Laerte lança ‘Muchacha’, novo livro inspirado na década de 50
Composta por tiras publicadas na Folha de S. Paulo, obra tem enredo centrado no personagem Capitão Tigre
![Laerte 2179 - 2](https://vejasp.abril.com.br/wp-content/uploads/2016/11/8113_muchachaalta-49-roginho-frata-s-conflicted-copy-2010-08-20.jpeg?quality=70&strip=info&w=1024&h=720&crop=1)
Muitos dos que atravessaram a adolescência na segunda metade da década de 80 foram marcados por uma talentosa geração de cartunistas surgida a partir de revistas e fanzines alternativos, mais tarde cooptada pelos jornais diários. Um trio sobressaiu no período, unido sob a alcunha Los 3 Amigos: Angeli, Glauco (1957-2010) e Laerte. Mais cultuado do grupo, o paulistano Laerte Coutinho criou, ao longo da carreira, uma série de personagens que chamavam atenção pelo modo inusitado de viver o cotidiano. Entre eles estão, por exemplo, os Piratas do Tietê, saqueadores que navegam pelo rio imundo, o atrapalhado herói Overman, um casal de gatos ninfomaníacos e até um Deus envolvido com problemas bastante humanos. Agora, o cartunista de 59 anos lança pela Quadrinhos na Cia., selo de HQs da editora Companhia das Letras, um novo trabalho, o folhetim gráfico ‘Muchacha’ (96 páginas, 29,90 reais), previsto para chegar às livrarias na primeira semana de setembro.
Formado por tiras publicadas aos sábados no jornal ‘Folha de S. Paulo’, ‘Muchacha’ é um mergulho na cultura dos anos 50, sobretudo a das então imberbes atrações de aventura da televisão. O enredo se passa nos bastidores do programa do carismático Capitão Tigre e abarca ainda o jornalismo sensacionalista da época, brinca com a tensão política provocada pela Guerra Fria e revela uma misteriosa cantora, a Muchacha do título. Devido à pegada folhetinesca da obra, marcam presença romance, vinganças, sequestros e traições. Trata-se também de uma maneira de o autor passear pelas lembranças dos tempos de menino, expediente iniciado no trabalho anterior, ‘Laertevisão — Coisas que Não Esqueci’. “Muita coisa veio da memória de programas como ‘Falcão Negro’, até porque os jovens não conhecem a trajetória da TV Tupi nem das radionovelas”, diz.
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Foi incluída como epílogo da edição uma trama complementar desenhada pelo filho de Laerte, Rafael Coutinho, promessa dos quadrinhos. Ao lado do escritor gaúcho Daniel Galera, Rafael publicou recentemente o romance gráfico ‘Cachalote’, elogiado pela crítica. “Enlouqueci com o livro. Rafa desenha melhor do que eu”, comenta o pai coruja. “Ele não consegue ser imparcial, não teria futuro nenhum como crítico”, brinca o filho. “De todo modo, sempre mostro tudo para meu pai primeiro.”
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‘Muchacha’ traz o cartunista de volta a roteiros mais convencionais e lineares. Para desgosto de vários fãs, Laerte transformou radicalmente o estilo das tiras diárias há alguns anos. Personagens queridos foram abandonados em favor de uma abordagem filosófica nem sempre — ou quase nunca — baseada no humor. Um dos motivos da virada foi a morte do filho Diogo em um acidente de carro, em 2005. Aos poucos, porém, parte do público habituou-se à nova fase, experimental, mas nem por isso menos brilhante. “Eu me sinto navegando solto ao desenhar, sem bússola, posso ir para qualquer direção”, afirma. “Minha intenção não é mais fazer piada, e sim evocar sensações, ideias. Acho saudável dar um choque no leitor, estimular certa confusão.” Embora no momento dê assessoria ao diretor Otto Guerra para a realização de um longa-metragem de animação, Laerte diz que está com poucos projetos para o futuro. Continua arrasado com o brutal assassinato do velho amigo Glauco, morto em março. “Não sara nunca.”