Região do Brás terá calçadão, rua coberta e fios enterrados em reforma de 15 milhões de reais

Projeto na rua Tiers é bancado por comerciantes e abre caminho para novas requalificações de vias famosas, como a Ipiranga com a São João

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2024, 19h39 - Publicado em 3 set 2021, 06h00
A imagem é uma montagem com uma foto e uma projeção. À esquerda, a rua Tiers, com várias barracas de camelôs e pessoas transitando pela via. À direita, o projeto do Boulevard, que inclui um teto na rua.
Rua Tiers: hoje e no projeto (Alexandre Battibugli e projeto Jayme Lago/Mestieri Arquitetura/Veja SP)
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As palavras “andar tranquilo pelas ruas do Brás e do Pari” nunca cabem na mesma frase. Com raras exceções, como aos domingos e feriados, o tráfego de pessoas, carros, carrinhos, caminhões, ambulantes, entregadores, ônibus, compradores e vendedores ocorre sem a menor regulação e ordenação urbanística.

Agora, em uma de suas ruas mais movimentadas, a Tiers, que fica no Pari, a prefeitura acaba de autorizar a construção de um calçadão que promete mudar a cara do pedaço. A ideia da gestão Ricardo Nunes é extrapolar a medida para outras vias da cidade, como no Largo da Matriz, na Freguesia do Ó, e no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, no centro.

No boulevard da Tiers, que terá 600 metros de extensão e ligará as ruas João Teodoro e Conselheiro Dantas, os fios aéreos serão enterrados e o asfalto dará lugar a um passeio de 9 000 metros quadrados de superfície só para pedestres. Ali, a sombra dos guarda-sóis dos camelôs que dominam o viário será substituída por um teto de aço, com vigas nas transversais para não ofuscar a paisagem de claridade. Ao longo dos pórticos que sustentam o teto e na base dos bancos, a iluminação em led vai fazer parte da nova paisagem.

“Tecnicamente não estamos deixando nada coberto, para não dar insalubridade às construções existentes. Tem de ter ventilação”, afirma o arquiteto Jayme lago, responsável pelo projeto e que se inspirou em um modelo europeu. “em Granada, na Espanha, como faz muito sol por lá, os comerciantes instalam coberturas com tecidos permeáveis. Pensamos em desenvolver estruturas de acolhimento que não tirem a ventilação nem a chuva, que deixem o espaço mais gostoso.”

A empreitada, que custará 15 milhões de reais, será bancada integralmente pela Federação de Varejistas e Atacadistas do Brás (Fevabras). As obras vão começar no fim do ano, tão logo acabe o período de compras de Natal, e ficarão prontas em fevereiro de 2023. Além de construir o boulevard, os empresários pagarão pela manutenção e segurança do local, mas a posse da área continua sendo da prefeitura.

A imagem mostra a rua Tiers com o fluxo muito alto, cheio de pessoas e barracas espalhadas.
Dia de movimento normal na rua Tiers (Alexandre Battibugli/Veja SP)
Imagem do projeto do Boulevard, que inclui um teto na rua e sem postes de luz.
Iluminação nos pórticos e bancos lineares: cinco quarteirões com calçadão (Jayme Lago/Mestieri Arquitetura/Divulgação)
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Imagem do projeto do Boulevard, que inclui um teto na rua e sem postes de luz.
Croqui do futuro boulevard: só camelôs regularizados (Jayme Lago/Mestieri Arquitetura/Divulgação)

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O anúncio do boulevard do Brás ocorre em mais um momento conturbado da região. Nas últimas semanas, denúncias de cobranças irregulares de espaços, somadas a manifestações de camelôs para que a Subprefeitura da Mooca forneça mais Termos de Permissões de Uso (TPU), aumentaram a temperatura do pedaço.

Outra demanda de parte dos mais de 6 000 ambulantes é que eles tenham espaço no futuro calçadão. “Não sabemos como vai ser. As entidades não foram consultadas e esperamos que os ambulantes sejam contemplados”, diz Ronei Rodrigues da Cruz, presidente do Sindicato dos Camelôs Independentes de São Paulo (Sindcisp). A entidade ficou conhecida em 2010, quando seu então presidente, Afonso José da Silva, o Afonso Camelô, foi morto a tiros dentro do próprio sindicato. Ele já havia sofrido uma tentativa de assassinato, onze anos antes, ao denunciar um esquema de cobrança de propinas.

No que depender dos responsáveis pelo projeto, o local vai abrigar todo mundo. Ou quase. “Os ambulantes terão lugar no boulevard, sim, mas os legais, os regulares. Não vamos expulsar ninguém, será uma área de convívio”, afirma Gustavo Dedivitis, presidente da Fevabras, que representa os empresários mais “graúdos” da região. “Somos o maior centro comercial da América Latina. Temos shoppings, lojas e investimentos grandiosos que não condizem com nosso entorno. Quando falamos de Brás, muitos acham que nossos shoppings estão pendurados em boxes, mas nosso padrão é Faria Lima. Queremos atrair cada vez mais público diversificado.”

