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Desvio no Municipal: Haddad pode virar réu por improbidade

Em nota, assessoria de imprensa rebate acusações e diz que promotor responde a representação por perseguição ao prefeito 

Por Sérgio Quintella
Atualizado em 1 jun 2017, 15h51 - Publicado em 11 nov 2016, 23h00
Carmen
Carmen (Heloisa Ballarini/Secom/)
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O escândalo de corrupção no Teatro Municipal, um dos ícones da cidade, entrou em cartaz no fim do ano passado, com as primeiras denúncias de desvio de dinheiro público. As estimativas iniciais apontavam para um rombo de 21 milhões de reais, mas, nos últimos tempos, surgiram indícios de um desfalque ainda maior, da ordem de 30 milhões. O caso provocou a queda de toda a diretoria, incluindo o maestro John Neschling, deu origem a uma CPI, a duas investigações do Ministério Público (MP) e a vários questionamentos feitos pelo Tribunal de Contas do Município (TCM).

Não param de surgir novidades cabeludas a respeito das irregularidades, e as mais recentes são especialmente bombásticas: Neschling será indiciado criminalmente (até agora é apenas investigado no processo) e o prefeito Fernando Haddad entrou na relação de suspeitos.

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Os primeiros vestígios internos de problema apareceram em novembro de 2014, quando o contrato com o Instituto Brasileiro de Gestão Cultural (IBGC) — empresa responsável por administrar das finanças à área artística do teatro — foi contestado pelo conselheiro Edson Simões, do TCM. Publicamente, no entanto, tudo parecia caminhar bem até novembro do ano seguinte.

A administração municipal comemorava a melhora na qualidade da programação, a maior presença do público (o número de visitantes saltou de 61 000, em 2012, para 101 000, em 2015) e a elevação nos investimentos (de 12 milhões de reais, em 2013, para 95 milhões, em 2016). Nessa época, brotaram as primeiras evidências da encrenca com o cancelamento, por falta de recursos, de espetáculos badalados, como a ópera Così Fan Tutte.

O mar de lama chegou de vez entre dezembro de 2015 e fevereiro deste ano. Após uma investigação, o Ministério Público denunciou um esquema de desvio de dinheiro no local, acusando o ex-diretor da Fundação Theatro Municipal, José Luiz Herencia, e o ex-diretor do IBGC, William Nacked, de participação na irregularidade. Em julho, a dupla assinou um acordo de delação premiada com os promotores e admitiu ter abocanhado cerca de 10 milhões de reais. As fraudes teriam começado em 2013.

Herencia
Herencia ()
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A reportagem de VEJA SÃO PAULO teve acesso, com exclusividade, aos documentos apresentados pelos delatores ao MP. Segundo eles, o edital da licitação foi formulado de modo a favorecer o IBGC. “Uma cláusula exigia que os músicos da orquestra fossem contratados pelo regime previsto na CLT, o que inviabilizaria outra proposta”, declarou Nacked. “Tudo teve o conhecimento de Juca Ferreira (então secretário de Cultura) e de Neschling, com o aval de Haddad, via secretário de Comunicação, Nunzio Briguglio.”

A concorrência terminou com o IBGC levando o contrato, assinado em agosto do mesmo ano. Embora todos os citados desmintam a irregularidade, o promotor Marcelo Milani quer aprofundar as investigações. A respeito de Haddad, diz que vai apurar se ele teve ou não envolvimento com o episódio. Daí sua inclusão na lista oficial de investigados. Caso as suspeitas do MP se confirmem, Haddad pode virar réu por improbidade administrativa.

Ele não quis conceder entrevista sobre o caso. Por meio de nota, sua assessoria de imprensa rebateu a acusação e criticou o trabalho de Milani: “Ele responde por uma representação na Procuradoria-Geral de Justiça por perseguição ao prefeito e as delações foram feitas por dois criminosos confessos que tiveram seus bens bloqueados pelo próprio governo municipal”.

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A delação de Herencia vai mais longe. O ex‑diretor do teatro afirma que ele, Nacked e o maestro tinham um acordo para que o salário dos dois primeiros, estipulado em cerca de 15 000 reais, fosse equiparado ao de Neschling (150 000 reais) por meio de notas fiscais frias. “Em troca, nós nos comprometemos a não interferir no trabalho dele”, diz.

