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Eduardo Suplicy: o campeão do Senado

Com sua fala lenta, discurso repetitivo e ar de maior abandonado, ele conquista seu terceiro mandato como senador

Por Rodrigo Brancatelli
Atualizado em 5 dez 2016, 19h21 - Publicado em 18 set 2009, 20h36

O paulistano Eduardo Matarazzo Suplicy, com óculos de aro fino para corrigir a vista cansada, olha emocionado para os números do Tribunal Superior Eleitoral estampados em sua televisão de plasma. Abre um discreto sorriso e conclui naquele seu conhecido ritmo desacelerado: “Ganhei mais uma, não é mesmo?”. As cerca de quarenta pessoas que estão em sua casa acompanhando os resultados das eleições, no último domingo, começam a abraçá-lo e brindam a terceira vitória que ele alcançou para o Senado com latinhas de cerveja nas mãos. Suplicy cumprimenta um a um (dos filhos, só foi o caçula João) e agradece especialmente à namorada, Mônica Dallari, 23 anos mais jovem. “Se não fosse a força dela, eu não conseguiria passar por mais essa campanha.” Aos 65 anos, o petista ocupará por mais oito o gabinete número 2 da ala Dinarte Mariz do Senado Federal. Teve 47,8% dos votos válidos no estado, o maior índice de sua carreira, com 8,98 milhões de eleitores (veja quadro). Não foi um nocaute acachapante como o esperado. Seu rival Guilherme Afif Domingos, do PFL, quase chegou lá, com 43,7% dos votos. “Por um momento fiquei apreensivo, mas no fundo sei que as pessoas acreditam em mim”, diz Suplicy.

Apesar de ter perdido eleitores na reta final, a se acreditar nas pesquisas que previam uma vitória avassaladora, e não no sufoco, como foi, Suplicy conquistou ao longo dos anos um eleitorado fiel, que vota nele independentemente de sua legenda. “Ele não tem apenas eleitores, mas fãs”, afirma a historiadora e cientista política Vera Lúcia Horta. “Suplicy criou no imaginário popular a figura de um político incorruptível e honesto.” Hostilizado entre os caciques do PT e alvo de galhofas no mundo político, ele é como esses atores de blockbusters: a crítica odeia, mas o público adora. “Ainda que desagrade ao partido, não hesito em expressar o que acho correto”, diz ele, que desafiou Lula em 2002 a realizar prévias para definir quem seria candidato à Presidência da República e testemunhou a favor de Heloísa Helena quando a senadora foi expulsa do PT por ter votado contra a reforma da Previdência, em 2003, entre outras iniciativas.

Suplicy tem o seu próprio tempo. Fala pelos cotovelos, mas num ritmo, bem, num ritmo que deixa… mesmo… os seus…. assessores… particulares… e amigos… mais próximos… irritados, às vezes com sono, de tão lento que ele é. A cada quatro ou cinco palavras, o senador faz uma pausa, pensa, respira, pensa mais um pouco e volta ao raciocínio. É o que os seus adversários e piadistas em geral chamam de estilo Lexotan (pura maldade, já que ele afirma tomar apenas um remédio para controlar os hormônios da glândula tireóide). “Na maioria das vezes, eu fico mudo no carro, não pergunto nadinha”, conta José Damião da Silva, assessor e motorista que trabalha com Suplicy há 21 anos e, portanto, sabe do que seu chefe é capaz. “Quando ele começa a falar, não pára mais.” Para piorar (neste caso), Suplicy tem memória de elefante. Ao lembrar alguma história, faz questão de citar lugares, datas e absolutamente todas as pessoas que estavam presentes – recorda-se, por exemplo, do nome e sobrenome das cinco namoradas que teve na adolescência, antes de conhecer sua ex-mulher Marta Suplicy, em 1960.

Se o assunto então resvalar para o tópico Renda Básica de Cidadania, tema do qual Suplicy trata obsessivamente e sobre o qual escreveu dois livros, a conversa pode levar hooooooras. Há seis anos, o senador recorreu a um curso de oratória. Fez dezoito horas de treinamento com o professor Reinaldo Polito. “Em nossa primeira sessão, pedi que ele explicasse o Renda Básica em três minutos”, conta Polito. “Ele falou durante 48 minutos.” Não é para menos que a sua conta de celular passa dos 500 reais por mês – boa parte das ligações (em média quatro por dia) para a namorada, Mônica.

