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Fiscais do carnaval: censura na folia ou avanço no respeito às minorias?

A mais popular das festas brasileiras vira alvo das guerras culturais, entre uma bem-vinda evolução de conscientização e uma patrulha nas redes sociais

Por Dirceu Alves Jr.
Atualizado em 10 fev 2020, 16h24 - Publicado em 7 fev 2020, 06h00

Homens maquiados, de sainha e peruca, mulheres vestidas sensualmente de índia ou de odalisca desaparecerão do Carnaval paulistano? Turbante pode ou é apropriação cultural? Carnavalescos, blocos, escolas que preparam inocentes festinhas no recreio e até o folião que cria o look do bloquinho estão deparando com uma questão muito contemporânea: o que é ultrapassado ou fora de contexto, o que, de fato, é preconceituoso em relação ao perfil supostamente homenageado.

Uma foto ou um vídeo na internet podem arruinar a reputação do anônimo folião desavisado — e atrair linchamentos virtuais, comandados por patrulhas de engajados “bonzinhos”, que muitas vezes exigem a demissão, o degredo e a perseguição de quem não se comportou corretamente. A bolha das redes sociais também se impôs na avenida.

Bloco nas ruas: rapazes com fantasias femininas podem ser alvo de discussão (Ricardo D´Angelo/Veja SP)

Em vários casos, a patrulha teve uma missão civilizatória. Pinturas de rosto que tentam mimetizar a pele negra ou indígena, como o black face ou o red face, já foram felizmente aposentadas, devido à forte carga racista. As trilhas sonoras estão em franca revisão. Muitas das tradicionais marchinhas, a maioria delas crônicas ligeiras, compostas entre as décadas de 30 e de 60, talvez não sejam bem-vindas em qualquer cordão, como as conhecidas (e claramente preconceituosas) Cabeleira do Zezé, Mulata Bossa Nova e Índio Quer Apito.

No mês passado, Renata Spallicci, rainha de bateria da escola de samba Barroca Zona Sul, caiu em um desses equívocos. Ela postou uma foto em que aparecia ornamentada com correntes prateadas, conchas e uma máscara de flandres, em alusão à escrava Anastácia, para criticar a “falta de voz” de todas as mulheres. Não colou. A repercussão negativa da imagem nas redes sociais foi rápida. Renata apagou a foto e pediu desculpas.

Responsável pela Águia de Ouro, o carnavalesco Sidnei França acredita que os desfiles não estão alheios à internet, mas é preciso relativizar o valor das opiniões não embasadas. No ano passado, à frente da Gaviões da Fiel, o artista foi fuzilado virtualmente. Mesmo antes do encerramento da apresentação, a escola já figurava entre os trending topics (a lista de assuntos mais comentados) do Twitter. Tudo por causa da comissão de frente, que exibia um confronto entre o bem e o mal, mostrando em alguns momentos Deus apanhando do Diabo.

Sidnei França, carnavalesco da Águia de Ouro: disposto a enfrentar críticas ou pedradas (Rogerio Pallatta/Veja SP)

No dia seguinte, a Frente Parlamentar Evangélica da Câmara dos Deputados repudiou o desfile, alegando que a agremiação havia desrespeitado a figura de Jesus e ofendido a fé cristã. Não é só a esquerda identitária que recorre à censura quando se sente ofendida. “Prestei depoimento em uma delegacia justificando o óbvio, que o meu trabalho era uma manifestação artística, e ainda respondi a um juiz evangélico”, lembra França.

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Para a estreia na Águia de Ouro, o tema é O Poder do Saber — Se Saber É Poder, Quem Sabe Faz a Hora, Não Espera Acontecer, e, por enquanto, celeumas não vieram à tona. França teme que precauções com a opinião alheia possam inibir a expressão artística e virar uma forma de censura. “Se eu desenvolvesse um Carnaval sobre Xica da Silva, por exemplo, teria de colocar na avenida uma negra com o rosto cheio de pó de arroz, como a ex-escrava fazia, e algumas pessoas certamente se sentiriam agredidas”, declara.

“Nós, das escolas de samba, somos da periferia, do morro, e estamos acostumados a ser tachados de baderneiros, de representantes de uma cultura inferior, então seguimos em frente diante de críticas. O pes­soal dos blocos é que fica melindrado porque faz parte de uma bolha e quer agradar aos vizinhos. Não é à toa que grande parte deles está em Pinheiros e na Vila Madalena”, polemiza.

