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Em nova fase, Butantan terá fábrica de R$ 300 milhões e Parque da Ciência

Instituto vai aumentar sua capacidade de produção de vacinas, além de reabrir e ampliar os espaços educativos e de lazer em projeto ousado

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2024, 22h15 - Publicado em 25 mar 2022, 06h00
Imagem mostra dois homens e uma mulher vestindo jalecos segurando uma cobra.
O biólogo Giuseppe Puorto (no centro), dois auxiliares e uma jararaca: 1 milhão de extrações de venenos. (Alexandre Battibugli/Veja SP)
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Antes da pandemia, caso você perguntasse a alguém o que vinha à cabeça quando falasse em Instituto Butantan, a resposta, provavelmente, seria “cobra”, em razão de sua referência na produção de soros contra picada de animais peçonhentos, não só serpentes, mas também aranhas e escorpiões.

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Nos últimos dois anos, a resposta possivelmente seria outra: “Vacina”. Agora, projetando um futuro relativamente próximo, o Instituto Butantan, criado em 1901 com o propósito de produzir o soro antipestoso (contra a peste bubônica que assolava o litoral paulista), vai expandir seus horizontes de pesquisa, entretenimento e fabril.

Com um investimento de cerca de 300 milhões de reais, a instituição terminou em janeiro a obra civil do Centro Multipropósito para Produção de Vacinas (CMPV), um prédio de três pavimentos com outro menor anexo, onde serão fabricados a versão nacional da chinesa CoronaVac e outros sete imunizantes, entre eles contra hepatite, HPV e raiva.

São Paulo 21 março 2022Instituto ButantanFoto Alexandre Battibugli VSP
Prédio que ficou pronto em janeiro: vacinas só a partir do fim do ano. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

“É uma planta de grande porte,de 11 000 metros quadrados, multipropósito, em que poderemos produzir diferentes vacinas em um mesmo espaço, o que antes não ocorria, pois as plantas eram sempre dedicadas e desenhadas para fazer apenas um produto”, afirma o diretor-presidente do Butantan, Dimas Covas. “Hoje fabricamos entre 220 e 230 milhões de doses de vacinas de vários tipos por ano. Com a nova fábrica, vamos aumentar a produção em 20%.”

Um dos principais diferenciais da nova fábrica, na comparação com as antigas instalações do instituto, é o nível de automação. Sem necessidade de toques humanos em parte dos processos, o resultado é mais eficiente e rastreável. Outra questão é que os laboratórios serão de nível 3, ou seja, geram proteção muito maior em relação aos vírus.

Duas imagens. À esquerdam um tijolo e duas garrafas antigas de vidro, verdes. À direita, um homem com equipamento de segurança em andaime trabalhando em parede com afrescos.
Restauro e descoberta: afrescos e objetos escondidos sob assoalho serão vistos no prédio da biblioteca. (Instituto Butantan/Divulgação)
Duas imagens. À esquerdam um tijolo e duas garrafas antigas de vidro, verdes. À direita, um homem com equipamento de segurança em andaime trabalhando em parede com afrescos.
Restauro e descoberta: afrescos e objetos escondidos sob assoalho serão vistos no prédio da biblioteca. (Instituto Butantan/Divulgação)

Embora esteja pronto, o edifício ainda recebe os equipamentos que serão instalados e precisarão ser certificados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A previsão é que somente no fim do ano as primeiras vacinas sejam fabricadas por ali, contrariando a expectativa do governador João Doria, que previa inaugurar o espaço completo (e não pela metade, como programou para esta sexta-feira, 25), antes de deixar o cargo para concorrer à Presidência da República, no início de abril.

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Para levantar dois terços do valor investido na fábrica, o Butantan contou com doações de mais de trinta grandes empresas, como iFood, Magalu, Ambev, entre outras, cujo chamamento foi capitaneado pelo governador em parceria com a Comunitas.

