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Admirável mundo novo

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 19h45 - Publicado em 18 set 2009, 20h18

Eu adoro tudo que é invenção. Fui o primeiro do meu círculo de amigos a ter computador, em uma época em que jornalistas e escritores labutavam na máquina de escrever. Às vezes fico em dúvida sobre as vantagens de tantas novidades. Celular, por exemplo. No passado, se alguém queria me achar, ligava para minha casa. Deixava recado. Eu podia até dizer que não tinha recebido. Agora, com o celular, meu chefe me encontra na praia, na festa, em qualquer lugar. Um amigo advogado estava fazendo um cruzeiro na Escandinávia. Um cliente ligou com um assunto urgente e ele teve de resolver. Fico imaginando: como alguém pode ter cabeça para deslindar questões jurídicas no meio dos fiordes? Impossível fugir, porque há caixa postal e mensagem de texto!

E-mail. Eu vejo o meu correio eletrônico todos os dias. Várias vezes. Quando a internet começou, receber mensagens era uma delícia. Hoje virou sa-crifício. O número aumenta cada vez mais. Muitas vezes meu computador demora para baixá-las. Espero olhando pacientemente para a tela. Descubro que é um arquivo de fotos de uma garota cujo nome não lembro, mas que afirma termos vivido momentos incríveis no passado e que está mandando as fotos como recordação. Dá uma vontade enorme de abri-lo. Provavel-mente é vírus. Deleto. Ou seja, perco tempo para receber e para me livrar. Outro dia recebi um longo texto em inglês de alguém que afirmava ser um alto funcionário de um banco africano. Segundo dizia, havia uma conta de milhões de dólares abandonada por um político falecido, que poderia ser resgatada por… mim! Eu? Dizia ter recebido a indicação de meu nome por meio de amigos em comum. Ele faria o depósito dos milhões em meu nome, mas depois eu devolveria 60%. Sem risco, pois se tratava de uma fortuna “esquecida”. Meu primeiro impulso foi pensar: “Fiquei rico”. O segundo: “Mas a troco de quê?”. Não tenho nenhuma atração por negócios esquisitos. Quem poderia ter me indicado? Só podia ser golpe. Excluí o e-mail. Um conhecido me explicou:

– Se você aceitasse, ele pediria um depósito para você abrir sua conta, com uma quantia mínima. Esse é o aplique. E você nem poderia reclamar porque não conhece o sujeito e, pior, está tentando dar o golpe também.

Ou seja, surgiu até vigarice eletrônica! Sem falar no número absurdo de e-mails que recebo me oferecendo todo tipo de produto. E de pessoas pedindo ajuda, tantas que já nem sei o que é válido ou não.

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Fotografar virou um ato corriqueiro com o celular. Em conseqüência, a intimidade tornou-se artigo de luxo. Faz pouco recebi pela internet a foto de um amigo meu em situação íntima. Liguei para quem mandou:

– Se a mulher dele receber, vai dar um rolo. Não mande para mais ninguém. É assunto pessoal.

– Mas eu também recebi, está circulando pela internet! – respondeu minha amiga.

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Cada vez que en-contro o feliz casal com seu bebê de colo, fico pensando quanto tempo demora para a bomba estourar. Mais dia menos dia, vai chegar na mulher, não vai?

A imprensa escrita ou audiovisual avalia as notícias, confere a veracidade. Na internet, não. Qualquer pessoa pode criar um blog, escrever o que quiser sobre quem desejar. Se for famosa, o problema é maior ainda. Mesmo que não seja verdade, a maldade pode colar. Destruir uma relação afetiva, uma carreira. É justo?

Nem sempre a tecnologia torna a vida mais confortável. O mundo caminha, e não se volta para trás. Mas muitas vezes, com perdão da rima pobre, o que facilita só complica.

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