Entre os encantos de Minas passo a incluir o anúncio do noivo em busca de noiva, Aristeu, dito Aristeu dos Fogões. Sua procura, impressa em um papelucho de 10 por 14 centímetros, não dá sinal de pressa ou inquietação. Foi distribuído com parcimônia na região do mercado da Lagoinha, modesto e degradado, próximo ao centro de Belo Horizonte.
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Na parte superior do seu comunicado, Aristeu se apresenta, nome e apelido impressos em duas linhas de maiúsculas grandes, ladeados por duas fotografias mínimas, clichês já desmaiados. À direita, seu retrato, que não se pode saber se é recente ou não, mostra um homem maduro, branco, de cabelos pretos, paletó sobre camisa clara, sem gravata. À esquerda, a fotica de um fogão a gás moderno, com a qual, suponho, ilustra seu apelido e ao mesmo tempo faz propaganda da sua principal atividade, como se verá.
Qualifica-se a seguir, prevenindo os que o leem de que não é um qualquer: “Identifico-me com atestado recente de bons antecedentes e demais documentos”. Informa logo a idade, 60 anos, e a religião, evangélica, com a intenção de mostrar que é pessoa de juízo, suponho. Amplia horizontes dizendo-se capaz de dirigir automóveis até profissionalmente: “Habilitado nas categorias AD”. Acha importante assinalar que não sucumbiu a dois males da sociedade moderna: “Não tenho vícios. Não tenho dívidas”.
Pelo que apregoa até aqui, já poderia ser considerado um homem casável. Mas ele ainda não disse tudo, e talvez o principal: que ganha a sua vida. Num misto de anúncio e qualificação pessoal, em letras grandes, destaca: “Faço manutenção em fogões de todas as marcas, atendo em toda BH e toda região metropolitana. Dou garantia”. É pouco? Ele diversifica, em letras ainda maiores: “Pinto portões e grades”. Sabe que nestes nossos tempos inseguros há portões e grades por toda parte, que se degradam ao relento.
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Sem pressa, Aristeu não entra logo no assunto casamento, talvez para não pensarem que está ansioso ou coisa assim. Em letras menores e finas, coloca bens à venda, o que poderia ser uma declaração de status, quem sabe algo equivalente a um dote: “Vendo um apto. 3 Q — 55.000 só. A vista. Não troco”. O imóvel fica bem longe, adverte, “depois do Baleia”, que é um hospital situado atrás da serra que encurrala a cidade, mas 55.000 reais não é coisa que uma noiva possa menosprezar. E tem mais! Vende ainda um apartamento de dois quartos, 45.000 reais, “só a vista, não troco”. A decidida primeira pessoa do verbo afasta a hipótese de um bico de corretagem. Definitivamente, um bom partido.
Afinal, entra no assunto, em maiúsculas fortes: “PROCURO PARA CASA MENTO”.
Especifica os requisitos da pretendida: “Solteira que nunca teve filho, com idade acima de 55 anos. Não fumante”. Reparem. Aristeu não quer uma gostosa nova. Em nenhum momento se refere a beleza, cor, peso. Diz “acima de 55 anos”, sem especificar qual é o limite. Sabe que moça nova poderia lhe dar trabalho superior às suas forças, ou traí-lo. Não se ilude, não exige virgindade aos 55 anos, mas que ela não tenha filhos. Sendo ele mesmo um homem sem vícios, não quer fumante em casa. Talvez lhe repugne o cheiro, nos poros, no hálito, nas roupas.
As surpresas das suas pretensões vão aumentando: “De preferência, quero esposa que me dê serviços de faxina da casa. Lavo roupas. Lavo vasilhas. Limpo fogão. Dirijo”.
É o marido perfeito, disposto a fazer todos os serviços da casa? Aristeu dos Fogões tem nova surpresa: “Pretendo receber 01 salário mínimo mensal para exercer todas as funções acima”.
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Que fique bem claro: está disposto a dar moleza para a felizarda, mas não trabalha de graça. Ainda vale chamá-la de felizarda? A julgar pelo papelucho, ele acredita que sim, porque adverte em letras negras maiores: “Favor não me ligarem as demais mulheres”.
E dá o telefone celular, o endereço e o CEP.
E-mail: ivan@abril.com.br