Campos de várzea sofrem com falta de estrutura e precariedade
Espaços cedidos pela prefeitura ao futebol amador têm problemas como baixa manutenção
Quando foi inaugurado, em 2008, o campo de futebol de várzea da Chácara do Conde, no extremo da Zona Sul da cidade, recebeu a visita do atual presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), que deu o chute inicial de uma partida festiva. Uma década e três Copas do Mundo depois, a área municipal, uma das primeiras a receber grama sintética, tem tapetes que estão descolando, além de alambrados retorcidos e esburacados. A iluminação dos refletores funcionou no dia da estreia, graças a um gerador, e nunca mais.
O local é um dos 259 chamados Clubes da Comunidade (CDC) da cidade, que contam com equipamentos como campo, vestiário, arquibancada e aparelhos de ginástica. Voltados para times amadores (são mais de 2 500 em São Paulo) e projetos sociais, esses terrenos são cedidos pela prefeitura, mas sua gestão e manutenção são privadas.
Tudo é feito com base em verba de emendas parlamentares, captação junto a empresas e receitas obtidas com eventos e outras atrações. Seus diretores, eleitos a cada dois anos, precisam deixar tudo em ordem, sob pena de perder a concessão do uso. Cabe à prefeitura a fiscalização das estruturas.
Na semana passada, VEJA SÃO PAULO visitou 28 campos municipais. Metade deles apresentava problemas de manutenção. Parte do cenário de degradação se deve à crise financeira, que afastou a ajuda de empresários. Além disso, em 2017, vereadores destinaram, por meio de emendas parlamentares, 8,5 milhões de reais para CDCs de acordo com a escolha pessoal — o que pode causar desequilíbrio, beneficiando uns e não outros —, 20% a menos do que no ano anterior.
No Jardim Iporanga, na Zona Sul, por exemplo, 300 jovens de uma escolinha convivem com o descolamento do gramado artificial e com equipamentos e materiais insuficientes. “Temos seis restos de bola e três jogos de uniforme emprestados”, lamenta o voluntário Magno Mendes. Na Vila Brasilândia, na Zona Norte, a denominação pomposa do Athletic Center Maradona, com piso de terra, esconde uma estrutura deficitária. Único espaço coberto do local, o vestiário se resume a uma casinha com dois chuveiros e dois vasos sanitários.
No último dia 21, o ambiente cheirava mal e não havia água para a descarga. “Infelizmente, não recebemos nenhum tipo de ajuda”, lamenta Edilson Diniz, conhecido como Maradona. Em nota, a Secretaria Municipal de Esportes afirma que realizou recentemente um recadastramento desses lugares e fará em breve uma vistoria nos endereços.
Outras estruturas da prefeitura que contam com campos amadores, como os Centros Educacionais e Esportivos (CEEs) — equipamentos maiores, com piscinas e outros atrativos —, também enfrentam dificuldades. Na Vila Alpina, na Zona Leste, os frequentadores do clube Arthur Friedenreich viram o campo principal ser literalmente soterrado pelas obras de um Centro Educacional Unificado (CEU), paradas há quase dois anos. “Perdemos o gramado e não ganhamos o CEU”, reclama um zelador informal do lugar.
Ele apara o pouco de grama que sobrou de um espaço secundário aproveitado por seis times da região. Segundo a prefeitura, as obras pararam no fim da gestão Fernando Haddad e não há prazo para retomar os trabalhos. Outro imbróglio, que ameaçou os gramados de várzea no Campo de Marte, na Casa Verde, se vê praticamente resolvido.
No ano passado, a Aeronáutica, que manteve por décadas um litígio com a prefeitura sobre a posse do terreno de 2 milhões de metros quadrados (para efeito de comparação, o Parque do Ibirapuera tem 1,5 milhão de metros quadrados), assinou um acordo com o então prefeito João Doria para a construção de um parque. Decidiu-se que os campos serão mudados de lugar.
O problema é a quantidade: hoje há seis deles, gerenciados por meia dúzia de times, mas no novo local determinado cabem apenas quatro. “A saída é a gente se unir e definir quando cada um joga”, afirma Mauro Rodrigues, do Pitangueira Futebol Clube, fundado em 1938. “É só não inventarem de pôr grama sintética, pois várzea que é várzea é na terra ou na grama de verdade”, defende Rodrigues, que calcula um público de 5 000 pessoas por fim de semana no Campo de Marte.