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Escolas renovam a grade curricular com aulas de YouTube, negócios e ioga

As novidades. implantadas nos ensinos fundamental e médio de escolas particulares da capital, atendem às exigências do Ministério da Educação

Por Fernanda Bassette
Atualizado em 7 fev 2020, 15h33 - Publicado em 7 fev 2020, 06h00

Empreendedorismo, ioga, produção e edição de vídeo e até desenvolvimento de um creme hidratante são apenas algumas das novas habilidades que serão trabalhadas com alunos dos ensinos fundamental e médio das principais escolas particulares de São Paulo a partir deste ano letivo. As novidades fazem parte de uma adequação às exigências da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), promulgada em dezembro de 2017. O foco principal é a formação integral de um aluno com capacidade de tomar decisões, trabalhar em equipe e resolver problemas com autonomia e autoconhecimento. Por trás de todas as aulas que fogem do formato da lousa e giz, está também uma tentativa de prender a atenção dos mais jovens. “Essas disciplinas promovem um saber mais aplicado à realidade, fortalecem a formação do aluno e o ajudam a se colocar no mercado de trabalho”, defende a educadora Lilian Neves, autora de Gestão da Transformação Educacional. “O objetivo é promover um aprendizado com significado.”

No Colégio Bandeirantes, na Vila Mariana, por exemplo, os estudantes do ensino médio terão aula de cosmetologia — isso mesmo, vão criar um produto cosmético. A escolha do tema não surgiu ao acaso. Foi pensada justamente para atender a uma demanda dos jovens por saber mais sobre a indústria da beleza, uma das que mais crescem no mundo. Em sala, serão trabalhados conhecimentos de química, física, biologia, geografia e história, além de marketing e design. “Vamos criar um creme hidratante e a partir dele abordar questões de pH do produto, viscosidade, estabilidade, textura, essência, cor. Também vamos pensar na embalagem e nas estratégias de venda. Tudo com base na interdisciplinaridade”, diz Carolina Zambrana, professora de química da escola.

aula culinaria Escola Pueri Domus
Escola Pueri Domus: gastronomia (Alexandre Battibugli/Veja SP)

De olho nas plataformas digitais, a Escola Pueri Domus, com unidades na Chácara Santo Antônio, na Aclimação, no Itaim e em Perdizes, pôs à disposição dos estudantes uma série de disciplinas eletivas ligadas ao chamado “letramento digital”, como design de games e DJ. Na matéria de YouTube, serão ministrados conceitos de programação, filmagem e edição de vídeo para usar nas diversas plataformas. Nas atividades realizadas dentro de um laboratório audiovisual completo, porém, a meta não é formar youtubers ou influenciadores digitais. “Todos têm um celular com câmera nas mãos. Vamos ensiná-los a usar o recurso de maneira mais competente e profissional”, explica a diretora-geral Lady Christina Sabadell, que destaca a possibilidade de a garotada treinar habilidades em diferentes linguagens. Também estreiam neste ano as aulas na cozinha para as crianças do ensino fundamental. A estratégia é ensinar a composição dos alimentos, o reaproveitamento, a produção de sucos, o desenvolvimento do paladar e conceitos de gastronomia. “É um trabalho muito mais de consciência do que de aprender a cozinhar”, explica Lady.

Uma das maiores preocupações das escolas é formar cidadãos empreendedores, especialmente preocupados em contribuir para um mundo mais sustentável, e que saibam cuidar das próprias finanças. No Colégio Visconde de Porto Seguro, no Morumbi, a disciplina de educação financeira passa a compor obrigatoriamente a grade de 2020. Meninas e meninos vão trabalhar quatro eixos — ganhar, gastar, investir e doar — para saber como arrecadar fundos, desenvolver planilhas, conhecer taxas de mercado, investimentos, lidar com o dinheiro virtual. Em outra disciplina, “escola de negócios”, uma situação problema deverá dar origem a um projeto para apresentar uma solução para a empresa. Com o objetivo de tornar as dinâmicas mais práticas, a escola fez uma parceria com cerca de quarenta empresas de diferentes ramos que abasteceram os professores de situações do dia a dia.

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Ainda pensando no empreendedorismo aliado à sustentabilidade, os matriculados no Colégio Dante Alighieri, nos Jardins, poderão cursar uma disciplina chamada “sustentabilidade, projetos ao redor do mundo”. Segundo Sandra Tonidandel, diretora pedagógica, os alunos vão abordar a questão ambiental sob o pon- to de vista da produção de arte. Uma das aulas terá como inspiração o artista plástico brasileiro Vik Muniz e suas ações com catadores de lixo. No caso, vão reutilizar tampas de todo tipo de embalagem plástica. “É sustentabilidade não apenas como ciência, mas como obra de arte através do lixo”, explica.