Andre Machado Carnavalesco da Rosas de Ouro: sem interesse em promover temas que possam ser boicotados (Rogerio Pallatta/Veja SP)

O carnavalesco André Machado, da paulistana Rosas de Ouro, não renega a influência das redes sociais em seu trabalho. Para ele, um samba-enredo criticado previamente pelos internautas chega enfraquecido ao dia do desfile e compromete a reação das arquibancadas. Os dirigentes da escola, que neste ano leva ao Sambódromo do Anhembi o enredo Tempos Modernos, sobre industrialização e tecnologia, também não têm interesse algum em promover temas boicotados. “Eu desisti de enredos que inclusive trariam um bom retorno financeiro para a escola, porque certamente receberiam muitas críticas negativas”, confessa Machado. “Quando começamos a desenvolver o Carnaval de 2020, já imaginamos um recorte sobre tecnologia que cairia no gosto tanto da nossa comunidade como no dos frequentadores das redes sociais.”

Do outro lado da Via Dutra, a polêmica do que é tóxico ou ofensivo persiste. O carnavalesco Leandro Vieira, da Mangueira, entrou no centro de um furacão antes mesmo de a agremiação pisar na passarela. A escola carioca propõe uma releitura humanizada da vida de Jesus Cristo com o enredo A Verdade vos Fará Livre, e Vieira teve seu nome ligado a notícias falsas divulgadas na rede. Entre elas, uma garantia que a Mangueira colocaria no Sambódromo da Marquês de Sapucaí uma versão homossexual de Jesus, semelhante à que foi retratada no controvertido episódio de fim de ano do programa humorístico Porta dos Fundos. “A rede social é uma terra de ninguém em que toda mentira pode virar verdade e não temos como controlá-la, então eu jogo o que rea­lizo para o discurso da arte e considero natural se houver desconforto”, afirma.

Além de defender a Mangueira no Grupo Especial, neste ano Vieira assina o desfile da Imperatriz Leopoldinense, que, rebaixada para a Série A, luta para retornar à elite do samba do Rio de Janeiro. O tema escolhido é uma reedição da premiada homenagem feita ao compositor Lamartine Babo pela escola em 1981 com o enredo O Teu Cabelo Não Nega — Só Dá Lalá.

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Leandro Vieira, das cariocas Mangueira e Imperatriz: críticas e ‘fake news’ antes do desfile (Oscar Liberal/Divulgação)

Em 2020, a referência à famosa marchinha de autoria de Babo, hoje considerada racista, caiu do título, ficando apenas Só Dá Lalá. Vieira preferiu fugir da confusão, mas garante que não sofreu nenhum tipo de pressão da agremiação, apenas achou adequado assim. “Naquela época, a sociedade tinha outra visão a respeito do significado desses versos e, como me proponho a criar um Carnaval contemporâneo, entendi que ‘o teu cabelo não nega’ está descontextualizado nos dias de hoje”, explica-se, tentando se livrar da polêmica.

O sociólogo Tadeu Kaçula, pesquisador das origens negras do samba em São Paulo, estabelece um limite nas manifestações, principalmente quando as ações reforçam antigos estereótipos. “O Carnaval reflete uma organização étnica e social, e os festejos quando não eram interessantes para o crescimento da cidade foram gradativamente expulsos da região central porque, até cinco décadas atrás, o samba era coisa de preto desocupado”, justifica.

Para discutir o Carnaval contemporâneo, não pode ser esquecido o histórico de resistência nas periferias, que, segundo ele, é ignorado pelos organizadores tanto dos blocos como de muitas escolas de samba. Kaçula afirma que a maioria dos blocos não tem nenhum compromisso com as raízes do Carnaval. “É uma elite que criou um circuito para curtir a festa”, declara. A ausência de negros no comando das escolas de samba também é, para ele, outro fator que deveria ser discutido. “É por isso que as pessoas precisam ter o entendimento de que não é legal colocar uma mulher negra em posição ridicularizada nos desfiles. Não existe uma patrulha, mas, sim, a busca de uma conscientização para gerar um debate sobre como os negros ou os índios podem se sentir depreciados.”

A estudante universitária mineira Jéssica Tôrres de Oliveira está bem disposta a divulgar o que lhe incomoda. Indígena do povo tikmu’un, mais conhecido como maxacali, ela integra o Comitê Mineiro de Apoio às Causas Indígenas e descobriu o microfone da internet para fazer a sua voz ser ouvida. Tem alcançado, por meio de postagens nas redes sociais, vitórias consideráveis.