Além da nova fábrica, outra frente do Instituto Butantan tem o objetivo de aumentar a frequência de pessoas que poderão visitar os espaços educativos e de lazer, fechados há dois anos. Com 750 000 metros quadrados, o tamanho do Parque Villa-Lobos, o terreno abriga doze prédios históricos, alguns deles transformados em museus, ampla área verde, várias ruas e alamedas e vai ganhar um Parque da Ciência, com café, restaurante, um boulevard e uma praça.

Imagem mostra espelho d'água entre corredor de árvores.
Boulevard: de uma ponta a outra são cerca de 200 metros, cercados por pés de café, espelho d’água e área para eventos. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Por ano, antes da pandemia, cerca de 300 000 pessoas visitavam o local, e a meta é chegar a 1 milhão de visitantes todos os anos. Eles se juntarão aos 3 380 funcionários, que dão vida ao espaço, principalmente na hora do almoço. A expectativa é que os portões sejam abertos ainda no primeiro semestre, e os ingressos custarão entre 2,50 reais (estudantes) e 6 reais (adultos). Crianças até 7 anos e idosos com mais de 60 anos não pagam.

Os bilhetes são necessários apenas para os espaços fechados (cada entrada dará direito a visitar todos os museus). Para entrar nas áreas livres não é necessário pagar. Entre as obras mais esperadas está a do prédio central, o da biblioteca, um dos mais importantes, que passa por uma restauração e deverá ser entregue até o fim do ano.

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Imagem mostra texto com dados do Instituto Butantan.
(Reprodução/Veja SP)

Durante os primeiros trabalhos, a equipe encontrou, ao remover uma parte do teto, uma série de afrescos, que estão sendo restaurados e ficarão livres de tintas. Embaixo dos pisos, uma ampola do início do século XIX, uma garrafa de vinho e tijolos antigos também foram localizados e serão expostos.

Duas imagens. À esquerdam um tijolo e duas garrafas antigas de vidro, verdes. À direita, um homem com equipamento de segurança em andaime trabalhando em parede com afrescos.
Restauro e descoberta: afrescos e objetos escondidos sob assoalho serão vistos no prédio da biblioteca. (Instituto Butantan/Divulgação)

Outro espaço revitalizado é o horto, um grande jardim que lembra um miniparque Trianon e possui unidades arbóreas nativas da Mata Atlântica e animais no entorno, como macaquinhos, tucanos, jacus, corujas, gambás e teiús. Ali, uma pequena e antiga casinha foi restaurada e vai receber cursos e exposições para a criançada.

No espaço, há também um jardim sensorial, onde os visitantes podem extrair pequenos pedaços dos vegetais para sentir o aroma e a textura. Outra atração do espaço é anunciada como a maior flor do mundo. Chamada cientificamente de Titan arum, a planta passa dos 2 metros de altura e morre um dia depois de desabrochar.

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Imagem mostra jardim com diversas plantas. Um totem verde escrito
Jardim sensorial: no local será possível extrair pedaços de plantas para ser sentidas. Uma delas é comestível e se chama peixinho. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

A ideia da direção do futuro Parque da Ciência é abrir visitações à noite a alguns locais para que os expectadores possam ver de perto alguns animais com hábitos noturnos. Entre as instalações que também fazem parte do complexo do instituto, o centenário Museu Biológico, que foi reformado e abriga os animais favoritos dos visitantes, as cobras.

Imagem mostra jardim com plantas e vasos.
O Jardim dos Sentidos. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Entre as inofensivas jiboias e a enorme sucuri, que dormia em seu gigante aquário, há espécies altamente venenosas, como a jararaca-ilhoa, uma das mais temidas do mundo e que vive na Ilha da Queimada Grande, entre Itanhaém e Peruíbe, conhecida como Ilha das Cobras.

Sem a presença de répteis de verdade, mas com mosaicos deles no chão (em muitos há falta de ladrilho), a recém-inaugurada Praça Vital Brasil está (quase) novinha em folha. Ao fim do “tapete”, cercado por um belo jardim de rosas e por imagens antigas, há um banco com uma estátua do médico Vital Brazil Mineiro da Campanha, o primeiro diretor do Instituto Butantan.

