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A sina dos desajeitados

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 19h45 - Publicado em 18 set 2009, 20h18

Um de meus amigos avisou a futura esposa:

– Não tenho nenhuma habilidade manual. Sou incapaz de trocar uma lâmpada. Topa continuar o namoro?

Casaram-se há 23 anos. Nunca foi obrigado a pendurar quadros, desobstruir ralos ou consertar torneiras.

As liberadas de hoje já não têm obrigação de lavar o chão nem de cozinhar. Estranham quando um homem confessa não saber se virar diante de uma pane elétrica. Ou de um computador em crise. Mas um número crescente de representantes do sexo masculino não tem a menor idéia de como agir diante de uma torneira pingando.

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– É só trocar a borrachinha – me explicaram.

E onde está essa terrível borrachinha? Um amigo acabou com a impressora na tenebrosa tarefa de trocar o cartucho. Outro perpetrou a proeza de quebrar uma escova de dentes dentro da embalagem enquanto se esforçava para retirá-la.

Reconheço. Também sofro da mesma sina de de-sajeitado. Desde criança. Jovenzinho, cau-sei um blecaute na tentativa de trocar um fusível. Com os primeiros videocassetes rapidamente aprendi a programar gravações. Os aparelhos se sofisticaram com o tempo e nunca mais! Sou o rei do chuvisco na fita! Agora tenho um DVD que grava. Mas é tanta confusão com TV por assinatura, canal correto, programação que desisti! Dias atrás quase chorei quando o telefone ficou mudo. Por sorte, um conhecido foi em casa. Simplesmente, consertou a tomada. E pronto!

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– Viu como é fácil? – comentou.

Fácil para ele! Se vou tirar um parafuso, ele entorta e fica preso. Se, por um milagre, sai, nunca mais entra no lugar. Uso uma correntinha. Alguém tem idéia da tortura que é para um míope tirar e pôr correntinha? Não consigo lidar com o fecho! Quando, depois de várias tentativas, tenho sucesso, a medalhinha sempre cai no chão. Sempre! Já consegui arrebentar uma lâmpada dentro do bocal. Foi preciso chamar o eletricista. Certa vez, ao trocar o pneu de um carro, entortei a lataria com o macaco. Depois disso, desisti. Se o pneu fura, peço ajuda. Da última vez, foi um policial. Expliquei:

– Eu tenho um problema de coordenação motora. Se puder me ajudar…

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Mentira não é. Mas sempre olham torto para um sujeito que não sabe trocar o pneu!

Já quis resolver o drama. Certa vez procurei um curso de mecânica de automóveis para amadores. Não achei. Hoje faria um de habilidades domésticas, mas não sei de nenhum! O mundo tornou-se complicado: uma lâmpada é diferente da outra, uma torneira também. Certamente não faltariam alunos!

Se houvesse um movimento de liberação masculina, um dos itens seria a revolta contra a obrigação de ser hábil. Vivo passando por saias-justas. Faz pouco, fui convidado a jantar por uma amiga. Ela veio para a sala.

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– Você pode me abrir a tampa?

E me entregou um vidro de azeitonas! Que tortura, uma tampa rebelde! Uma seta indicava para girar em certa direção. Tentei. Inútil. Fui para a oposta. Ficou mais fechado ainda! Minha amiga admirou-se:

– Quer que eu tente de novo?

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É uma questão de honra abrir um vidro de azeitonas. Peguei um facão.

– Você vai assassinar o vidro? – ela espantou-se.

Ataquei a tampa a facadas, até sair um pouco de ar. A tampa girou. Total de tempo: quarenta minutos! Pior, só tirar rolha de vinho quando fica presa no arame do abridor. Giro. Giro. Giiiiiiiiiiiro! Ela gira também, mas permanece no mesmo lugar.

Perdi a vergonha. Agora sou como aquele meu amigo que no início do namoro confessou a falta de habilidade. Se me pedem para recarregar o isqueiro, deixo claro:

– Tudo bem. Mas é por sua conta e risco. Posso incendiar a casa!

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