Ela conseguiu, em uma ação coletiva com o comitê, o cancelamento de uma oficina promovida pela Casa Fiat, centro cultural de Belo Horizonte, que ensinaria a confeccionar adereços indígenas, como cocares, saias de penas, arcos e flechas para quem quisesse brincar o Carnaval. “A população nos enxerga como os exóticos, os selvagens, e a fantasia de mulher indígena é sempre representada pela conotação sexual. O problema é que o Carnaval passa e essas impressões se perpetuam”, afirma Jéssica, que vive em Lagoa Santa, na região metropolitana de Belo Horizonte, e cursa museologia. “O brasileiro aprendeu a pensar assim, e quando fala ‘essas pessoas se ofendem com tudo’ é porque nunca sofreu preconceito por causa de sua identidade”, defende.

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O travestismo de alguns machões também ofende muitas mulheres. “Mulher não é fantasia de Carnaval, muito menos se recorrer ao estereótipo da mulher negra ou indígena”, declarou à revista Claudia a antropóloga Elisa Hipólito do Espírito Santo. “Homens que se vestem de mulher auxiliam no preconceito e nas violências que essa parcela da população sofre.”

A ponderação vai desfigurar o Carnaval, tradicional festa dos excessos? O historiador Luiz Antonio Simas se mostra preocupado diante da patrulha excessiva estabelecida nos últimos anos e de um possível flerte com a censura. “O Carnaval é uma festa da inversão, em que cada um pode virar o personagem que quiser naquele momento e assumir uma nova identidade”, afirma. “Claro que existem questões que devem ser problematizadas, como no caso do black face, uma evidente demonstração da nossa sociedade racista, mas o que me faz ficar atento é a tentativa de estabelecer proibições que atingem, inclusive, canções que integram nossa história cultural”, diz Simas.

Para o historiador, o que falta é o bom-senso nos dois extremos dessas discussões. E nesse embate tanto pensamentos de direita como de esquerda se mostram excessivamente radicais. “Quem se sente incomodado com uma marchinha pode apenas não cantá-la. Até porque o que incomoda não é a marchinha, mas a percepção de quanto o brasileiro é tradicionalmente machista, racista, preconceituoso, tudo claro nas letras dessas músicas.”

O bloco Turma do Funil: marchinhas tradicionais sem medo de advertência (Keiny Andrade/Veja SP)

O cordão paulistano Turma do Funil, que circula pelas ruas da Vila Clementino desde 2011, enfrentou problemas para conseguir verba porque potenciais patrocinadores enxergaram um incentivo ao alcoolismo em seu nome. O batismo se deu porque os amigos que criaram o grupo adoravam sair pela vizinhança cantando os versos “Chegou a turma do funil, / todo mundo bebe, / mas ninguém dorme no ponto, / nós é que bebemos / e eles que ficam tontos”, com a gravação de Tom Jobim, Miúcha e Chico Buarque na caixa de som.

A celeuma foi amenizada pela linha engajada dos temas. O povo nordestino será homenageado no desfile prometido para o dia 15 e, no abadá dos integrantes, aparece a figura da cangaceira Maria Bonita, em uma ode ao feminismo. “O nordestino sofre todo tipo de discriminação; vamos enaltecer a garra desse povo que supera todos os estereótipos”, diz Renata Mendes Barbosa, uma das fundadoras. O repertório privilegia marchinhas tradicionais, e o Turma do Funil não teme provocações. “Eu sou lésbica e jamais me incomodei ouvindo Maria Sapatão, assim como meus amigos gays se divertem dançando Cabeleira do Zezé”, garante Renata. “Se alguém se incomodar com o nosso perfil, estaremos abertos para dialogar e explicar as características do nosso bloco.”

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O ator Thiago Adorno, que há quatro anos leva o Bloco do Adorno para as ruas da Lapa, readequou o repertório do seu trio elétrico. “Os tempos mudaram, e brincadeiras que a gente costumava fazer anos atrás podem soar ofensivas a alguém que está ali para brincar com os amigos”, explica. “Com tanta música bacana por aí, por que precisamos cantar essas que transmitem mensagens datadas?”

