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Os prefeitos dos parques paulistanos

Quem são os responsáveis pelas principais áreas públicas de lazer da capital e o que fazem para melhorá-las

Por Daniel Bergamasco [com reportagem de Mariana Barros e Flora Monteiro]
Atualizado em 27 dez 2016, 17h49 - Publicado em 16 mar 2012, 16h10

São 9 da manhã de domingo e o engenheiro agrônomo Heraldo Guiaro tenta se concentrar em um mapa que aponta as últimas reformas do Parque do Ibirapuera, administrado por ele desde 2009. Batidas à sua porta interrompem a tarefa. “Tem gente tocando violão na grama. Pode?”, pergunta uma assistente. “Só se o instrumento não estiver ligado em caixa de som”, ele responde. Novos avisos chegam a cada cinco minutos, muitos deles trazendo questões bem mais cabeludas.

Com 120.000 visitantes nos dias de pico, ou seja, um público maior do que a população de cidades como Barretos e Ribeirão Pires, no interior do estado, o Ibirapuera tem problemas à altura de sua frequência. Eles variam de adolescentes que camuflam vodca em garrafas de refrigerante e são socorridos em coma alcoólico pelas duas ambulâncias de plantão a camisinhas encontradas nas áreas de mata fechada, passando por situações como a descoberta de um cadáver boiando no lago, ocorrida em janeiro, com sinais de afogamento. “Comandar isso aqui é como estar à frente de uma prefeitura”, diz Guiaro, que chefia 375 funcionários e gerencia um orçamento anual de 40 milhões de reais.

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Quem é convidado e aceita pilotar um desses espaços públicos logo entende que, à parte a beleza do cenário, a rotina não será feita de brisa. Cuidar das espécies de flora e fauna, combater o vandalismo e conciliar as reivindicações de grupos diversos está entre os desafios diários. Na metrópole, há praticamente um gestor em cada um dos 93 parques, a maioria deles (83) na esfera municipal. Em 2005, a capital aprovou uma lei que passou a exigir do ocupante do cargo curso superior e experiência ambiental. “Os postos deixaram de servir de abrigo para indicações políticas”, afirma Eduardo Jorge, secretário municipal do Verde e Meio Ambiente.

O emprego pressupõe estar presente quase todos os domingos e receber um salário que varia de 2.900 a 3.500 reais. O engenheiro Guiaro, por estar à frente do campeão de frequência, recebe um pouco acima da média (4.200 reais). Formado pela USP, o agrônomo de 53 anos ocupou funções técnicas em órgãos diversos desde 1998, até chegar à posição atual. Antes, trabalhou como consultor de pesca e tentou a carreira de ator — protagonizou de peças infantis ecológicas a um comercial de cerveja, no papel de um marido que enrola a mulher para ir ao boteco. Curiosamente, na hora de cuidar do corpo, prefere frequentar outra área verde. Morador do Ipiranga, é no Parque da Independência que ele faz as caminhadas que o ajudaram, em 2011, a perder 20 dos 92 quilos que pesava. “Praticar exercício no Ibirapuera não dá, porque fico vendo o que precisa ser consertado e a coisa vira trabalho.”

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Das dificuldades citadas pelos administradores, a mais desanimadora é combater a falta de educação de parte dos frequentadores. “Aqui, é comum o sumiço de peças metálicas dos banheiros”, lamenta Eliana de Andrade, responsável pelo Parque Buenos Aires, em Higienópolis. O Villa-Lobos, na Zona Oeste, com 30.000 visitantes aos domingos e 732.000 metros quadrados de área, passa pelo mesmo problema. Ali, quem está no comando é o agrônomo Roberto Rosa, cuja principal missão consiste em acelerar o crescimento da vegetação do espaço, criado sobre um antigo depósito de entulho.

A demanda, diz, é fácil perto do trabalho que o público lhe dá. Um exemplo: em 2011, foram instaladas doze redes feitas de tecido usado em paraquedas, ao custo de 80 reais cada uma. “Em três semanas, os usuários destruíram tudo”, lembra Rosa, que recebe do governo estadual um salário de 7.000 reais, bem melhor que o dos pares municipais. No Parque do Povo, na zona oeste, há apenas seis meses, a socióloga Maria Fernanda Ferreira, cansada de ver canteiros esmagados por bicicletas e cães, está instalando placas com regras de conduta. Ao fazer valer o veto aos skates, que, para evitar atropelamentos, só podem ser usados em uma área específica, viu-se cercada em sua sala por vinte praticantes revoltados. “Outra vez, uma patinadora, contrariada com a restrição, rasgou o estatuto do parque na minha frente”, conta ela, paulistana da Vila Olímpia, que já chefiou o Alfredo Volpi, no Morumbi, e deu aulas de tênis, esporte pelo qual foi bicampeã sul-americana.

