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Pesquisadores descobrem nova espécie de árvore nativa de São Paulo

"Prima" da goiaba, a Myrcia tenondeporan se estende por parte do litoral do país e ficou sem identificação por quase duzentos anos

Por Júlia Rodrigues
22 mar 2024, 06h00

Espécie de guardião da flora da cidade, o Herbário Municipal de São Paulo abriga em seu acervo 25 000 amostras preservadas de ervas, arbustos, árvores nativas e ornamentais coletadas principalmente na capital. Uma delas, que ficou guardada sem identificação por quase trinta anos, acaba de ser reconhecida como uma nova espécie. A árvore Myrcia tenondeporan foi descrita pela primeira vez em dezembro, em artigo publicado no Phytotaxa — um dos maiores jornais de taxonomia botânica do mundo —, assinado pelo professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) Matheus Santos e pelo coordenador do Herbário, o biólogo Eduardo Barretto. “No início, chegamos a classificá-la como outra espécie do gênero muito parecida. Mas depois percebemos que ela tinha características diferentes, como flores e folhas menores”, conta Barretto.

A identificação só foi possível quando Matheus, que já desenvolvia trabalhos com a instituição, fez a revisão do grupo, processo que durou quase uma década. “Consultei a bibliografia, as espécies que já foram descritas e as coleções de outros herbários”, explica ele. O nome foi escolhido em homenagem ao território indígena Tenondé Porã — onde a planta é comum —, que compreende parte da capital e das cidades de São Bernardo do Campo, São Vicente e Mongaguá.

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Detalhes sobre a espécie (Eduardo Barretto/Divulgação)

Mas ela não se restringe ao estado. Afeita ao clima úmido, a planta se espalhou pela costa, entre o sul do Rio de Janeiro e o norte de Santa Catarina, passando pela Serra do Mar. De baixa estatura para os padrões botânicos (não passa dos 10 metros de altura), a Myrcia tenondeporan ocupa os sub-bosques e as bordas das florestas. Sua principal característica são os frutos redondos e escuros, que servem de alimento para aves e mamíferos. No Brasil, os frutos da família das mirtáceas, que engloba o gênero Myrcia, são conhecidos popularmente como guaramirim e cambuí. São primas da nova descoberta a goiaba, a pitanga e a jabuticaba.

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Amostra da Myrcia tenondeporan (Leo Martins/Veja SP)

A complexidade do grupo, que tem mais de 6 000 espécies no mundo, dificulta as descobertas. “Foi só na década de 90 que começaram a aparecer mais pesquisas sobre as mirtáceas no Brasil. É comum depararmos com espécies novas guardadas em acervos”, diz Matheus. A nova espécie já havia sido coletada em 1826, em Santos, pelo botânico e desenhista britânico William John Burchell, mas sua identidade só foi revelada no recente artigo. Contribuiu para o anonimato de quase dois séculos a escassez de expedições em áreas da Zona Sul, que tem grande biodiversidade. “Há pesquisadores coletando plantas no Brasil desde o século XIX, mas, na época, São Paulo era ponto de partida para expedições no interior. Não exploravam a cidade”, explica Ricardo Garcia, curador da coleção.

Instalado numa casa no Parque Ibirapuera desde 1996, o Herbário Municipal é uma instituição vinculada à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente e responsável pelo levantamento e pela divulgação da flora da capital. “Fornecemos informações para diversos serviços da prefeitura, como construção e manejo de parques e utilização de árvores para paisagismo urbano. Também atendemos o público que queira pesquisar sobre plantas”, explica o coordenador.

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Com sete funcionários, entre biólogos e engenheiros, o Herbário guarda amostras de plantas cujas primeiras coletas datam do início do século XX (veja o quadro abaixo). Para comemorar os 40 anos que se completam em 2024, a instituição pretende produzir um livro com sua história e um guia da flora nativa de São Paulo, que deve ser publicado ainda no segundo semestre. As descobertas não param: Eduardo e Matheus já localizaram outras espécies novas na cidade, que ainda estão sendo descritas.

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(Leo Martins/Veja SP)

Três meses antes da publicação do artigo sobre a Myrcia tenondeporan, outra dupla de biólogos, Fabrício Meyer e Renato Goldenberg, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), também descreveu no Phytotaxa uma nova espécie nativa de São Paulo. Trata-se da Pleroma curucutuense, um arbusto com flores roxas da mesma família das quaresmeiras, muito usadas no paisagismo urbano. Ela foi vista pela primeira vez por eles em 2012 e só ocorre numa área específica: os campos de altitude do Núcleo Curucutu, seção do Parque Estadual da Serra do Mar localizada na Zona Sul da capital e em parte das cidades de Itanhaém, Mongaguá e Juquitiba. São Paulo floresce.

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Pleroma curucutuense: outra descoberta recente para a flora paulista (Renato Goldenberg/Divulgação)

Publicado em VEJA São Paulo de 22 de março de 2024, edição nº 2885

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