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Imagem mostra chão de azulejos com desenhos de cobras. Ao fundo, um banco com uma estátua de bronze.
Praça Vital Brazil: uma passarela em mosaico leva a um banco e à estátua do fundador do Instituto Butantan. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Foi Vital Brazil quem criou, em 1912, um serpentário que está desativado, mas que será reaberto nos próximos três meses. Ali perto, um recém-inaugurado boulevard tem cerca de 200 metros de extensão e possui um espelho-d’água, e ao lado há uma espécie de praça com arquibancada que poderá receber eventos ao ar livre. Do lado esquerdo do espaço a paisagem é marcada por pés de café que começam a dar frutos nesta época do ano.

Imagem mostra banco com estátua de bronze de homem sentado, segurando um livro.
A estátua do fundador do instituto. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Outros espaços reformados e revitalizados, como a Casa Rosada, vão abrigar o futuro Museu da Vacina. “As pessoas não fazem ideia das doenças que foram erradicadas nas últimas décadas por meio das vacinas. Aqui elas vão saber que aquela marquinha que muitos têm no braço foram por causa do método com que os mais antigos enfermeiros aplicavam a vacina contra a varíola. Eles faziam uma escoriação na pele para o medicamento entrar direto em contato. Hoje não se usa mais isso, mas a vacina, claro, continua sendo importante”, afirma o diretor do Museu Biológico e futuro diretor do Parque da Ciência, Giuseppe Puorto, 68, 51 deles vividos no Butantan.

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“Entrei como estagiário nível colegial e nunca mais saí”, afirma o biólogo, que nasceu na Itália, vive no Brasil desde os 9 meses de idade e diz ter extraído venenos de cobras mais de 1 milhão de vezes. “Meu recorde diário foram 400”, relembra, não se esquecendo da quantidade de vezes em que foi traído pelo animal peçonhento: quinze, das quais precisou de medicamento em duas.

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Imagem mostra construção de paredes amareladas, telhado de tijolos e diversas janelas e portas marrons.
Casa Rosada: imóvel foi restaurado e vai abrigar o Museu da Vacina. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Perto da Casa Rosada, o subsolo de uma antiga cocheira vai receber a Mosquitoca, com a exposição de centenas de espécies de mosquito. O espaço foi descoberto durante um trabalho de restauro e será adaptado para receber os novos eminúsculos moradores. Para a chegada deles, um antigo laboratório precisará ser realocado em um das dezenas de edificações novas e antigas do pedaço.

Com poucos passos é possível chegar ao macacário, espaço de exposição de animais que não são mais usados em pesquisas. Os testes eram feitos neles pela semelhança com o organismo do ser humano. Mesmo assim, a instituição optou por manter a reprodução das espécies, em vez de acabar com o local assim que os animais fossem morrendo em decorrência da idade.

Imagem mostra corredor com diversos pilares de tijolos.
Pilares e os mosquitos: ao lado das estruturas de tijolos que seguram a edificação ficará um mosquitário. (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Ao mesmo tempo que se prepara para receber seus primeiros visitantes depois de dois anos e trabalha para começar a produção de vacinas no novo prédio industrial, o instituto quer aumentar seu portfólio com a recém-inaugurada fábrica de anticorpos monoclonais e chegar ao mercado de terapias contra o câncer.

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“Hoje, esses medicamentos são alguns dos maiores custos do Sistema Único de Saúde (SUS). São tratamentos de 200 000 reais, 300 000 reais, que são pagos após judicializações de demandas individuais. O Butantan vai conseguir produzir e entregar ao SUS por preço bem menor e com a nossa qualidade”, explica Cintia Lucci, diretora de projetos estratégicos da Fundação Butantan.

“O instituto atua desde antes da criação da Anvisa e quer, em um futuro bem próximo, expandir seu mercado e falar com as “Anvisas” de outros países, como a FDA (nos Estados Unidos). Vamos internacionalizar a instituição.”

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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de março de 2022, edição nº 2782

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