No Bloco do Adorno, que neste ano desfila no dia 22, sucessos de Ivete Sangalo, Lulu Santos, Tim Maia e da banda Cheiro de Amor podem ser ouvidos ao lado de temas inéditos, como Sente, uma batida axé criada por Eduar­do Brechó e pela cantora italiana Aramà especialmente para o cordão.

O historiador Amailton Azevedo rejeita a ideia de patrulha ou censura e reafirma que não há tema proibido para a festa. “Só que uma piada, uma brincadeira e uma sátira só são interessantes e reveladoras quando todos se divertem com elas, por isso devemos prestar atenção”, declara. Logo, é necessária a conscientização que começou a ganhar força. Ele destaca no Carnaval de rua paulistano o bloco afro Ilú Obá de Min, fundado em 2004, com temáticas políticas voltadas para a questão da mulher negra. “Os assuntos sensíveis em torno das mulheres, dos negros, dos índios e dos gays compõem a atual pauta de identidade e gênero e, revendo a história do Carnaval, as discussões do momento sempre foram motivos de elogio ou ironia.”

Nos Carnavais da segunda metade do século XIX, a iminente abolição dos escravos já era tratada nos blocos do Rio de Janeiro. Os governos dos ex-presidentes Floriano Peixoto e Hermes da Fonseca, nos tempos da República Velha, também inspiraram sátiras, assim como as figuras do então ditador Getúlio Vargas e do líder nazista Adolf Hitler foram alvo de deboche nos cordões paulistanos na virada da década de 30 para 40. Até a epidemia da chamada gripe espanhola, um tópico pesado, levou foliões a adotar a fantasia de morte nos festejos de 1919.

A drag Salete Campari: dona de bloco LGBT e também aberta para a inclusão de cadeirantes (Rogerio Pallatta/Veja SP)

A pulsante questão da diversidade também se faz presente nas ruas. A drag queen Salete Campari, porém, não doura a pílula quando o assunto é preconceito. Ela é paraibana, tem 52 anos e vive em São Paulo há 45. “Estou no Carnaval desde o fim dos anos 1980 e, se tem uma ideia que defendo, é que os gays e os travestis não podem se esconder no gueto”, diz. Para isso, Salete enche a boca de orgulho para afirmar que seu bloco, que tem cinco anos e desfila tanto pela região do Largo do Arouche como pela Rua Augusta, é LGBT. “Um dos primeiros”, sublinha.

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Só que ela não fica limitada a essa bandeira. No ano passado, o trio elétrico trouxe um intérprete de libras para decifrar aos surdos as letras das músicas apresentadas. A novidade deste ano é uma ala para receber com segurança pelo menos cinquenta cadeirantes. “Eu acredito na inclusão e não faço nada disso para agradar à turma do politicamente correto. Faço porque alguém precisa fazer, e a prefeitura não toma nenhuma medida decisiva sobre isso”, justifica Salete. “Sofri todos os preconceitos nesta vida, agora é que está amenizando um pouquinho, então vou lutar pela diversidade porque acredito na transformação das pessoas.”

Um dos símbolos feministas do Carnaval paulistano é o Bloco Pagu, lançado em 2017 pela cineasta Mariana Bastos e pela produtora Thereza Menezes, que contribuiu para a formação de uma nova mentalidade também fora do asfalto. “Temos muitos homens trabalhando em nossa produção e percebo que, nesse tempo, eles passaram a entender a mulher de um jeito diferente, revendo suas reações no cotidiano”, conta Mariana.

O Bloco Pagu, que em 2020 espera levar 100 000 pessoas no dia 25 para a Avenida São João, tem uma bateria totalmente feminina. São 150 mulheres tirando som de instrumentos que, há algumas décadas, nem sequer podiam ser tocados por elas, como o surdo. “Quando nos colocamos em uma posição de protagonismo, a força vai se somando”, afirma Mariana. “Temos mulheres que entraram no bloco depois de ser vítimas de violência doméstica. Elas enfrentaram o trauma e começaram uma nova vida social por causa desse trabalho, então são mudanças que não ficam restritas aos dias de Carnaval.”

Bloco feminista Pagu: bateria formada por 150 mulheres e perspectivas sociais (Rogerio Pallatta/Veja SP)

Essa tentativa de conscientização também passou a fazer parte dos currículos escolares. É possível encontrar colégios preocupados em estimular os alunos no desenvolvimento de uma análise crítica sobre o Carnaval. No Colégio Visconde de Porto Seguro, os professores são orientados a não estereotipar culturas e etnias e muito menos dar margem a interpretações desrespeitosas.