Outro ponto polêmico envolve o processo de admissão do maestro, considerado ilegal pelo TCM. Segundo o órgão, Neschling deveria ter sido contratado pelo Municipal, pois há o cargo de diretor artístico no plano de carreira da casa. Em vez disso, ele ingressou nela como prestador de serviço, por meio de um contrato com o IBGC. Na prática, exercia a mesma função, ou seja, diretor artístico. Segundo os investigadores, foi um jeito de aumentar o rendimento do profissional, que receberia só 3 000 reais se fizesse parte da folha de pagamento do teatro.

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Nacked
Nacked ()

Como se não bastasse, segundo o delator Herencia, a Controladoria‑Geral do Município, quando tomou conhecimento da situação, em vez de denunciar o caso e exigir a tomada de providências, entrou em cena para apagar o incêndio, a pedido do secretário de Comunicação. “O Nunzio me chamou em sua sala, na presença do controlador‑geral do município, o Roberto Porto, e pediu que ele desse um jeito no contrato”, diz Herencia.

Só havia uma solução: romper o acordo de Neschling com o IBGC e empregá‑lo como funcionário público, no cargo de diretor artístico. Como isso não seria possível (o profissional não aceitaria ganhar só 3 000 reais e haveria desgaste político), ninguém fez nada quanto ao questionamento do TCM.

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Briguglio confirma a reunião citada por Herencia, mas alega que ela foi convocada para resolver outro problema: a possibilidade de o maestro processar posteriormente a prefeitura na Justiça Trabalhista, o que ele já havia feito com o governo estadual após sua saída da Osesp. Por isso, foi incluída uma cláusula no contrato de Neschling com o IBGC dizendo de forma expressa que ele não tinha vínculo algum com a administração municipal. “Isso é vingança desse sujeito, pois eu o botei na cadeia”, afirma Porto, referindo‑se a Herencia.

Neschling, por meio de nota, refuta o delator e declara que entrou com um processo por danos morais contra o IBGC e para exigir também o pagamento de salários que deveria ter recebido até o fim do contrato. Ao todo, quer 1,6 milhão de reais.

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Fernando Haddad e John Neschiling
Fernando Haddad e John Neschiling ()

Nos bastidores do MP, dão‑se como certos os indiciamentos criminais de Herencia, Nacked e Neschling até o fim do ano. Sobre o maestro — que era amigo do prefeito mas reclamou da forma como foi demitido, em setembro — ainda recaem denúncias de que ele assinou contratos de apresentações nunca realizadas, como a do projeto Alma Brasileira, de 1 milhão de reais. Convidado a depor em outubro sobre o caso, Haddad não compareceu, mas enviou respostas por escrito.

Ele nega ter conhecimento dos desvios. Depois de ouvir todos os envolvidos, o promotor Milani resume o que ocorreu no teatro nos últimos anos. “Um grupo de amigos se reuniu para assaltar os cofres públicos”, afirma.

ENREDO ILEGAL

As descobertas mais importantes da investigação sobre o esquema que causou um rombo de 21 milhões de reais

Setembro de 2015. Pela primeira vez, a prefeitura identifica um descompasso entre o orçamento e as despesas do Municipal

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Novembro de 2015. Espetáculos, como a ópera Così FanTutte, começam a ser cancelados por falta de verba

Dezembro de 2015. Ex-diretor do teatro, José Luiz Herencia é acusado de cobrar propina e realizar eventos superfaturados

Fevereiro de 2016. Então diretor do IBGC, entidade gestora do teatro, William Nacked também passa a ser suspeito de desvio de dinheiro; no mesmo mês, Haddad nomeia o interventor Paulo Dallari para administrar o local

Junho de 2016. A Câmara instaura CPI para apurar as suspeitas

Julho de 2016. Herencia e Nacked assinam acordo de delação premiada com o MP: ambos detalham o recebimento de propina e acusam o prefeito e secretários de saber das irregularidades

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Setembro de 2016. O maestro John Neschling é demitido

Outubro de 2016. A Câmara conclui a CPI e aponta um rombo de 21 milhões de reais

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