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Câmara aprova fim da taxa de inspeção e ameaça Controlar

Veículos novos também estão isentos do programa que, para o prefeito Fernando Haddad, era um "papa-níqueis"

Por Maurício Xavier [colaboraram João Batista Jr. e Julia Gouveia]
Atualizado em 1 jun 2017, 17h47 - Publicado em 22 mar 2013, 18h40

Na semana passada, a Câmara Municipal deu fim a uma iniciativa cheia de boas intenções, mas que acabou manchada por acusações de irregularidades e muita polêmica. Depois de cinco anos de vigência, o programa de inspeção veicular na capital sofreu mudanças substanciais, motivadas por um projeto do prefeito Fernando Haddad. As mais importantes são a liberação da vistoria para os carros com até três anos de uso e a realização do teste bianual para aqueles com até dez anos, o que será implementado apenas em 2014: em 2013, o programa segue obrigatório para toda a frota. Outras alterações envolvem a inclusão de veículos com placas de fora de São Paulo, a possibilidade de outras empresas serem habilitadas a realizar o serviço no futuro (hoje a Controlar possui um contrato de exclusividade) e a extinção da cobrança da taxa de inspeção — serão tarifados apenas os veículos que forem reprovados no exame. Os detalhes para a aplicação das novas regras serão anunciados nos próximos dois meses.

Mudar a lei sobre o assunto era uma das principais promessas do novo prefeito. Já durante a campanha eleitoral, no segundo semestre de 2012, ele garantia que daria fim à cobrança da tarifa. A novidade mais recente, apresentada somente às vésperas da segunda votação na Câmara, na semana passada, envolveu a isenção dos veículos mais novos. Um projeto de autoria do vereador Gilberto Natalini (PV) e apresentado como alternativa ia em direção totalmente oposta: além de manter a obrigatoriedade para toda a frota, ampliava o número de vistorias anuais para alguns veículos considerados mais poluentes. Essa proposta acabou engavetada e a lei do Executivo foi aprovada sem emendas. “Não teve negociação ou discussão, a decisão nos foi empurrada goela abaixo”, diz o parlamentar. Na segunda (18), Haddad também anunciou a abertura de três processos administrativos contra a Controlar, cujo objetivo principal é encerrar o atual contrato de exclusividade com a empresa e permitir a entrada de outros interessados na realização do serviço, algo que está previsto no novo texto da lei.

Secretário do Verde Ricardo Teixeira em audiência na Câmara
Secretário do Verde Ricardo Teixeira em audiência na Câmara ()

Consórcio formado por três empresas, a Controlar nasceu em 1995 com o objetivo de vencer uma licitação do governo Paulo Maluf. Levou a melhor, mas o então prefeito não implantou a inspeção veicular. Em 2007, Gilberto Kassab queria trazer para a sua gestão a bandeira ecologicamente correta e decidiu pôr em vigor a vistoria. No primeiro ano de atividade, a Controlar arrecadou 177.453 reais com as taxas de inspeção. Esse valor teve um salto quase inacreditável: passou para 142,8 milhões de reais em 2012. Em cinco anos, foram vistoriados 10,8 milhões de veículos. “Temos hoje um contrato que vale até 2018”, diz o presidente Harald Peter Zwetkoff. “Se a prefeitura quiser encerrá-lo antes da hora, existe uma legislação que assegura uma indenização.” Sem revelar qual seria o montante da multa, ele afirma que a empresa investiu 200 milhões de reais na criação dos dezesseis centros de avaliação, sistema de call center e capacitação de mecânicos. “Fora isso, vai provocar uma insegurança no mercado, porque será a primeira vez que um consórcio terá contrato quebrado.”

Caminhão na Avenida Salim Farah Maluf
Caminhão na Avenida Salim Farah Maluf ()
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A Controlar acendeu o sinal de alerta para Kassab. Uma parte do baixo índice de popularidade no fim de seu mandato se deve aos processos a que ele responde por causa da empresa. Em novembro de 2011, o Ministério Público Estadual acusou Kassab, o secretário Eduardo Jorge, da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, e a Controlar de uma fraude de 1,1 bilhão de reais. Segundo o órgão, o contrato firmado entre a prefeitura e o consórcio tinha uma série de irregularidades. Uma delas envolve o prazo de dez anos de duração do acordo. A Controlar contabiliza como data de início o ano de 2008, quando o serviço começou a ser executado. De acordo com o MP, o que vale é o momento da assinatura (1996). Com base nesse e em outros supostos problemas, o MP pediu em 2011 o afastamento de Kassab do cargo, o bloqueio de seus bens e a suspensão do contrato da Controlar. O então prefeito apresentou sua defesa, e o MP, até hoje, não declarou se aceitará as justificativas ou dará continuidade à ação.

Trânsito da Cidade do México
Trânsito da Cidade do México ()

Apesar da polêmica em torno do acordo com a companhia, especialistas apontam alguns avanços importantes obtidos com o programa. Em levantamentos realizados pelo Laboratório de Poluição Atmosférica da Faculdade de Medicina da USP, estima-se que só a inspeção nos veículos a diesel, em 2011, representou uma diminuição de 28% de material tóxico lançado no ar. Como a poluição é um catalisador de doenças cardiorrespiratórias, essa redução na emissão equivaleria a 584 mortes evitadas.

Nos Estados Unidos e em muitos países da Europa, a verificação obrigatória começou na década de 60. A Cidade do México se tornou um exemplo no combate à poluição. Em 1992, a metrópole tinha um dos ares mais irrespiráveis do mundo. O governo, então, elaborou planos para reverter o quadro: inspeção veicular a cada seis meses e rodízios em dois dias úteis por semana, o que provocou uma boa redução nos índices de poluição na capital mexicana. Em São Paulo, a prefeitura defende a tese de que a nova regra não significa um retrocesso na política, e sim um ajuste necessário no programa. “O que havia por aqui era um papa-níqueis, e nós acabamos com ele”, afirma Fernando Haddad. “Por trás disso existia apenas a vontade de criar privilégios para uma empresa.”

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