante e pelo crivo de um único par de olhos que separa a joia do pedregulho. Essa quantidade representa 15% do total que vinha sendo extraído desde 1979, quando a lavra do Capão do Lana ganhou do governo a concessão para ser explorada por concessionários.

A razão dessa extração irrisória não está ligada à escassez natural do minério — a previsão é que a mina continue produzindo por mais duas décadas. Os sócios detentores do direito de exploração do Capão do Lana brigaram depois de quase três décadas no negócio. Em dezembro de 2009, o desentendimento entre eles provocou o fechamento do local. Por iniciativa de um antigo funcionário, ela voltou à ativa um ano e meio atrás com um grupo de vinte trabalhadores. “São poucas pessoas e poucos quilates para o potencial da região, mas o que vale é que vendemos mais de 70% do que foi recolhido nesse período”, diz o engenheiro de minas Vicente Alves. Atual arrendatário, ele trabalha na mina há trinta anos e acaba de voltar de uma viagem de negócios pela França e pela Suíça. Em Paris, apresentou as pedras aos joalheiros da Praça Vendôme, que concentra grifes do quilate de Boucheron, Mauboussin e Chaumet. “Só posso dizer que conquistei novos clientes”, afirma Alves.

Anel Topázio Luxo 2244a
Anel Topázio Luxo 2244a ()

Os operários movimentam por dia 160 metros cúbicos de material em busca da gema bruta. A cada 2 metros cúbicos, em geral, é obtido 1 quilate de topázio imperial lapidável, cujo preço pode variar de 5 dólares a 2.000 dólares (o diamante branco de boa qualidade pode custar 3.500 dólares o quilate). Só esse detalhe já rende a ele um dos quatro elementos que determinam o valor de uma pedra no mercado: a raridade. “A produção controlada torna o topázio imperial ainda mais cobiçado: quanto menos se extrai, menos pedras circulam no mercado, mas por um período maior”, explica Hécliton Santini Henriques, presidente do Instituto Brasileiro de Gemas & Metais Preciosos (IBGM).

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Os outros três fatores são tamanho, lapidação e cor. O vermelho-cereja — tom da pedra de 16,27 quilates do colar H.Stern que abre esta reportagem — é o mais raro. Seu preço vai de 33 dólares a 2.000 dólares o quilate. Já o rosa e o salmão variam entre 2 dólares e 1.400 dólares. “O topázio imperial tem uma coloração muito feminina”, diz Christian Hallot, embaixador da H.Stern, uma das primeiras empresas a levar as pedras brasileiras ao exterior. A H.Stern mantém em cofre uma reserva dessas gemas lapidadas — em especial das variações vermelhas e alaranjadas, menos comuns — pronta para virar joias únicas. Não raro, sob encomenda. “Há pedras expecionais cuja cor varia do rosa nas extremidades ao vermelho ou amarelo no centro. É isso que as deixa ainda mais sedutoras.” A gama de tons quentes faz com que as designers Carla Amorim, de Brasília, e Emar Batalha, de Vitória, por exemplo, prefiram incrustar o topázio imperial em ouro amarelo ou rosa nas peças das novas coleções, fazendo um jogo de tom sobre tom.

Brinco Topázio Luxo 2244a
Brinco Topázio Luxo 2244a ()

O paulistano Ara Vartanian propõe o oposto: um anel com topázio vermelho, diamantes ferrugem e ouro branco e amarelo, num choque total de cores. A francesa Cartier e a carioca Amsterdam Sauer optaram pelo meio-termo: contrastar a pedra principal com pavê de diamantes e ouro, ambos brancos. É o que faz saltar ainda mais o amarelo cor de folha seca das gemas ao lado — cada qual com 22 quilates —, da Cartier, e a pedra ovalada rosa do anel da Amsterdam Sauer. “A estrangeira já incorporou o topázio imperial, e agora a brasileira começa a descobri-la”, diz o gemólogo Dino Psomopoulos, da marca carioca. As joalherias inventam moda para que a pedra volte a ocupar seu lugar de origem: as caixinhas de joias mais nobres do Brasil. Veio de dom Pedro I o aval às pedras originais da então Vila Rica, quando ganhou exemplares numa visita à região mineira em 1881. Reza a lenda que o adjetivo “imperial” teria vindo daí (embora os russos creditem o nome ao apreço dos imperadores de lá pelos topázios “czaristas”). Se isso acontecer, o Brasil será — na mina do Capão do Lana e nos melhores salões — o império do topázio.

 

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