Para os bailes infantis, eles indicam direções para os garotos criarem as próprias fantasias e os estimulam a entender os significados antes de confeccioná-­las. As campeãs não fogem à regra. São as tradicionais princesas, personagens de desenhos animados e unicórnios. “Mas, se aparecer algum aluno interessado em fazer o black face, nós vamos alertá-lo para o fato de que pintar o rosto de preto é desrespeitoso e orientá-lo a desenvolver uma pesquisa sobre isso para fugir da desinformação. Não podemos simplesmente vetar a sugestão”, afirma Lisie de Lucca, diretora de cultura do Visconde de Porto Seguro.

O mesmo vale para as marchinhas. Os estudantes têm acesso ao repertório de Chiquinha Gonzaga, Carmen Miranda e Dalva de Oliveira, mas, se aparecerem canções que flertem com o politicamente incorreto, eles serão incentivados a criar uma nova letra que aproveite a melodia. Quem sabe ficará nas mãos das futuras gerações a possibilidade de estabelecer um debate em torno dos significados do Carnaval que não seja o da festa do vale-tudo, mas que também não o engesse a ponto de ele virar uma comemoração debaixo de constante vigilância.

(Veja SP/Veja SP)

Festa paulistana em suas origens

Desfile na Avenida Paulista

Corso de imigrantes durante o carnaval da Avenida Paulista na década de 1910 (Reprodução/Veja SP)

O Carnaval paulistano, antes limitado aos logradouros centrais, passou a ocupar uma das principais vias da cidade em 1912. Foi a primeira vez que as mulheres puderam participar da festa, antes um direito exclusivo dos homens. As famílias da aristocracia desfilavam em carros enfeitados. O motorista e o chefe da casa iam nos bancos da frente, e a mãe logo atrás, sentada entre as filhas solteiras, que podiam usar maquiagem leve e jogavam flores e serpentinas para o público que observava o cortejo.

Cordão Barra Funda

Grupo Carnavalesco Barra Funda, bloco de carnaval desfilando próximo ao Largo da Banana, no bairro de Barra Funda (Claude Levi-Strauss/Divulgação)

O primeiro bloco carnavalesco paulistano nasceu na Barra Funda, em 1914, em uma iniciativa do marceneiro Dionísio Barbosa. Morador de uma chácara na Rua Conselheiro Brotero, ele viveu três anos no Rio de Janeiro e conheceu a folia popular. De volta, reuniu a família, os vizinhos e os amigos, que, trajando camisa verde e calça branca, ocuparam as ruas da região. Esse cordão foi a origem da Escola de Samba Camisa Verde e Branco.

Imigrantes nos cordões

Corso do Brás, na década de 1930 (Reprodução/Veja SP)

Na década de 30, os imigrantes italianos se uniram aos espanhóis e portugueses que trabalhavam nas fábricas para organizar o chamado “Carnaval dos brancos”. Os desfiles se realizavam nos bairros do Brás, da Mooca e da Lapa. Com referências europeias, eles reproduziam desde as tradicionais máscaras venezianas até carros alegóricos em uma festa em que o visual era tão importante quanto a música.

Pioneira e feminina

Integrantes da Escola de Samba Lavapés fundada em 1937 (Reprodução/Divulgação)

Foi uma mulher, Deolinda Madre, mais conhecida como Madrinha Eunice, a fundadora da mais antiga escola de samba paulistana. A Sociedade Recreativa Beneficente e Esportiva do Lavapés nasceu em 1937, na Baixada do Glicério, na região central da cidade, em uma época em que os grupos carnavalescos não adotavam essa nomenclatura. Ela e o marido, um italiano apelidado de Chico Pinga, passaram uma temporada no Rio de Janeiro e voltaram deslumbrados com a festa carioca. Madrinha Eunice, então, reuniu um time de ritmistas e convidou, entre outros, vinte homens do bairro para sair na folia vestidos de baiana. No primeiro desfile, as cores da Lavapés eram amarelo e preto, mas, no ano seguinte, Eunice mudou-as para vermelho e branco e adotou para a escola o símbolo de uma baiana. A Lavapés viveu o auge entre os anos 1940 e 1950 e ainda hoje se mantém em atividade.

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 12 de fevereiro de 2020, edição nº 2673.

 

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