Colégio Dante Alighieri
Sustentabilidade sob o ponto de vista da arte: obra de Vik Muniz inspirou o Colégio Dante Alighieri (Rogério Pallatta/Veja SP)

Na contramão da tecnologia, o Colégio Presbiteriano Mackenzie, em Higienópolis, vai investir na pesquisa de documentos em livros e acervos, sem o uso da internet. Com o mantra “Máscara na cara e cara na poeira”, o professor Gabriel Neves, coordenador do curso de história, pretende estimular o aluno com o encantamento gerado pelo acesso real a itens históricos. Ainda que os recursos digitais sejam abordados, o ponto alto da aula será a utilização de documentos impressos para fazer refletir. Visitas a alguns acervos também estão previstas. “Quando formos falar da República Velha e da Revolta da Vacina (motim popular ocorrido no Rio de Janeiro em 1904 por causa da obrigatoriedade da vacina contra varíola), por exemplo, vamos mostrar o documento com a lei editada na época para que os alunos entendam a mentalidade daquele período.”

Estão no radar ainda momentos lúdicos e de autoconhecimento. Na Escola Móbile, na Vila Nova Conceição, a disciplina voltada para estudantes de ensino médio recebeu o nome de “corpo e movimento”. Jogos e brincadeiras (que não demandem uso da internet) entram em cena para que o aluno se desligue da rotina escolar e consiga relaxar, especialmente em um período de stress por causa do vestibular. “O 3o ano é um período muito intenso na vida desse jovem. Queremos que ele ‘desligue’ por sessenta minutos, aprenda a respirar, a se concentrar, a brincar. Isso vai formar uma pessoa mais confiante”, avalia Wilton Ormundo, diretor do ensino médio. Outra disciplina da Móbile é “impressões e expressões”. Temas que parecem abstratos como os conceitos de eu, outro, presente e futuro ajudam a trabalhar a empatia e o diálogo. Na hora da avaliação, o aluno escolherá a forma de se expressar, de acordo com suas aptidões. Pode ser um vídeo, um conto, um desenho. “Nesse caso, vamos potencializar as habilidades de cada um, já que ninguém é igual a ninguém”, completa Ormundo.

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Colegio Mobile
Na Móbile: autoconhecimento e avaliação segundo a escolha do aluno (Rogério Pallatta/Veja SP)

No Cambuci, o Colégio Marista Glória também terá uma classe específica para desenvolver a autopercepção. Segundo o professor Marcos Aurélio Pereira, será um momento de interromper a rotina intensa de estudos e dedicar a atenção a um momento voltado ao universo interior, “em que não existe tempo”. Por meio do uso de técnicas de ioga, o aluno faz uma pausa para ouvir o seu entorno, sua própria respiração, os sons da natureza. “Vivemos num tempo de abundância de informações e de recursos tecnológicos. Queremos que o estudante entenda o fluxo natural das coisas. É preciso oxigenar”, diz.

Apesar de trabalhar um “desmame” da tecnologia, o Marista Glória vai implementar entre as aulas complementares a disciplina de robótica. Em parceria com a Lego Education, tanto os frequentadores do ensino fundamental quanto os do ensino médio terão a oportunidade de desenvolver conceitos de programação e aprimorar suas competências (de acordo com a faixa etária, claro). Rafaela Jorge de Oliveira, coordenadora do núcleo, espera assim incentivar espírito de equipe, planejamento, coopera- ção e tomada de decisões.

Para Cristina Nogueira Barelli, coordenadora do curso de pedagogia do Instituto Singularidades, em Pinheiros, todas essas disciplinas demonstram o esforço dos colégios de se aproximar dos interesses dos alunos contemporâneos, ampliando o leque de possibilidades. “Não existe melhor ou pior. O trabalho é buscar atender à necessidade de evolução, por meio do estímulo às habilidades dos alunos”, avalia Cristina. “Você vai estudar química e física em aulas práticas e aplicadas. As escolas estão criando caminhos para trabalhar as aptidões dos alunos e tornar o projeto curricular muito mais interessante”, diz Cristina. Os métodos e disciplinas variam de uma instituição para outra, mas os educadores concordam em que há necessidade urgente de atualização. “A aprendizagem só acontece e passa a ser significativa se faz sentido na vida do aluno”, finaliza a educadora Lilian Neves.

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Publicado em VEJA SÃO PAULO de 12 de fevereiro de 2020, edição nº 2673.

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