Caro senhor cronista, permita-me incomodá-lo com uma história pessoal que eu acredito que possa contribuir para a discussão que acompanhei nas últimas semanas pela imprensa e pela internet. Gostaria de expor a minha posição de mãe. Meu filho é homossexual, tem 17 anos. Tenho lido muita coisa sobre a autorização de um juiz para a realização de terapias que buscam mudar a divergência sexual de jovens, a “cura gay”, como se diz; já vi posições de juiz, de psicólogos, de entidades de psicólogos, de jornalistas, de educadores, de mães sofredoras… Sou mãe, e não sofro. A condição de meu filho permitiu que eu me tornasse uma pessoa melhor, uma mãe melhor. Meditei, estudei, conversei.
A internet é uma coisa maravilhosa. Graças a ela, foi possível fazer circular entre milhares de pessoas, que sei eu, talvez entre milhões, uma carta de Freud para a mãe de um rapaz homossexual. Veja o senhor como essa discussão está atrasada entre nós: a carta é de 1935! Eu nem era nascida, nem minha mãe.
Senhor, desculpe falar um pouco de mim. Não gosto de parada gay, acho um show de Carnaval, e tem pessoas que gostam e outras que não gostam de Carnaval. Tem muita gente que participa por posição política, acho válido, e gente que vai pelo show, a maioria. Sou do tempo do cada um na sua. Nunca fui permissiva, mas respeito. A coisa mais sagrada para mim é o respeito. Na novela da Globo, nos capítulos de umas semanas atrás, a mãe era patética, e foi penoso ouvir aquele sofrimento egoísta, mas novela é assim mesmo, precisa apelar, faz parte.
O doutor Freud, na carta para a mãe do rapaz, diz o que eu gostaria que me tivessem dito quando deparei com o problema: “Não tenho dúvidas de que a homossexualidade não representa uma vantagem; no entanto, também não existem motivos para se envergonhar dela, já que isso não supõe vício nem degradação alguma”. Isso, senhor, me falou à alma, pois foi uma coisa que eu aprendi sozinha, com amor. Respeito e amor nos fortaleceram. Não digo que meu filho seja feliz, e não pelo caminho que segue, mas por causa dos outros. Se não houvesse o preconceito, acho que ele seria bem feliz, pois é alegre e talentoso. A carta de Freud fala disso também: “É uma grande injustiça e também uma crueldade perseguir a homossexualidade como se esta fosse um delito”.
Meu filho sofre agressões no colégio, está fazendo o último ano, vai prestar arquitetura. As agressões vêm de uns dois machinhos que tem lá, fazendo cena para as meninas. Quando houve agressão física, o conselho da escola chamou os pais para um entendimento. Eles prometeram falar com os filhos, mas deu para entender que o preconceito começa neles. A mãe de um, achando que estava sendo simpática comigo, me falou: “Deve ser triste ter um filho como o da senhora”. Ah, respondi na hora: “Deve ser triste é ter uma mãe como a senhora”.
Quanto à “cura”, o que Freud diz é definitivo, eu acho, pois foi ele quem inventou a psicanálise, não é? Ele fala na carta: “Ao me perguntar se eu posso lhe oferecer a minha ajuda, imagino que isso seja uma tentativa de indagar acerca da minha posição em relação à abolição da homossexualidade, visando a substituí-la por uma heterossexualidade normal. A minha resposta é que, em termos gerais, nada parecido podemos prometer”.
Se ele que era ele nada podia prometer, e falava no plural, pelos especialistas, pergunto: esses que agora se propõem a fazer o “tratamento” agem como charlatães, concorda?
Com todo o respeito, sua leitora.