Idealista, romântico e muitas vezes ingênuo, o senador segue a sua própria cartilha, que começou a ser escrita quando se elegeu deputado estadual, em 1978, pelo então MDB (melhor não perguntar como um membro de uma das mais tradicionais famílias paulistas iria parar dois anos depois no PT, sob o risco de ouvir o senador desenvolver uma teoria complicada em que aproxima Jesus Cristo e Karl Marx). Um dos nove filhos do corretor de algodão e café Paulo Cochrane Suplicy e da dona-de-casa Filomena Matarazzo – que já tinha um casal de crianças de outro casamento –, Suplicy é um homem extremamente cordial e que não se cansa de pregar suas idéias. Conversa com todos da mesma forma, seja o presidente Lula, seja um líder comunitário. Emociona-se facilmente, sobretudo quando se lembra dos três filhos que teve com Marta: o roqueiro Supla, o advogado André e o músico João. “Como pai e como amigo, ele sempre nos ensinou a ter respeito pelos outros”, diz Supla, o único do clã que ainda não lhe deu netos (André tem dois meninos e João, duas meninas). “Na minha vida inteira, eu levei palmada uma única vez, quando fui muito mal-educado com a minha mãe”, conta Supla. “E ainda assim ele foi democrático e perguntou antes se eu merecia a palmada.”

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Suplicy adora falar sobre a infância dos filhos, mas quando o assunto é Marta Suplicy ele começa a discorrer sobre – adivinhem? – o Renda Básica, como se os interlocutores não estivessem falando o mesmo idioma. Com assessores e amigos mais próximos, no entanto, lembra da mulher com quem ficou casado por 36 anos com muito carinho, o que aumenta ainda mais a aura de “bonzinho” que ganhou depois da separação, em 2001. Os dois conversam ocasionalmente por telefone e, há duas semanas, Marta foi conhecer a casa de onze cômodos, no Jardim Paulistano, para a qual o senador se mudou recentemente.

Quando está em São Paulo, de sexta a segunda-feira, Suplicy vai correr no Parque do Ibirapuera. Já em Brasília, onde passa de terça a quinta, ele começa o dia perto das 6 horas com uma caminhada leve. “Minha saúde está impecável por causa dos meus exercícios”, acredita ele, que evita carne vermelha e frituras. “Durmo pouco, de quatro a seis horas, e muitas vezes não tenho tempo para almoçar, mas, se eu consigo fazer minhas caminhadas matinais, tudo fica bem com meu corpo e minha mente.” Ao contrário de seus pares, Suplicy não tem carro pago pelo Senado – dono de um Chevrolet Kadett com oito anos de uso, mantém em sua garagem em São Paulo um Fiat Doblò que Supla ganhou quando participou do programa Casa dos Artistas, em 2001. Costuma dizer que vive na pindaíba, apesar do patrimônio declarado de cerca de 1,9 milhão de reais e dos salários de 12.000 reais como senador e 3.000 como professor de administração na Fundação Getulio Vargas, onde leciona desde 1966.

Essa postura franciscana, diferentemente de tantos de seus colegas de partido, faz com que Suplicy seja tratado nos comícios, nas passeatas ou nas cerca de oitenta palestras de que participa todo ano como um bastião da honestidade, quase um santo milagreiro. Seus bolsos sempre voltam para casa abarrotados com cartas, pedidos de ajuda e, invariavelmente, bilhetinhos de mulheres que se dizem apaixonadas. Algumas chegam a pedi-lo em casamento e tentam lhe arrancar um beijo no rosto. Suplicy retribui. Muitas e muitas vezes, passa até o número do próprio celular para continuar a conversa mais tarde, mesmo que seja com um completo desconhecido. “As pessoas gostam de ser ouvidas”, repete ele. “Acho que essa é a função do político, um funcionário do povo.”

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