Todo fim de ano é isso, a gente lembra que aconteceram coisas ruins entre o 1º de janeiro e o 31 de dezembro e deseja a todos um feliz ano-novo, que o velho vá logo embora com suas mazelas. Misturamos uma ilusória sensação de alívio e sentimentos de esperança para seguir em frente.
Este foi o ano em que o açougueiro-mor do país revelou e mostrou que distribuiu picanhas e chuletas a 80% dos deputados, senadores, ministros, governadores e prefeitos, deu nédios rebanhos às autoridades maiores e borregos gordos em espécie aos carregadores de malas desses altos servidores.
Foi o ano em que o presidente Donald Trump, armado até os dentes pelos fabricantes de armas, começou sua escalada de despautérios.
Ano em que o assédio sexual, tão comum nas relações em que há posições de poder e de necessidade, foi retirado dos armários pelas mulheres assediadas, o que jogou nos tribunais das redes sociais atores famosos, poderosos diretores e produtores de cinema, que perderam seus empregos milionários. Aqui, para não ficarmos atrás, foram expostos à chacota popular lamentáveis molestadores em ação nos ônibus e no metrô.
Ano em que o prefeito alinhado começou seu trabalho vestido no macacão abobrinha dos garis e varreu ruas do centro ao som imaginário de uma famosa marchinha janista (“Varre, varre, vassourinha / varre, varre a bandalheira”) e depois, empolgado com a repercussão na mídia, varreu para debaixo do tapete o lixo da Cracolândia, junto com drogados, zumbis e mendigos, enquanto na internet seus alinhados admiradores insinuavam soluções à Pinochet, de confinamento e desaparecimento; e ainda empolgado com seus talentos faxineiros começou a apagar grafites de artistas populares nos muros da cidade, cobrindo-os com linda tinta cinzenta, até que algum amigo sugeriu que ele submergisse.
Ano em que ficamos mais pobres porque nosso mais famoso bilionário na lista da revista Forbes foi rebaixado. Durante sua breve fuga de arrumação por Nova York virou procurado; nas redes sociais escreveram que Eike Batista foi direto da lista da revista de negócios americana para a da Interpol.
Ano em que Lula se manteve no primeiro lugar como candidato à Presidência da República e como candidato à prisão no Paraná.
Foi o ano em que o Rio de Janeiro teve três ex-governadores na cadeia ao mesmo tempo, por corrupção, e um governador com processo em fase de denúncia.
Foi o ano em que muitos desatinados com o dedo no gatilho, ou no botão do detonador, ou com o pé no acelerador, mataram centenas de inocentes nos Estados Unidos, na Turquia, no Reino Unido, na Suécia, na França, na Espanha…
Ano em que se constatou que havia ovos podres também no ninho dos tucanos.
Ano em que o Supremo não foi tão supremo assim.
Em que o desemprego continuou, a robotização das fábricas continuou, a mecanização no campo continuou, e se concluiu que é assim mesmo, não há o que fazer.
Foi o ano em que o Credit Suisse divulgou que o pessoal mais rico do planeta estava ainda mais rico: 1% passou a deter 50,1% de toda a riqueza mundial.
O ano em que aquela brasileira racista horrorosa de boca fake, nariz fake e nome fake que mora no Canadá e que havia realizado a façanha de subir na horizontal tripudiou na internet sobre uma garotinha adotada negra lindinha, de 4 anos, escolhida porque os pais são atores famosos e a racista queria uma carona nessa fama.
E foi o ano em que Papai Noel foi apedrejado na rua por crianças em Itatiba, no interior de São Paulo, ao estilo dos novos tempos, porque ele ficou sem balinhas e guloseimas para distribuir.