A ideia também é corroborada entre os lojistas que possuem estabelecimentos diretamente nas ruas. “A organização é sempre um ingrediente a mais para o nosso circuito”, diz Lauro Pimenta, presidente da Associação de Lojistas do Brás e dono de um comércio na Rua Oriente. “Temos uma luta de anos para tentar aprovar o alargamento das calçadas e melhorar a pavimentação da nossa rua. Mas faz tempo que buscamos a prefeitura, sem êxito.”

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“Quando falamos de Brás, muitos acham que nossos shoppings estão pendurados em boxes, mas nosso padrão é Faria Lima”

Gustavo Dedivitis
A imagem mostra Pimenta, com uma mão sob uma estrutura de cabides de roupa e olhando para a câmera na Rua Oriente.
Lauro Pimenta, na Rua Oriente: “Também queremos nosso projeto aprovado” (Alexandre Battibugli/Veja SP)
A imagem mostra Dedivitis sobre um prédio, com roupa social e de braços cruzados para a foto.
Gustavo Dedivitis, da Fevabras: público diversificado (Alexandre Battibugli/Veja SP)

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Enquanto o projeto da Tiers sairá do papel e o da Rua Oriente seguirá em banho-maria, outras vias importantes da metrópole também serão contempladas por reformas parecidas, promete a prefeitura. Em um primeiro momento, serão outros oito endereços.

“Cada uma das ruas terá seu projeto específico. Não haverá um padrão, a ideia é valorizar as ruas temáticas, com calçadas, paisagismo, de acordo com a vocação da rua”, diz César Azevedo, secretário municipal de Licenciamento. A próxima da lista é a General Osório, conhecida como a Rua das Motos, no centro.

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Na última segunda (30), os lojistas do local tiveram a primeira reunião com a gestão municipal e a ideia é que o acordo seja assinado até o fim do ano. Ao contrário da turma do Brás, os comerciantes dali não têm como bancar toda a empreitada. “Sugerimos que a prefeitura reformasse as calçadas, aterrasse os fios e construísse um portal. Da nossa parte propusemos reformar as fachadas das lojas”, diz Miguel Kamei, presidente da Associação da Rua das Motos, entidade que representa mais de 500 estabelecimentos na General Osório e nas ruas vizinhas.

A imagem mostra a rua General Osório. Estreita, há muitas motos estacionadas no lado direito da imagem e um homem atravessando a rua.
Rua General Osório: promessa de nova calçada e fios enterrados (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Além das reformas das ruas temáticas, a gestão municipal prepara (mais) um grande plano de intervenção no centro da cidade. Promessa de dez em cada dez candidatos a prefeito, a requalificação da região nunca saiu do papel. Além da reforma do Vale do Anhangabaú, entregue recentemente, a prefeitura promete o Parque Augusta para ainda este ano. No Largo do Arouche, as bancas de flores serão reformadas, assim como toda a calçada do centro histórico. No icônico Edifício Martinelli, a concessão de sua cobertura, que será transformada em restaurante e mirante, está parada no Tribunal de Contas do Município.

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Bancas de flores do Arouche: projeto aprovado (Reinaldo Canato/Divulgação)

Nas próximas semanas, a prefeitura vai lançar um edital para vender ou conceder à iniciativa privada prédios públicos ociosos. “O centro está degradado há décadas, o que aumentou com a pandemia. Temos urgência em apresentar ações concretas”, diz o secretário Azevedo.

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Esta não é a primeira vez que a prefeitura transfere para o privado a requalificação de vias comerciais da cidade. A partir de 2007, ruas como Oscar Freire, no Jardins, Amauri, no Itaim, e Joaquim Nabuco, no Brooklin, também ganharam um banho de loja, com colocação de bancos, reformas e alargamento de calçadas e aterramento de fios. Até hoje, a manutenção desses espaços está com as associações dos lojistas.

Na Avanhandava, na região central, quem cuida pessoalmente da zeladoria do espaço é o empresário Walter Mancini. “Eu dou palestras e sou procurado por empresários de todo o Brasil até hoje para falar como foi a reforma da rua”, afirma Mancini, que não sabe exatamente quanto custa a manutenção dos 140 metros de “sua” rua. “Fazer uma rua é fácil como é fácil fazer um filho. O difícil é criá-lo. Calculo entre 10 000 e 20 000 reais por mês o valor gasto na Rua Avanhandava. As pessoas jogam chiclete, a concessionária quebra tudo e depois não repõe, mas não me arrependo. Coloquei um ovo em pé e me tornei um cara muito mais respeitado na cidade depois disso.”

A imagem mostra a rua Avanhandava. É possível ver a calçada vermelha e um prédio ao fundo da imagem.
Rua Avanhandava: reformada em 2007 (Levi Mendes Jr./Divulgação)

AS PRÓXIMAS DA FILA

  • > Rua General Osório (centro)
  • > Rua Santa Efigênia (centro)
  • > Rua São Caetano (centro)
  • > Rua Florêncio de Abreu (centro)
  • > Cruzamento das avenidas Ipiranga e São João (centro)
  • > Rua 12 de Outubro (Lapa)
  • > Rua Capitão Tiago luz (Santo Amaro)
  • > largo da Matriz (Freguesia do Ó)

Colaborou César Costa

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Publicado em VEJA São Paulo de 8 de setembro de 2021, edição nº 2754

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