Se nos bairros nobres a população é bem consciente dos próprios direitos, às vezes com exageros, o mesmo não é observado por alguns dos prefeitos de parques de regiões mais carentes. O engenheiro ambiental Rafael Quintino da Silva, hoje à frente do Independência, comandava havia um ano o Guaratiba, em Guaianases, na Zona Leste. Segundo ele, a inauguração do parque passou quase despercebida pela vizinhança. “Tivemos de promover uma série de eventos para que as pessoas aprendessem a aproveitá-lo”, afirma. “Até a prática da caminhada precisou ser incentivada, porque poucos vinham.”

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No Juventude, dotado de estrutura que inclui biblioteca com 30.000 títulos e dez quadras esportivas, o administrador Paulo Pavan teve percepção semelhante. Ele encomendou uma pesquisa e descobriu que metade dos moradores da Zona Norte, onde o parque fica situado, em terreno antes ocupado por pavilhões do Carandiru, desconhecia o local. A saída foi articular divulgação intensiva da programação pela internet, com um informativo semanal que chega a redes sociais, blog e 40.000 endereços de e-mail. Entre 2006, ano anterior ao início das ações, e 2011, o número anual de visitantes aumentou de 860.000 para 2,5 milhões.

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Alastrar as áreas verdes na cidade é uma das bandeiras do prefeito Gilberto Kassab. De 2005 para cá, o número delas quase triplicou, alcançando o total de 83. A promessa é atingir 100 unidades até o fim do ano. Essa rápida expansão, no entanto, vem sendo alvo de algumas críticas. “Se o projeto fosse sério, nós aplaudiríamos”, diz José Eduardo Ismael Lutti, primeiro promotor de Meio Ambiente da capital. Para ele, no afã de obter resultados quantitativos, a prefeitura criou projetos mal executados. Um deles, na sua visão, seria o Nove de Julho, situado na orla da Represa Guarapiranga. A Promotoria entrou com uma ação para embargar a construção de equipamentos de lazer, como a pista de caminhada em solo que passa parte do ano alagado, por entender que ela representaria “dano ambiental”. Carlos Fortner, chefe de gabinete do secretário Eduardo Jorge, defende a realização. “A reforma ajuda a impedir novas invasões de sem-teto”, argumenta.

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Outros questionam a prioridade dada à multiplicação dos parques, enquanto a prefeitura encontra dificuldades em fazer a manutenção dos já existentes. “Ao lado do Parque do Ibirapuera, a Vila Mariana tem diversas áreas verdes que atraem pouca gente por estar malcuidadas”, afirma Oswaldo Baccan, presidente da associação de moradores do bairro. Ele cita a Praça Comunitária, na esquina da Avenida Lins de Vasconcelos com a Rua Vergueiro, que virou abrigo de drogados. Uma boa política executada no exterior para resolver esse tipo de problema vem de Nova York. Lá, os gestores do Central Park, que tem superconcentração de visitantes, passaram a se empenhar na recuperação de parques menores nos arredores para que estes possam servir de opção.

Para os milhares de paulistanos que frequentam os parques da cidade, em busca de lazer, tranquilidade e contato com a natureza, uma boa notícia: seus administradores anunciam uma série de melhorias para este ano. O Parque do Carmo, por exemplo, está fazendo o plantio de árvores nativas como araticum e cedro em terras recém-anexadas, que elevarão sua área de 1,5 milhão para 2,4 milhões de metros quadrados. “Resultado: a variedade de espécies animais aumentará”, afirma o administrador Fabio Pallaes.

Também com área ampliada, o Independência ganha no segundo semestre equipamentos de ginástica voltados à terceira idade e, no futuro, terá pistas específicas para skate. No Trianon, a programação cultural ao ar livre vai crescer. “O primeiro passo é passar de um para dois o horário das apresentações musicais aos domingos”, diz a socióloga Rita Nakamura, responsável pela área.

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O Aclimação, que perdeu grande parte de sua fauna após o lago ir literalmente pelo ralo durante um temporal em 2009, dará um passo simbólico importante em sua recuperação. Dentro de um ou dois meses, antes mesmo da conclusão das obras de drenagem do entorno, como um pequeno piscinão, voltará para lá um antigo casal de moradores. São os cisnes negros resgatados na chuvarada. Eles habitavam provisoriamente as águas do Ibirapuera e agora se preparam para estar em casa novamente.

 

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